segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

SMORGASBORD








                                                                Smörgåsbord








   Agenor Guardanapo havia decidido mudar de vida no ano novo...
   A idade estava chegando e ele temia que, se continuasse com o tipo de vida que levava, teria sérios problemas no dia do juízo final...
   O cara era uma desgraça... Bebia, fumava, namorava todo mundo... Não queria saber se ela era velha ou nova, feia ou bonita, gorda ou magra. O coração batia, ele comia! Adorava orgias e tudo mais que fosse contrario aos ensinamentos de Deus.
   Todo dinheiro que ganhava, gastava em bebida, mulheres, cigarro, gorjeta para dançarinas... Coisas assim.
   Aos quase sessenta anos de idade, não tinha nada em sua vida de que pudesse se orgulhar. Havia feito besteira a vida inteira mas, agora era diferente. Estava decidido...
   Não sabia se estava cansado da vida que vivia ou arrependido do modo que sempre viveu. Apesar de seu estilo de vida, frequentava a igreja e era uma pessoa boa, de princípios. Praticava suas incoerências mas nunca prejudicou ninguém ou permitiu que outrem pagasse pelas consequências de seus atos.
   Acontece que o homem era pior do que São Tome’, tinha que ver para crer. Ver duas vezes antes de crer uma so’.
   Naquele Domingo, depois da missa, foi ate’ a sacristia, conversar com o padre.
-  Dom Cascudo, bom dia! Posso falar com o senhor, um minuto?
-  Claro meu filho! Respondeu o sacerdote.
-  E’ o seguinte seu padre: Tô querendo mudar de vida, ser um melhor cristão para que,
   quando morrer poder ir para o céu. O problema e’ que não sei como e’ la’... Gostaria
   de dar uma chegada no céu e no inferno, so’ para ver a diferença e, depois de ver como e’, ter mais
   um incentivo para mudar de vida.
-  Nunca ouvi falar disso mas, tudo bem! Vou ver o que posso fazer. Respondeu o
   padre. Porque você não acredita? Não e’ mais fácil? Finalizou.
-  Pode ser para o senhor mas, pra mim, so’ vendo... Aquela historia do Tome’, lembra?
   Normalmente, “Vou ver o que posso fazer...” pode ser “traduzido” como “Nao enche meu saco!” Mas, mesmo sem saber porque, ele achava que arrumaria um modo de alcançar sua meta.
   Agenor continuava sua vida, agora dando uma trégua a seu “modus vivendi”. Pelo menos ate’ se certificar que as diferenças entre la’ em cima e la’ em baixo valiam a pena...
   Dois domingos depois voltou a falar com Padre Cascudo...
-  E ai seu padre? Conseguiu alguma coisa?
-  Meu filho, pensei que você estivesse de brincadeira...
-  Seu padre! E’ serio! Trata-se da minha salvação eterna... O senhor tem que me ajudar.
-  Meu filho, me da’ mais uma semana. Vou resolver isto. Com certeza!
   Duas semanas depois, em uma missa, Dom Cascudo chamou aquele fiel e pediu para que, depois da missa, fosse falar com ele.
   Agenor não parou de tremer a missa toda. Estava tao nervoso que, mesmo sem saber, rezou dois terços, pratica que havia adquirido algumas semanas antes, com a finalidade de limpar um pouco sua barra. Não que tivesse a intenção de rezar mais do que deveria mas, com aquele nervosismo, sua mão tremia tanto que pulava uma conta para frente e duas para trás.
   No final da missa, la’ foi ele em direção `a sacristia... Ao olhar para o padre, ainda tremendo de nervoso falou:
-  Seu Padre, e’ melhor deixar pra la’. Não sei se quero saber sobre coisas que não devia...
-  Agora e’ tarde meu filho... Ja’ ta’ tudo combinado. Assim que eu fechar a igreja você  vai ter sua
   resposta. Disse Dom Cascudo.
   Enquanto o padre fechava a igreja, Agenor tremia tanto, apoiado a uma mesinha da sacristia, na qual tentava se segurar, que os santinhos sobre ela começaram a cair, um por um, espatifando-se ao chão. Cabra esperto, sorrateiramente, levantava a toalha que forrava a mesinha e com a ponta dos pés empurrava os cacos quebrados para embaixo da mesa... Ate' chegou a pensar se isso seria considerado pecado... Mais um!
   O padre voltou e, enquanto tentava acalmar sua “ovelha negra”, uma luz mais clara do que a do sol invadiu a igreja e procurou seu caminho ate’ onde estavam.
   Assim que toda aquela claridade penetrou o interior completamente, um anjo apareceu dizendo:
-  Venha meu filho, vamos fazer um “tour” pela vida eterna...
   Agenor nem conseguia falar...
   O anjo pegou o homem pela mão e saíram atravessando parede, porta, muro... Apos subir um pouco no espaço, tomaram velocidade e desceram como um foguete, passando pelo chão, entrando na terra e viajando alguns minutos por uma escuridão assustadora.
   Pararam por alguns segundos e, de repente, uma claridade começou a revelar uma enorme mesa, repleta de comida, um Smörgåsbord, melhor dizendo. Todas as iguarias do mundo sobre uma mesa que se perdia de vista, com cadeiras de ambos os lados e, as pessoas sentadas em frente a tudo aquilo magras, com o semblante de desespero, famintos, sem saber o que fazer ja’ que a distancia entre as cadeiras e o centro da mesa era muito grande e, as colheres `a sua frente, atadas `as mãos, com mais de um metro de comprimento, eram suficientes para alcançar as travessas de comida mas, por serem muitos grandes, não permitiam que conseguissem levar qualquer alimento `a boca.
   O anjo olhou para Agenor e disse:
-  Ja’ viu como e’ o inferno?
   Ao reparar o aceno afirmativo que o homem fez com a cabeça, o anjo falou:
-  Vamos ao céu!
   Depois de minutos rompendo a escuridão, ainda de mãos dadas, saíram sobre as ruas velozmente e voavam em direção ao firmamento...
   Chegando muito acima das nuvens, pararam sobre uma imensidade toda azul claro...
   Novamente, apos alguns segundos, outra imagem se revelava. A mesma cena... Uma mesa enorme exatamente igual `a que haviam visto no inferno. As mesmas cadeiras, as mesmas colheres, as mesmas comidas, tudo exatamente igual. Mas as pessoas sentadas `a mesa estavam alegres, bem nutridas, coradas, felizes...
   Agenor não entendeu nada mas ficou curioso...
   O anjo olhou para Agenor e disse:
-  Ja’ viu como e’ o céu?
   Depois de notar o aceno afirmativo com a cabeça, o anjo pegou o homem pela mão e voltaram para a sacristia da Igreja.
   Em la’ chegando, Dom Cascudo ainda aguardava por eles.
   Ao colocarem os pés no chão, Agenor reuniu todas suas forcas e, vencendo o pavor, perguntou ao anjo:
-  Não entendi nada! Pelo que vi não ha’ diferença entre o céu e o inferno. Com colheres daquele
   tamanho, ninguém consegue se alimentar. Mas porque as pessoas no céu estão tao felizes e as do
   inferno tao sofridas?
   O anjo olhou para ele e, com um sorriso sutil explicou:
-  E’ porque no céu, uns alimentam aos outros.

   Nossa vida pode ser muito fácil ou muito complicada. A opção e’ nossa!...






Copyright 2013 Eugenio Colin
  

  

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

O PLANO NATALINO







                                                             O Plano Natalino








   `Aquela noite, um homem, andando pelas ruas de Boston, viu a sua frente uma mulher loira, alta, muito elegante, de salto alto, que despertou sua curiosidade...
   Apressou o passo e olhando para ela, andando a seu lado falou:
-  Can I ask you something?"
   A mulher olhou pare ele, de relance, não deu importância, e seguiu seu caminho. Ele deixou, propositadamente, que ela andasse um pouco `a frente.
   Depois de olhar para seu rosto, sentia uma compulsão em falar com ela. 
   Decididamente, era a mulher mais linda que jamais havia visto.
    Apressou um pouco o passo para que `a ela pudesse chegar novamente mas, o olhar serio que viu estampado em seu rosto o fez deixa-la seguir, mais uma vez. Quando ela ja' quase havia sumido de sua vista apressou-se, agora com determinação, tentando resgata-la. Não podia deixa-la passar. Tinha que falar com ela. Tentou finalmente.
-  I just want to ask you something! May I?
   Ela apressou o passo, andando rápida e impecavelmente naqueles saltos altos que a faziam tao elegante.
   "- Puxa vida! Acho que não tem jeito..."  Pensou o homem consigo mesmo quando, pode perceber
    um sorriso no rosto da mulher.
   De repente, lembrando-se que muitos Brasileiros vivem em Boston, arriscou:
-  Você e' Brasileira?
-  Sim! Foi a única resposta que ouviu.
   Tentou puxar conversa, andando ao seu lado mas, ela mudava de direção, propositadamente colocando outra pessoa, que pela rua também andava, ente os dois. Depois de varias tentativas infrutíferas, a mulher pegou um ônibus e se foi. Não sem deixar na mente daquele homem uma imagem que ele, tinha certeza, guardaria para sempre.

    Elfinho voltou para o céu e, antes da reunião daquela noite, disse a Papai Noel...
 -  O senhor lembra daquela carta maluca que recebemos do Bundinha Doente pedindo uma mulher
    como presente de natal? Hoje eu vi a mulher que ele quer...
 -  O nome do homem e’ Horinando Bundin Dodói... Guardei a carta... Falou papai Noel. 
 -  Mas como você sabe ser a que ele quer? Finalizou.
 -  E’ uma Brasileira, loira e de bunda grande... Bonita pra cacete... Ta’ na cara! Ademais, ela tem
    cara de quem gosta de chup...
-  Para! Modere seu palavreado. Isto aqui e’ o céu. Não o botequim que você frequentava quando
   estava vivo e era bicheiro...E o que você fez? Indagou o “velinho”.
-  Nada! Eu não sabia se o senhor queria dar a mulher ao cara...
-  Por falar nisso, o que você estava fazendo em Boston ao invés de trabalhar aqui? Estamos
   enrolados ate' o pescoço e você passeando? Indagou Papai Noel.
-  Estava com vontade de fumar um cigarrinho e tomar uma cerveja e senhor proíbe tudo aqui...
   Respondeu Elfinho.  
   Depois de ouvir a historia, Papai Noel levou o assunto `a reunião daquela noite e ficou resolvido que, se fosse possível, ele deveria dar a mulher de presente. Além de fazer o cara feliz, ganharia mais um aliado para comprovar a veracidade deste mito que envolve o Natal.
   Ali mesmo, ordenou `a Elfinho, aquele duende rebelde, que voltasse ao mesmo lugar no dia seguinte e falasse com a mulher, de qualquer maneira...
   Todas as noites, Elfinho voltava para o céu, com um bafo de cerveja e cheiro de cigarro difícil de aguentar dizendo a Papai Noel; “- Nada!”
   Os dias se passavam e todos no céu ja’ estavam preocupados. Agora era uma questão de honra... A mulher tinha que ser encontrada. O dia de Natal estava chegando...
   Finalmente, na manha do dia 23, Elfinho, de volta `a Boston, estava quase jogando seu cigarro fora quando uma estranha pediu que acendesse o cigarro para ela. Ele tirou o isqueiro do bolso, o acendeu, e sentiu uma das mãos da mulher tocando a sua, tentando proteger a chama do vento gelado. Ao levantar o rosto, em sua direção, levou um susto... Era a mulher por quem procurava...
   Desta vez não podia deixa-la escapar. Usando de toda sua sutileza, passou a mão na bolsa da mulher e saiu correndo.
   Como era um duende, podendo ate’ voar se quisesse, ninguém o alcançou...
   Logo após bisbilhotar seus documentos e escrever o que interessava, voltou ao mesmo lugar e devolveu a bolsa `aquela mulher... Assim que ela viu o baixinho gritou: “- Foi esse ai quem roubou minha bolsa!”
   Pra que! Começaram a meter porrada no pobre duende que, se não conseguisse voar, morreria pela segunda vez.
   Quando Papai Noel o viu chegar ao céu todo arrebentado, perguntou:
-  O que aconteceu?
-  Deixa pra la’ “patrão”. Tenho aqui todas as informações daquela mulher...
   Papai Noel conferiu tudo que Elfinho escreveu em um papel e começou a traçar seus planos para satisfazer o pedido que o homem havia feito naquela carta maluca.
   Na mesma noite “fez” com que Horinando pensasse em entrar num dos sites de namoro pela Internet. Tratou que a “coincidencia” o fizesse escolher mesmo que a mulher também frequentava...
   A tristeza da noite solitária daquele homem, foi completamente transformada quando viu o primeiro perfil. Alem da foto que “tinha certeza” ja’ havia visto antes, O cabeçalho de sua descrição dizia: “Procuro por um homem que goste de mim, não so’ da minha bunda...”
   Horinando mandou uma mensagem e, imediatamente foi respondido.
   Mais duas mensagens e a mulher lhe deu o numero do telefone. Mais alguns minutos e ja’ estavam conversando `a viva voz, começando a se entender e, em poucas horas, descobriram um no outro o que sempre procuraram... Agora! Diz que Papai Noel não sabe o que faz...
   No dia seguinte, véspera de Natal, quando haviam combinado se encontrar, conversando casualmente, Nilde, nome daquela mulher, disse que tinha a sensação que ja' houvessem convivido antes. Que apenas estavam se reencontrando...
   Na primeira vez que Horinando ouviu esta sentença não deu muita importância.
   Quando ouviu a mesma observação pela segunda vez, como que por instinto, sorriu. Nilde olhou para ele, sorrindo também e me perguntou:
-  O que foi?
   Sorriu novamente! "O que foi?" Insistiu curiosa...
   Ele a olhou e disse:
-  Ja' sei! E' verdade, ja' havíamos nos visto antes...
-  Quando? Perguntou Nilde.
-  Em Boston, andando na rua. Tentei conversar mas não recebi tua atenção. Depois de varias
   tentativas, você pegou o ônibus e foi embora. Hoje, depois que te conheci pessoalmente, sabendo
   que teu irmão vive em Boston, me lembrei que foi la' que te vi pela primeira vez.
   Ela olhou para seu companheiro, como se estivesse tentando reconhece-lo e, depois de algum tempo, apenas sorriu. Não sabia se convencida, se conscientizada de que esse fato era real ou apenas reflexo das muita imagens que, na esperança de se encontrarem, fizeram um do outro e agora, depois de algum tempo, começavam a tomar forma.
    Depois de passarem o dia juntos, repleto de conversas, passeios, reflexões, troca de carinhos, decidiram começar a explorar mais a magia daquele encontro. Se deram a mão e saíram felizes com o presente de Natal que haviam se dado um ao outro...

   Do céu, Papai Noel olhava, feliz ao constatar que o plano havia dado certo...
   Elfinho, a seu lado, percebendo a felicidade do velhinho, perguntou...
-  E se este encontro não tivesse dado certo?
   Papai Noel, olhando para ele com um olhar de quem sempre soube o que fazia, apenas sorriu ironicamente, em resposta...
-  Não era mais fácil pegar logo a mulher e dar para ele amanha, ao invés de ter corrido o
   risco de não se entenderem? Perguntou Elfinho.
   Papai Noel, olhando para ele mais uma vez, com toda sabedoria, respondeu:
-  Você sabe me dizer como fazer uma bunda daquele tamanho passar pela chamine'?...







Copyright 2013 Eugenio Colin












segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

CHRISTOBEL








                                                                 Christobel






   Christobel, costumava dizer que o Natal como uma festa sem o menor sentido, apesar de viver em Santa Claus, Indiana, conhecida como "a cidade do Natal dos Estados Unidos."
   Segundo ele, a noite de 24 de dezembro era a mais triste do ano, porque muitas pessoas se davam conta de quão solitárias eram, ou quanto sentiam a ausência da pessoa querida que não esteve presente durante o ano.
   Mas, Chris era um homem bom. Achava que “Natal” foi criado pelo comercio para iludir o crédulo e vender tudo que ninguém precisava...
   Tinha uma família unida e amorosa, sempre ajudava ao próximo, e era honesto nos negócios. Entretanto, não podia admitir que as pessoas fossem ingênuas a ponto de acreditar que um Deus havia descido à Terra só para consolar os homens.
   Sendo uma pessoa de princípios, não tinha medo de dizer a todos que o Natal, além de ser mais triste do que alegre, também estava baseado numa história irreal; um Deus transformado em homem.
   Como sempre, na véspera da celebração do nascimento de Cristo, sua esposa e seus filhos se prepararam para ir à igreja e, como de costume, ele resolveu, mais uma vez,  deixá-los ir sozinhos, dizendo:
-  Seria hipocrisia da minha parte acompanhá-los. Estarei aqui esperando pela volta de vocês.
   Quando sua família saiu, sentou-se em sua cadeira preferida, acendeu a lareira, e começou a ver as noticias daquele dia, pela televisão.
   Entretanto, logo foi distraído por um barulho na sua janela, seguido de outro e, mais um.
   Achando que se tratava de alguém jogando bolas de neve, pegou o casaco para sair, na esperança de dar um susto no intruso.
   Assim que abriu a porta, notou um bando de pássaros que haviam perdido o rumo devido a uma tempestade e, agora tremiam na neve.
   Como aqueles passaros haviam notado a casa aquecida, tentaram entrar, mas, depois de repetidas tentativas chocando-se contra o vidro, machucaram suas asas, e não podiam mais voar. "- Não posso deixar essas criaturas aqui fora", pensou Chris. "- Como ajuda-las?"
   Ele foi até sua garagem, abriu a porta e acendeu a luz.
   Os pássaros, porém, não se moveram.
   "- Eles estão com medo", pensou...
   Então, entrou na casa, pegou alguns miolos de pão, e fez uma trilha até a garagem aquecida... A estratégia não deu resultado.
   Christobel abriu os braços, tentando conduzi-los com palavras carinhosas, tentou empurrar delicadamente um e outro, mas os pássaros ficaram ainda mais nervosos. Começaram a se debater, andando sem direção pela neve e gastando inutilmente o pouco de energia que ainda possuíam.
   Ele já não sabia o que fazer...
-  Vocês devem estar me achando uma criatura aterradora. Disse, em voz alta. Será que não entendem
   que podem confiar em mim? Finalizou..
-  Se eu tivesse, neste momento, uma chance de me transformar em pássaro, só por alguns minutos,
   vocês veriam que eu estou apenas tentando salvá-los! Disse, como se estivesse conversando om as
   aves.
   Neste momento, o sino da igreja tocou, anunciando a meia-noite...
   Um daqueles pássaros transformou-se em anjo com asas prateadas e reluzentes que se moviam ligeiramente, iluminadas por um raio de luz que vinha de uma das estrelas do céu. Tentando manter-se parado, poucos metros acima do chão disse `aquele homem assustado, imobilizado por uma cena inusitada pela qual não estava esperando:
-  Agora você entende por que Deus precisava transformar-se em Homem?







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segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

PAPAI NOEL









                                                                Papai Noel








   Estava sentado na sala de visitas da casa da Sheila, amiga de muitos anos, quando ouvi Pedrinho, seu filho mais novo dizendo:
-  Victor! Papai Noel não existe... Você parece mais criança do que eu...
   O assunto dos meninos, em uma conversação paralela `a nossa era, evidentemente, o Natal.
   Imediatamente, minha amiga, que conversava animadamente, quase como que usando as mãos como palavras, deixando sobrar uma porradinha de leve em meus bracos de vez em quando, talvez, em sua ideia, tentando me manter acordado, sem de leve saber que sempre mereceu minha total atenção em nossas conversas, neste caso, sem a necessidade de me catucar tanto, parou de falar e disse:
-  Ta vendo! Isto e’ o que se ensina nas escolas hoje em dia... 
   Ao realizarmos que não conseguiríamos entender o motivo, ou origem, da conversa dos meninos, continuamos a nossa...
   Dias depois, lembrando daqueles momentos agradáveis que desfrutamos, pensava na afirmação do Pedrinho... “- Victor! Papai Noel não existe...”
   Mina imaginação me reportou aos meus dias de criança...
   Uma das lembranças mais vividas que trago em minha memoria e’ um poster muito grande, com mais de um metro de altura onde se via aquela famosa figura de Papai Noel, pintada por Norman Rockwell, com o dedo polegar apontando para um quadro onde estava escrito: “Trouxe o que me pediram, cumpram o que me prometeram...”
   Este poster “apareceu” em frente a minha cama em uma manha de Natal...
   Procurando pela verdade, ja’ que, por algum tempo em minha vida, me sinto apto a tomar minhas próprias decisões, me deparei com centenas de artigos, alguns inclusive muito bem detalhados, que provam cientificamente que Papai noel nunca poderia existir...
   Alguns outros, não tao bem elaborados, que afirmam justamente o oposto: Papai Noel existe!
   Mas, de tudo que li, o que mais me chamou atenção foi a declaração de uma Psicanalista Australiana, Melanie Klein (1882-1960) que relata ter experimentado negar a existência do “velinho” a seus filhos. Ela acreditava que a realidade devia prevalecer em qualquer circunstância... Um dia, perto do Natal, se deparou com um pedido dos filhos para se mudarem para a casa da vizinha. Ao tentar saber o motivo daquele pedido, ouviu em resposta: “- E’ que la', Papai Noel existe.”
   Não estou aqui me referindo a mentir ou dizer a verdade... Estou falando sobre crença ou descrença...
   Em um dos mais importantes documentos da humanidade, a Declaracão da Independência Americana, uma das passagens mais marcantes afirma “que todos os homens são criados iguais, que eles são dotados pelo seu criador com certos direitos inalienáveis, que entre eles estão Vida, Liberdade a a busca da Felicidade.”
   Estas palavras tem ajudado a ditar os destinos de Americanos e vários outros povos através dos anos.
   Ora, se tenho direito `a busca da Felicidade, então posso decidir em que acreditar para ser feliz, certo?
   Mas, e’ cientificamente impossível provar que Papai Noel existe...
   Também e’ cientificamente impossível provar como o mundo começou... Existem teorias e’ fato mas, nenhuma delas podem ser comprovadas... Os cristãos dizem que foi Deus quem criou o mundo.
   Os céticos diriam; mas se nem Deus existe como pode alguem ou entidade que não existe criar algo real como o mundo?
   Alguns cientistas acreditam na teoria do “Big Bang” como o inicio do mundo. O que afirmam ser a explicação mais provável... Provável! Não comprovável!
   Ninguém estava la’, naquele momento, para atestar... Então, posso dizer que o mundo não existe... Mas eu estou aqui, agora, como não existe? Neste caso a coisa se torna mais complicada ainda! Estamos vivendo em um mundo que não sabemos como apareceu, mas temos que acreditar nisso, ja’ que aqui estamos...
   Mas se o “Big Bang” não pode ser comprovado e e’ só o que temos, porque temos que comprovar a existência de Deus? Ou Papai Noel?
   Porque temos que acreditar so’ no que e’ comprovável?
   Nos Estados Unidos, centenas de cientistas tentam desvendar os mistérios que envolvem as atividades do cérebro humano. Ate’ hoje não sabemos como muitas atividades do nosso cérebro ocorrem. A consciência, os sonhos, o medo, como nossa memoria e’ arquivada, a percepção, movimento e reação, são alguns dos mistérios do cérebro que talvez nunca sejam esclarecidos
   Então? Nosso cérebro existe? Claro que exite! So’ não sabemos como funciona...
   Desde que nascemos sempre convivemos e vamos continuar convivendo com fatos inexplicáveis... Porque só Papai Noel tem que ser explicado?
   Papai Noel e’ importante para uma criança. Desrespeitar a fase de desenvolvimento na qual a criança precisa usar a imaginação para entrar aos poucos na realidade pode ter o efeito contrário. Quando não encontra espaço para transgredir com suas histórias fantásticas porque é tachada de mentirosa, a criança pode crescer se reconhecendo como tal.
   As lembranças de nossa infância são as mais importantes em nossa vida.
   Kane ( do filme Citzen Kane ), o homem nais rico do mundo `a sua época, morreu dizendo “Rosebud”, nome de seu skate quando era menino e pobre, a única lembrança feliz de sua vida.

   Creio que os que defendem a existência de Papai Noel são mais simplistas, menos elaborados, porque acreditam ser algo tao real e evidente que não necessita de muitas explicações... Ja’, as teorias complexas tem que estar sempre procurando algo para justificar a falta de probabilidade encontrada a cada descoberta.
   Desmentir a fantasia de uma criança e’ o mesmo que podar sua criatividade e imaginação definitiva e perigosamente.
   A vida e’ uma transição gradual onde ela mesma se encarrega, inexplicavelmente, de corrigir percepções, ajustar pensamentos, e como um filtro separar ficção de realidade. A diferença e’ que o remanesceste dessas fantasias separadas pelo “filtro da vida” ao invés de serem descartadas, serão guardadas definitivamente em nossa memoria, sempre acompanhadas de um sorriso puro e infantil, a cada vez que forem chamadas, mesmo que por alguns segundos, `a realidade em que vivemos no momento, certamente bem mais complicada.
   Pedrinho estava errado. Papai Noel existe! E, o mais maravilhoso e’ que cada um de nos tem o poder de encontra-lo de sua forma pessoal e particular.
   E, o pior e’ que, vai chegar um dia em sua vida, quando pensar que sabe tudo, em que vai procurar por Papai Noel e não vai encontra-lo em suas lembranças porque, quando era criança, acreditava que o “velinho” era apenas uma mentira, que nunca fez parte da realidade na qual foi criado.




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terça-feira, 3 de dezembro de 2013

PERMISSÃO PARA COMER O MEU PERU








         
                                             Permissão para comer o meu Peru





   Nas vésperas de Natal, Papai Noel recebe algumas cartas inusitadas, algumas das quais difíceis de acreditar. Esta foi uma delas, enviada da cidade de Intercourse, Pensilvânia, USA, votada pelos “Duendes” como a mais estranha do ano...

   Querido Papai Noel,

   Como  o senhor bem sabe, América fica realmente especial nesta época do ano…
   As ruas são enfeitadas com motivos natalinos, sinos prateados, fitas vermelhas e verdes, figuras de Papai Noel, laços vermelhos… Ate’ muitos carros são decorados por seus motoristas. Os Shoppings então, nem se fala. Parece que o espirito de Natal desce nesta terra. Isto acontece ano apos ano e, por incrível que pareca, todos ficam excitados, alegres, entusiasmados como se nunca houvesse acontecido, como se tudo fosse novidade, como uma criança que vê Papai Noel pela primeira vez.
   Estações de radio tocam musicas de Natal o dia inteiro. Alguns canais de televisão exibem filmes de Natal diariamente, ouvimos histórias de milagres, alguns ate’ bastante plausíveis que, com um pouco de imaginação e boa vontade, bem que poderiam acontecer…
   Aqui, em locais de trabalho, enormes árvores de Natal, que quase chegam ate’ o teto são armadas e decoradas e, ao lado delas, muitas vezes um CD player toca musicas de Natal o dia inteiro.
   Antes do dia de Ação de Graças, muitas empresas distribuem `a cada empregado um brinde e, na semana antes do Natal, um presunto, daqueles que no Brasil ficam nas vitrines dos balcões das padarias, principalmente para fazer sanduíches.
   Tudo isso, toda esta fantasia que paira no ar, nos faz sonhar, aderir ao “espirito natalino” como se diz e, transformar em realidade os nossos desejos mais íntimos e importantes.

   Ela estava tao real… Parecia que a via comigo, a meu lado, sentada, como estivemos tantas vezes antes. A “contemplava” a meu lado, de pernas cruzadas, relaxadamente feliz, com as mãos no queixo, olhando para mim com o um sorriso maravilhoso, esperando que eu tomasse a iniciativa…
   Olhei para a moca, tirei o peru que trazia guardado `a algum tempo e botei para fora. Imediatamente “vi” sua mão linda e delicada segurando o peru pela ponta. Com um sorriso alegre, realizado, feliz, o colocou em sua boca de uma so’ vez, como se fosse um petisco, ainda olhando para mim, como se estivesse pedindo autorização , como se precisasse de permissão para comer o meu peru que, e’ claro, como tudo mais que tenho, seria dela também.
   Sentia esta presença tao viva e real, a mesma que me acompanha dia e noite, onde quer que eu va’, o que me alegra com uma companhia tao doce e agradável e que muitas vezes me faz sorrir sozinho, lembrando de nossas "conversas", de algo que disse e a fez feliz e, da felicidade que aquele sorriso me trouxe.
   Ainda fiquei algum tempo sentado, no mesmo lugar onde, apenas alguns minutos atrás via a mesma linda figura em minha frente, enchendo a casa de alegria e felicidade, com o som daquela voz ecoando pelas paredes que há alguns meses eram tao tristes e agora parecem que entendem o que ouvem e fazem com que as palavras ressoem, como tentando a tarefa impossível de embelezar aquela linda voz.
   Mais uma vez olhei para ela, segurando o peru que havia colocado na boca, mordendo delicadamente como se estivesse com medo de machucar.
   Estava curioso… Os dois tomates ainda estavam no mesmo lugar, ela ainda não os havia tocado. Toda vez que pegava o peru, via sua mão encostar em um deles mas, agia como se estivesse querendo evita-los… Sera’ que vai deixar para o final, para depois que estiver saciada, ou sera’ que não gosta dos tomates que acompanham o peru, pensei…
   Sinceramente, ao botar o peru pra fora, ate' havia pensado em fazer uma sacanagem mas, como  todos sabem, sacanagem sozinho não e' a mesma coisa. Alem do mais, o trabalho em agrupar em um palito tantos ingredientes, so’ vale a pena se tivermos alguem com quem dividir trabalho e prazer...
   Estava tao envolvido, tao absorto em meus pensamentos que nem percebi quando o sinal do forno me avisava que a refeição ja’ estava pronta.
   “Despertei”! Olhei para “ela” mais uma vez e percebi que estava sonhando acordado. Acho ate’ que “vi” quando ela não estava sentada na cadeira e sim dentro de mim com uma presença tao real e absoluta que por vezes se torna difícil de entender onde realidade e fantasia se separam.
   Levantei, ainda sorrindo, fui ao forno trouxe para a mesa o peru que havia acabado de preparar, juntamente com os tomates que antes havia descascado. Coloquei tudo sobre folhas de alface, “enfeitei” o peru com algumas fatias de cebola e trouxe para onde, apenas alguns minutos atrás, estava “sonhando”.
   Tenho certeza que, algum dia, vou ter a chance de, muitas vezes, dividir com alguem o peru, com ou sem os tomates, ou qualquer outra refeição que eu preparar... Mas a ansiedade que este momento chegue depressa e’ tao grande que, muitas vezes, me vejo sonhando acordado, me deliciando com uma mulher ainda “sem rosto”,  vivendo o futuro, tentando segurar junto a mim este sonho, o quanto puder, na esperança de que assim o fazendo, possibilite ao tempo passar correndo, sem nos enxergar, sem ver minha pressa em vê-lo `as nossas costas.
   Hoje, sonhei com quem ainda não conheço e, por alguns segundos ela esteve aqui comigo, compartilhando uma das tradições Americanas, ceando comigo o peru de Thanksgiving.

   Sei que e’ difícil para o senhor dar mulheres de presente mas, sendo Papai Noel e sabendo de tudo, talvez consiga e, se for possível, escolher uma para mim, dê preferência a mesma com quem vivo sonhando por algum tempo e que, ate’ ja’ colocou meu peru na boca...
   Por favor, encontre ela para mim...Não estou querendo lhe ensinar o que fazer mas, se a achar e mencionar o que ela fez, e' bem provável que se lembre.
   Ah! Se por acaso o senhor for entrar com ela pela chamine', tome cuidado... A bunda dela e’ grande, e pode ficar “engasgada”...

   Obrigado e, Feliz Natal!

   Horinando Bundim Dodói.




Copyright 2013 Eugenio Colin

terça-feira, 26 de novembro de 2013

SINAIS DE DEUS








                                                        Sinais de Deus







   Em 1993, por oitenta e um dias consecutivos o grande Rio Mississippi permaneceu inundado, matando cinquenta pessoas e causando um prejuízo enorme em danos e perdas. Muitos diziam que aquela era uma enchente que chegou e decidiu ficar para sempre. As águas cobriam uma área de mais de quarenta e quatro mil quilômetros quadrados...
   Todos que tinham chance estavam evacuando, assustados e temerosos.
   Dick Crotch um homem muito religioso, temente a Deus, estava em pé na varanda, com água cobrindo sua pernas, quando o motorista de um daqueles caminhões enormes, que as rodas são maiores do que uma pessoa, que por sua casa passava, falou:
-  Vem! Te dou uma carona. A enchente esta’ aumentando muito rápido...
-  Não se preocupe, meu Deus vai me salvar... Disse o Dick, invocando toda sua fe’...
   O caminhão foi embora, rapidamente tentando fugir da situação...
   As aguas estavam implacáveis, subindo rapidamente.
   Dick, tentando se proteger, agora estava na varanda de um quarto no segundo andar da casa.
   Ali esperava quando apareceu um barco que ja’ havia resgatado alguns moradores desesperados. Assim que o homem ao leme do barco viu seu vizinho, falou:
-  Dick, vamos embora, a enchente esta’ enorme...
-  Não se preocupe, meu Deus vai me salvar... Disse Dick com toda sua fe’ do mundo...
   O barco se foi, deixando o homem para traz...
   Mas a enchente não queria saber conversa e continuava inundando tudo.
   A esta altura, nosso amigo ja’ estava em pe’ no teto da casa quase totalmente coberto pelas águas...
   Olhando para cima viu um helicóptero jogar uma corda e o piloto gritar:
-  Vem! Esta cidade vai ser completamente destruida em alguns minutos...
-  Não se preocupe, meu Deus vai me salvar, respondeu Dick, com toda fe’ do universo...
   O piloto olhou para ele, balançando a cabeça, como se estivesse dizendo, “Que babaca!”
   A agua inundou toda a cidade, arrasou tudo  e Dick morreu afogado...
   Chegando ao céu, indignado pelo descaso do Criador, por ele esperava, pronto para lhe dar o maior esporro...
   A demora o irritava cada vez mais. Pensava na maneira mais agressiva de confrontar Deus, quando o viu ao horizonte, caminhando vagamente sobre as nuvens...
   Mesmo de longe, assim que avistou Dick nervoso, andando de um lado para o outro, começando a abrir a boca, Deus disse:
-  Nem vem! Não quero ouvir nada! Te mandei um caminhão, um barco e um helicóptero... Que mais
   você queria?

   A historia de Dick Crotch nos lembra um fato muito importante... Devemos sempre saber distinguir e, principalmente, não ignorar os sinais de Deus.




   Copyright 2013 Eugenio Colin

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

JUJUBA








                                                               Jujuba







   Jujuba costumava dizer que se não fosse pela falta de sorte ele não teria sorte de especie alguma.
   O interessante e’ que apesar de ter feito um sacrifício filho da puta para perder quase sessenta quilos seu apelido continuava o mesmo... O problema e’ que ninguém havia conseguido qualifica-lo adequadamente. Não podia ser chamado de “palito” ja’ que não era esquelético, não podia ser chamado de “atletico” porque havia acabado de emagrecer e seus músculos ainda estavam flácidos. Ser apelidado de “Hulk” então, nem pensar... Na falta de uma nova classificação adequada a seu novo porte físico, a alternativa era continuar sendo “Jujuba”. O que, diga-se de passagem não o aborrecia muito... Aos dezenove anos de idade ainda estava por decidir o que era menos pior, “Jujuba” ou Carlozencio Aparecido das Neves, seu verdadeiro nome.
   Mas ele nem se preocupava com o nome ou apelidos pejorativos. Tinha um problema maior em sua vida de adolescente... Estava apaixonado pela Márcia...
   Márcia era a garota mais popular e, alem disso, fazia parte do time de natação do clube que frequentavam. As garotas na natação eram como o chantili do bolo... Primeiro porque tinham que mostrar as coxas para todo mundo. Ninguém nada vestida!  Segundo porque não gostavam dos homens que nadavam, que eram os mais bonitos do clube... Elas diziam que só tinha bicha na natação...
   Todo mundo queria namorar a garota...
   Um dia de passagem, Márcia disse; “Alo, tudo bem?” ao cursar por Jujuba. O cara só não se cagou todo porque ainda estava naquela dieta rigorosa, para perder os últimos quilinhos recalcitrantes e, o dia inteiro ainda hão havia colocado nada no estomago. Naquele dia que ela o cumprimentou quando passou pelo rapaz em uma alameda do Tijuca, ele ficou tao nervoso que deu uma porrada com a cabeça na parede que nem viu`a sua frente... Quando chegou em casa com a testa sangrando, ainda meio desnorteado, seu pai perguntou: "quem fez isso com você?" Sem mesmo saber o que estava falando respondeu: " A Márcia!" Ainda ouviu seu pai comentar: "Agora você apanha de mulher?
   Mas seu pai não sabia de nada. A Márcia havia falado comigo, e isto era algo para ser guardado a vida inteira. O machucado na testa ficaria curado em alguns dias...
   Ela acabou namorando o Egberto, campeão de tênis do clube, cabelos pretos olhos azuis e quase dez centímetros mais baixo do que Márcia. Como alguns atores do cinema Americano que cismam em se casar com mulheres mais altas do que eles.
   Mas Egberto não tava nem ai, era o maior cara de pau... Namorava a menina mais linda e cobiçada do bairro e ainda “galinhava” atrás de qualquer rabo de saia que cruzasse seu caminho.
   Um dia Márcia se encheu de tanta falta de respeito e terminou o namoro com o Egberto. O cara ficou tao abalado que foi pego chorando pelos cantos escuros do clube varias vezes... Pediu, implorou, prometeu mas Márcia estava irredutível... Não queria mais saber do cara...
   Jujuba, por sua vez também tinha seus interesses amorosos atrás dele. A primeira foi a Angela, apelidada de Angela Man. Diziam que ela andava igual a um homem. Reta, sem o menor rebolado, depois foi a Frieda Staerke, loira, olhos azuis... Gordinha, meia "sem sal" e, segundo a maioria dos rapazes, cheirava a sabonete. Parecia que havia acabado de sair do banho, não importava a hora do dia, o que, pensando bem, e’ mais uma qualidade do que um defeito.
   Mas Jujuba não era de deixar vencer pelo destino padrasto que o perseguia... Apendeu a dançar... Dançava como ninguém! Nas ferias escolares, quando não precisava acordar cedo, ia a baile de formatura todo o dia... Ate’ as mães das meninas faziam fila para dançar com ele. Por isso mesmo, com o tempo, as garotas começaram a achar que o Jujuba so’ gostava de coroa e, não queriam mais dançar com ele. E’! O cara era mesmo sem sorte...
   Um Sábado, estava programado o “Baile da Maria Cebola”, no clube em que frequentava.  Jujuba nem queria ir... Gostava de dançar, certo! Mas achava que nenhuma menina o convidaria e assim sendo estaria se preparando para tomar chá de cadeira a noite inteira e o pior e’ que uma das “regras” do baile, alem da tradicional; homem não pode tirar mulher pra dançar, era que, ninguém poderia recusar o convite de uma dama... Ora! Então, o “Baile da Vinganca” como era apelidado pelos pobres meninos sempre rejeitados, não faria o menor sentido... Durante o ano inteiro os caras eram ignorados. Agora, no único dia em poderiam dar o troco, “tiraram o dinheiro de seus bolsos.”
   Mas, Sábado sozinho em casa, assistindo ao Moacyr Franco Show, em preto e branco, não era, nem de perto pareo para o baile da Maria Cebola... Pelo menos no baile as garotas eram em cores...
   Começou o baile e nada... A musica era excelente. Os rapazes da natação, mesmo sendo bicha, estavam dançando o tempo todo, o Egberto então, nem se fala. mas Jujuba estava la’ sentado no mesmo lugar, quase com calo na bunda.
   Ja’ haviam se passado quase duas horas de baile quando, distraído, uma mão batendo com os dedos na mesa, sequencialmente e a outra segurando o rosto, quase sonolento, sentiu um perfume familiar e uma mão suave e delicada tocando seu pescoço... Levantou a cabeça ainda a tempo de ver o rosto mais lindo do mundo falar ao seu ouvido;
 Dança comigo!
   A Márcia! `A sua frente, trajando um vestido preto com bolinhas brancas, cabelos soltos como não costumava usar, mais linda do que nunca...Novamente! Jujuba so’ não se cagou todo porque não tinha o habito de comer nada antes de ir a um baile.
   Pergunta se Jujuba recusou o convite... Dançaram a noite inteira... E toma elogio da Márcia... Você dança tao bem... Como você esta’ elegante... Adorei seu penteado assim para o lado... Você esta’ parecendo um ator de cinema Americano... Adoro a maneira que você me segura, firme e delicadamente ao mesmo tempo...
   Depois de tanto elogio, se a cueca de Jujuba não fosse nova e bem apertada, a pobre da Márcia seria arremessada pro lado de forra do salão pela “catapulta” do rapaz.
   Em dado momento ele ate’ contemplou a possibilidade de se matar ali mesmo. Morrer dançando com a Márcia era o passaporte para o paraíso. Depois acabou desistindo da ideia... Não queria ensanguentar um vestido tao lindo.
   O cara não acreditava o que estava acontecendo... Imagina so’! Ate’ o Egberto estava com ciumes dele.
   No fim do baile, Márcia falou:
-  Aparece mais! A gente pode ate’ conversar depois dos treinos...
   Jujuba nunca apareceu... E’ Claro que a garota estava de gozação. Pensou... “A mais cobiçada do bairro dando bola pra mim?” Devo estar jogando pedras na lua...
   Então, aconteceu um fato inusitado na vida do Jujuba...
   A Maria Luiza, que havia acabado de terminar o namoro com o Vadeco. Pediu então ao Celinho, amigo de ambos, para perguntar se Jujuba tinha namorada, ja’ que estava interessada nele por muito tempo. Jujuba havia acabado de terminar o namoro com a Marinete, uma magricela de bunda grande, que nunca havia conseguido esquecer seu primeiro namorado, e vizinho, o Caique...
   Sem nem pensar, Jujuba disse ao Celinho que tinha namorada, porque não queria namorar ninguém com nariz grande e torto.
   Não! Ca’ entre nos, nessa Jujuba tinha razão...A menina era bonitinha, magrinha, coxinhas grossas, peitinhos iguais a laranjas lima maduras, lábios carnudos e bom de beijar mas, o nariz da moca faria qualquer bruxa morrer de inveja. O que ele nem teve tempo de saber e’ que a menina era um doce de pessoa, inteligente, culta, preparada, extremamente educada mas, aquele nariz...
   Anos depois, em um restaurante da praça Saenz Pena, na Tijuca, Jujuba viu um casal que chamava atenção de todos... O homem era como um gala de cinema Americano, ou de novela, se você se julga um nacionalista recalcitrante e, a moca, capaz de fazer a Sophia Loren parecer uma empregada domestica.
   Ainda tinha a linda mulher na mira dos olhos quando a viu se aproximando em sua direção. Por via das duvidas ainda olhou para trás, só para se certificar se era mesmo em sua direção que ela andava. Assim que olhou para frente novamente, ouviu:
 Lembra de mim? Sou a Maria Luiza, costumávamos frequentar o mesmo clube...
   Quando ouviu o nome a primeira coisa que olhou foi para o nariz. Perfeito, lindo, afilado e seu rosto era uma obra de arte... Milagres da cirurgia plastica...
-  Este e‘ meu marido, Larry. Disse ela.
   O aperto de  mão do tal do marido foi tao forte que Jujuba não sabia se ele estava de sacanagem, tentando machucar alguem que por acaso houvesse “machucado” sua esposa no passado ou, se ele era mesmo tao forte assim, sem o menor esforco.
   Se arrependimento matasse, Jujuba havia caído duro ali mesmo, com a cara dentro da vasilha de maionese do buffet `a sua frente... Ele nunca soube se Maria Luiza fez aquilo por vingança, como quem diz: “olha o que você perdeu seu babaca” ou se por educação.
   E’! O cara era mesmo sem sorte...
   Jujuba fez tanta cagada em sua vida, tomou tantas decisões erradas que acabou tomando a ultima que, segundo suas projeções proporcionais, acabaria de vez com sua existência... Arrumou as malas, sem mais nem menos, e decidiu se mudar para os Estados Unidos. A única coisa que sempre quis na vida foi namorar a Márcia, parecia ate’ uma obsessão mas, por outro lado, em sua mente, sabia que ela não era sardinha pra sua rede.
   Havia ouvido falar das oportunidades nas terras do Tio Sam, assim sendo resolveu arriscar... Sua primeira surpresa foi que as mulheres Americanas o adoravam... Era só dizer que era Brasileiro e elas despencavam das arvores... Diziam que ele era bonito, simpático, inteligentes e ate outros elogios que, no inicio nem conseguia entender, ja’ que seu Inglês não era tao bom assim.
   Mas, nosso amigo Jujuba mudou de pais mas não mudou seu comportamento. No Brasil dispensou, sem pensar, a única que se interessou por ele. Agora, no pais do Tio continuava dispensando todas elas...
   Em um momento de sua vida ate’ flertou com a possibilidade de se tornar homossexual mas, pensando melhor, achava que devia doer muito...
   Resolveu então, para acabar com conjecturas improváveis e impossíveis, pensar apenas no trabalho...
   Começou trabalhando como garçon para custear seus estudos de Inglês. Assim que dominava o idioma, arrumou um emprego nas Nações Unidas como tradutor... Continuou estudando línguas... Agora, se dedicava também ao Italiano. Depois Frances, Espanhol e, finalmente Alemão.
   Em menos de dez anos, passou de analfabeto em Inglês `a tradutor multilingue. Sua vida corria `as mil maravilhas. Depois então que conseguiu se convencer que era menos complicado viver sozinho, se considerava realizado e feliz.
   Mais alguns anos e Jujuba era o mascote das Nações Unidas. Poderia traduzir os principais idiomas, estava sempre pronto pra trabalhar, não tinha mulher pra encher o saco e, quando se sentia muito só, com vontade de descarregar “sentimentos” acumulados, tinha uma lista enorme de colegas de trabalho que estavam loucas para ouvir falar e, ate’ mesmo conhecer de perto, as qualidades e utilidades do “Pau Brasil”.
   A vida de Jujuba, que depois que se tornou cidadão Americano mudou o nome para Carl, Americano jamais conseguiria pronunciar “Carlozencio”, era perfeita... Nunca esteve tao feliz...

   Certo dia foi escalado para um projeto no qual jamais havia participado. Uma reunião do G20.
   Não estava preocupado... Nada mais do que rotina rotineira.
   No dia da primeira reunião, uma hora antes, nosso amigo ja’ estava la’. Testava os equipamentos despreocupadamente quando uma linda loira entrou em seu cubículo.
A primeira reação, ao sentir aquele perfume familiar, foi de dizer: “to de ferias...To satisfeito por duas semanas...”
-  Jujuba? Perguntou a mulher.
-  Como você sabe do meu apelido de criança. Aqui todos me conhecem como Carl.
-  Não se lembra de mim, não e’? Disse a mulher.
-  Sinceramente, não!
-  Sou a Márcia! Lembra? Da natacao?
   Desta vez, só não se cagou todo porque costumava tomar um “breakfast” muito leve, a base de banana e frutas...
   Mulher e’ uma coisa mas, a Márcia não e’, nem nunca foi uma mulher... Márcia era uma deusa. Parecia que agora, mais de trinta anos depois, ela estava ainda mais linda, mais segura, mais imponente... A Márcia parecia uma escultura em que o tempo, nosso escultor tao temido, havia conseguido  aperfeiçoar.
   Nosso amigo, abriu a boca, quase babando, sentou numa cadeira que, providencialmente, estava atrás dele, evitando que metesse a bunda no chão e, não pode segurar uma lagrima espontânea que teimava em lembra-lo do passado.
   Assim que percebeu, ela se inclinou, limpou aquela prova de carinho com seu polegar e o beijou carinhosamente no rosto...
   Foi preciso alguns segundos para que Carl se refizesse e conseguisse perguntar:
-  Como vai você? O que esta’ fazendo aqui?
-  Vim com a delegação do Brasil e alguem me descreveu o “melhor tradutor” da UN e, não sei
   porque, pensei ser você... Vim aqui confirmar...
  A conversa durou por quase uma hora e so’ foi interrompida quando a reunião começou e Carl interpretava...
  Márcia ficou a seu lado o tempo todo. Não pode deixar de notar a diferença naquele garoto tímido que conhecera quando mais jovem.
  Foram mais de três horas nas quais ela, pacientemente esperava sua chance.
   Ao termino de sua tarefa, ao saírem do edifício, Carl se ofereceu a levar Márcia a seu hotel ou onde estivesse hospedada.
- Carl, se você não se importar gostaria de ficar com você. Soube que você agora
   mora aqui em Nova Iorque, certo?
   O cara engoliu em seco... Não era possível! “A Márcia, pedindo para ir ao meu apartamento? Eu sei que não estou sonhando. Então, o que esta’ acontecendo?” Pensou.
   Só não se cagou todo porque não ficava bem...
   Andando de mãos dadas pelas ruas de Manhattan, trocavam confissões... Carl dizia que nunca havia se casado. Nem mesmo namorada tinha... Márcia soltou a bomba quando falou:
-  Jujuba, ou Carl, como preferir, você esta’ tao bonito. Tao seguro de si. Nem de perto
   me lembra aquele menino tímido que conheci...
   Sabe que depois daquele baile em que dançamos a noite inteira nunca mais quis
   namorar ninguém? No clube, alguns dos rapazes queriam me namorar para tirar 
   onda. Na PUC, quando la’ estudava, todo mundo queria dormir comigo porque diziam
   que eu era gostosa...
   De vez em quando dava uma trepadinha inconsequente, so’ pra não perder a forma
   mas nunca mais queria ver o cara...
   O único homem que eu gostei foi você. Você sempre me respeitou... Era muito tímido
   pro meu gosto mas isso era o teu charme...  Você era diferente de todos...Todo  
   mundo queria se fazer de bonito pro meu lado. Você era autentico e, nunca dancei
   com ninguém que dançasse tao bem...
   Estou muito feliz por poder te ver novamente...
-  Posso te fazer uma pergunta? Indagou Márcia.
-  Claro! Disse ele.
-  Porque você deixou escapar uma lagrima quando me viu?
   Pronto! Agora o cara se derreteu... Começou a chorar de verdade.
   Márcia o abracou, segurando a cabeça do amigo e a descansando sobre seu ombro. Com uma das mãos ele tentava enxugar as lagrimas que insistiam verter. Com a outra mão segurou a cintura da amiga, com a mesma determinação que fizera anos antes, na única vez em que dançaram a noite.
-  Márcia, a alegria de te ver foi o maior presente que jamais recebi em minha vida. Disse ele, ainda
   tentando se controlar. Você tem certeza que quer ficar em meu apartamento hoje? Finalizou...
-  Hoje, amanha... Pelo tempo que eu estiver aqui, se você quiser. Disse Márcia.
-  Tem certeza? Perguntou Carl.
-  Absoluta!
-  Muito bem! Então amanha, quero que você comunique `a tua delegação que esta’
   saindo do emprego... Nos casamos e você fica aqui comigo... Se quiser te arrumo
   um emprego na UN...
-  Aceito! Disse Márcia, sem nem pensar nas consequências...

   Jujuba, quer dizer, Carl não podia estar mais feliz... Foram necessários mais de quarenta anos para que pudesse fazer as pazes com sua adolescência e, justamente quando Márcia começava a ser apenas uma doce, inesquecível e mais marcante recordação de sua juventude, ela aparece e, como um furacão que chega sem aviso,  começa a jogar para cima as memorias do chão de suas lembranças

   Depois de trocarem o primeiro beijo sob os primeiros flocos de neve que começavam a cair, nas ruas desertas de Manhattan, de mãos dadas, saíram os dois correndo ao encontro do futuro que acabava de começar.
   E’! O cara teve em sua vida a única sorte que realmente importava...




Copyright 2013 Eugenio Colin
  

  

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

MITOS






                    
                                                                        Mitos









   Mitos são representações falsas e simplistas, geralmente admitidas por membros de uma sociedade, algo que e’ recordado, representado ou afirmado de forma irrealista.
   Plantas carnívoras comem gente, tomar sorvete no inverno da’ dor de garganta, manga com leite faz mal, elefantes tem medo de rato, goma de mascar gruda no estomago, cães sentem cheiro de medo, gatos sempre caem de pe’, um raio nunca cai duas vezes no mesmo lugar, se cruzar os olhos e bater um vento você fica vesgo...
   Estes são alguns das centenas de mitos que ouvimos ao longo de nossa vida. Mas, nenhum deles porem chegam perto de fazer parte da realidade...

   Este pensamento me lembrou a historia de Clarimunda e Dorivaldo...
   Clarimunda era uma das mulheres mais lindas de cidade onde residia. E olha que estamos falando de uma cidade com mais de cinco milhões de habitantes... Alta, morena, cabelos negros e longos, olhos amendoados, feições clássicas e delicadas, esguia, sempre bem maquiada, dedos longos, unhas sempre feitas... Verdadeiramente uma modelo de capa de revista mas, não conseguia arrumar um namorado. Se saísse com alguem para ir a uma festa ou a um bar, era como se fosse o beijo da morte. Nunca mais veria o homem... Amigas, não tinha, ninguém conseguia ficar a seu lado por muito tempo. Sua mãe era a única pessoa na face da terra que havia aprendido a conviver com ela.
   Trabalhava por conta própria, em seu carro, fazendo entregas domiciliares, a única ocupação que conseguira manter, assim mesmo porque estava sempre sozinha e o contato com seus colegas e gerentes era minimo. Antes deste, de todos os empregos por onde passara havia sido dispensada.
   Ninguém entendia o motivo daquela discriminação tao cruel. Uma mulher tao bonita...
   E, Clarimunda ja’ estava começando a ficar preocupada... Mais de quarenta anos, sem namorado e, ainda virgem. Não que aparentasse sua verdadeira idade mas, o fato e’ que o tempo passava e nada...
   Um dia, em uma entrega, num bairro nobre da cidade, ao tocar a campainha, foi atendida por um homem muito forte, muito bonito, parecia um ator de cinema... Efetuou a entrega, recebeu sua assinatura e se foi, deixando com ele um belo sorriso que foi retribuído amavelmente, acompanhado por uma voz grave, máscula que mais parecia com a daqueles locutores que anunciam trailer de superproduções holliwoodianas, ao dizer: “obrigado querida!”
   A moca tremeu nas bases, seus joelhos balançavam a ponto de bater um no outro e foi com grande sacrifício que conseguiu deixar o local.
   O dia foi consumido por pensamentos envolvendo aquele homem lindo que havia encontrado, alguns ate’ dignos de filmes pornocênicos da mais baixa qualidade.
   A noite foi terrível. Não conseguia dormir... Sera’ que ele e’ casado? Tem namorada? Ja’ pensou o tamanho do pinto daquele cara?...
   No dia seguinte, não resistiu! Voltou a casa do homem sem mesmo saber o que fazer, ou dizer, como se aproximar...
   Tocou a campainha da porta e, desta vez uma senhora atendeu. Clarimunda gelou... Não podia ser sua esposa, tinha muita idade para isso, a menos que fosse a dona da grana, estava muito bem vestida para ser a governanta ou empregada... Ainda estava estática, chocada, sem saber o que dizer quando ouviu aquela mesma voz maravilhosa que encantara seus ouvidos no dia anterior dizer:
-  Quem e’, mamãe?
   Pronto! Parte do problema esclarecido. Agora, tinha que pensar rápido, antes do homem chegar, para saber o que dizer...
   Assim que ele chegou e abriu um pouco mais a porta ouviu:
-  Como vai?
-  Bom dia! Vim aqui para confirmar que a mercadoria chegou sem avarias. Nosso  
   serviço e’ personalizado e sempre gostamos de saber a opinião de nossos clientes. Mentiu,
   descaradamente, Clarimunda.
-  Vamos entrar! Por favor... Convidou o homem.
-  Muito prazer! Meu nome e’ Dorivaldo. Disse o homem, so’ agora reparando que
   aquela moca era realmente digna de maiores atenções, fato que não havia percebido
   no dia anterior.
   Dona Dorivalda, a senhora que atendeu `a porta, mãe de Dorivaldo pode entender que os dois estavam interessados um no outro e, assim sendo, resolveu sair de fininho antes que começassem a se agarrar e, quem sabe, fazer coisa pior ali mesmo em sua frente.
   Dorivaldo não tirava os olhos da bunda da mulher que, por sua vez também dirigia olhares tentadores e pecaminosos  ao local onde presumia estar aquele pinto tentador.
   Porem, um fato inexplicável chamava a atenção dele. A mulher não parava de se mexer, de um lado para o outro, pra cima e pra baixo, com se estivesse sentindo coceira e não quisesse se cocar.
   A dado momento perguntou:
-  Você esta’ bem?
-  Tudo bem! Acho que e’ a emoção... Respondeu.
-  Fica ai que te trago um pouco de agua com açúcar para te acalmar...
   Assim que o homem se afastou, Clarimunda soltou o maior peido que jamais havia acontecido naquela sala...
   Dorivaldo assustado com o barulho disse para sua mãe que, felizmente para ela, estava em seu quarto:
 -  Mamãe não fica arrastando moveis sozinha. Me chama que eu te ajudo...
 -  Se for arrastar moveis te chamo! Estou lendo... Gritou Dona Dorivalda.
 -  Você ouviu um estrondo? Perguntou Dorivaldo se dirigindo a Clarimunda ao mesmo
    tempo que lhe oferecia um copo d’agua.
-  Não! Respondeu ela com a cara mais lavada, sabendo muito bem que sofria de
   flatulência aerofágica e peidava mais do que uma cabrita.
   Clarimunda era consciente, ou pelo menos suspeitava, que esta era a causa pela qual não conseguia um relacionamento amoroso estável. Lembrava-se das vezes em que não pode segurar e passou pelos maiores vexames que alguem poderia passar mas, e agora? Não queria perder a chance e deixar escapar de suas garras de virgem faminta aquele homem maravilhoso. Pelo menos por alguns minutos estava aliviada.
   Tinha plena ciência que este era um problema praticamente sem solução. Ja’ havia tentando tudo. Médicos, curandeiros promessas, remédios caseiros e, nada!
   Uma vez ate’ havia tentado introduzir uma rolha de champanhe em seu anus antes de dormir. Naquela época, ha’ algum tempo estava com medo de não acordar no dia seguinte, asfixiada pelos gazes que `a noite, inconscientemente, deixava escapar. Naquele dia não tardou muito para que assustada, fosse despertada pela explosão que ouviu. Ainda sonolenta, a primeira impressão foi que uma bala perdida houvesse entrado em seu quarto. Depois, recuperando o pleno raciocínio, ajudada pelo insuportável cheiro de enxofre, abrindo mais os olhos, pode reparar um furo no teto, bem acima de sua cama... O difícil foi explicar aos policiais da PM que em sua casa chegaram, chamados pelos vizinhos, o que causara aquele estampido.

   Na casa de seu novo conhecido, depois de tomar um pouco d’agua e se sentir mais aliviada, conversaram tanto que ela nem voltou ao trabalho. Descobriu que seu interesse amoroso era um Industrial milionário, dono de uma fabrica de aeronaves para executivos. Era solteiro, nunca havia se casado, viajava para a Europa duas vezes por ano, era simples e frugal, apesar de todo dinheiro que tinha. Era presidente de três instituições de caridade. Todo ano, no dia de Natal, ao invés de esbanjar consigo próprio, gastava uma fortuna e passava o dia inteiro organizando e servindo um banquete para pessoas carentes na igreja em que sistematicamente frequentava. Alem disso era bonito pra cacete e devia ter um pinto enorme. Como poderia deixar este cara escapar?
   Dorivaldo, por sua vez também gostou do jeito de Clarimunda.
   O romance decolou sem maiores problemas. Ambos estavam felizes. Clarimunda ate’ descobriu uma maneira de não peidar; antes de encontrar com seu “amor” não comia nada, assim sendo não tinha nada em seu estomago para fermentar.
   As poucas vezes que saíram para jantar fora, pedia sempre salada e comia que nem um passarinho, tentando assim controlar reações químicas inevitáveis que poderiam resultar em catástrofe.

   Mais uns poucos dias e os “pombinhos” não conseguiam se controlar. Ele estava louco para comer; ela, louca para dar...
   Combinaram então ir a um motel para extravasar toda aquela ansiedade.
   Mal fecharam a porta do apartamento e começaram a ser despir avidamente... A noite de amor seguia melhor do que antecipado por ambos... Certamente estavam felizes... Clarimunda começava a ficar mais confiante. Mais de duas horas naquele esfrega-esfrega e nenhum peido... Ate’ que, sem querer Dorivaldo apoiou seu cotovelo sobre a barriga da moca, quando tentou se esticar para alcançar o telefone, do outro lado da cama, com a intenção de pedir algo para comerem.
   A principio, ela sentira apenas a pressão que o braco de seu companheiro havia feito. Segundos depois porem, o inevitável acontecia... Clarimunda começou a se espremer, morder os lábios com forca, juntar as pernas, enfiar a ponta do lençol na bunda, fingindo estar se limpando, sem nenhum resultado. A cada segundo a pressão era mais forte. fazia de tudo para se conter e não desapontar seu “amor”. Tudo em vão!
   De repente, como uma panela de pressão pronta para explodir, aquele estrondo...
   Foi um senhor peido! O deslocamento do ar contido naquele quarto fechado fez a cama estremecer e alguns quadros de decoração nas paredes cair.
   Dorivaldo olhou para um lado, depois para o outro, procurando por algo que nem ele sabia o que. E’ claro que não encontrou nada. Mais uns segundos e um cheiro insuportavel invadia o ambiente. Clarimunda estava mais vermelha que um camarão depois de frito. Não sabia onde enfiar tanta vergonha. Dorivaldo, por sua vez, não entendia nada.
   Os gazes eram tao fortes que Clarimunda poder ver, para sua consternação, lagrimas verterem dos olhos de seu amor. Quanto mais ele tentava limpar os olhos, mais os irritava... Ela se desculpou, tentou explicar, tentou disfarçar, pensou em botar a culpa em outro peidorreiro mas, pensando bem, so’ os dois estavam ali... Pegou uma tolha no banheiro... Nada! Nada era capaz de amenizar tanto sofrimento... Dorivaldo não parava de chorar... Era como se tivesse sido atingido por uma daquelas bombas de gaz lacrimogêneo. Foi preciso mais de duas horas de um trabalho de recuperação intensa para que os “pombinhos” conseguissem deixar o ninho.

   A historia de Clarimunda e Dorivaldo serve muito bem para descredibilizar dois mitos muito comuns...
   Homem não chora...
   Mulher não peida...
  







   Copyright 2013 Eugenio Colin
  

sábado, 9 de novembro de 2013

RAPIDEZ





                                                              Rapidez




                                                         
   Professora Orineivalda tinha sob seu comando a classe mais adiantada da escola.
   Val, como carinhosamente conhecida, era admirada por todos, principalmente pela maneira lúdica e inovadora com que ministrava suas aulas. Seus alunos eram notados e invejados por todos os outros... Alem dos conhecimentos curriculares, inerentes `a classe, eles eram também perspicazes, diligentes e muito atentos.
   Poderia se dizer que as aulas da professora Val nada mais eram do que brincadeiras constantes que envolviam Matemática, Português, Sociologia, Ciências e tudo mais.
   Ninguém chegava atrasado `a uma aula da professora e, na hora da saída parecia que não queriam ir embora. A grande maioria ficava em volta de sua mesa, como que pedindo por mais uma brincadeira, adivinhação, jogo ou outra coisa qualquer que os mantivesse divertido por mais alguns minutos.
   Meninos e meninas ja’ sabiam, a cada aula uma novidade...

   Naquela manha, Val se dirigiu `a turma e disse:
 - Hoje vamos falar sobre rapidez...
   Todos riram. Não sabiam de que mas sabiam que iam se divertir...
   A professora pergunta `a Mariazinha, uma de suas alunas preferidas;
 - Mariazinha o que e’ a coisa mais rápida que você conhece?
 - A luz professora! Respondeu a menina.
 - Muito bem! Disse a professora.
 - Agora você Nelsinho; me diz o que e’ mais rápido do que a luz...
 - O pensamento professora. Respondeu ele.
 - Muito bem! Repetiu professora Val.
 - E você Joãozinho? Me diz o que e’ mais rápido do que o pensamento e a luz.
 - Dor de Barriga Professora. Respondeu Joãozinho.
 - O que? De onde você tirou essa resposta?
 - Eu deduzi agora professora...
 - Como assim? Indagou Orineivalda.
 - Eu me lembrei que outro dia, eu fui ao banheiro e, quando pensei em ligar a luz ja’ tava todo
   cagado!







   Copyright 2013 Eugenio Colin.






sábado, 2 de novembro de 2013

MUJINHA & BONITÃO






                                                        Mujinha & Bonitão






   Depois do episodio ocorrido em um super mercado de Belo Horizonte, quando um de seus colegas de trabalho a pedira em casamento em frente de todos que `aquele momento ali estavam, Mujinha havia decidido se recluir, principalmente em relação   `a sua vida amorosa. Foi com muita dor no coração   que fez seu pretendente sofrer mas, ja’ com mais de sessenta anos de idade, tinha sido casada três vezes, por isso não queria saber de mais confusão em sua vida e, diga-se a verdade, todo relacionamento amoroso e' sempre uma puta confusão... Trazia também em sua bagagem três títulos, para ela muito importantes... Miss Bahia, quando tinha apenas dezenove anos de idade, Miss Java ( Juventude Avançada de Salvador ) e  Miss Puta ( Participação Unitária Trabalhista Americana ), entidades das quais na época fazia parte. Parecia que sua sina era de arrebentar corações masculinos, despreparados para aguentar as vibrações que olhos enamorados lhe mandavam em impulsos cheios de eletricidade amorosa.
   `Aquela altura de sua vida o que mais queria era dar uma folga `a sua querida “perseguida” companheira de muitas orgias indecentes inconsequentes.
   Mujinha estava tão decidida `a uma vida reclusa que de Belo Horizonte nem voltou para sua cidade natal. Resolveu parar em Teresina, Piauí. Não queria mais saber de trabalhar em super mercado. Resolveu então, so’ para melhorar um pouco sua renda de aposentada, trabalhar em uma agencia de viagem pela qual havia passado em seu primeiro dia de reconhecimento pelas ruas da cidade e leu em uma placa; “Precisa-se de ajuda”. Não queria atender a clientes... Na maioria dos casos, eles começam pedindo descontos, depois prazos para pagar e, conversa vai conversa vem acabariam olhando para os olhos verdes da mulata e, pimba! Poderiam se apaixonar e, novamente, “pobrema”! Felizmente, para sua alegria, o cargo era de caixa. No principio ficou meia escarmentada mas, pensando melhor, depois de ver o local onde iria trabalhar, constatou que se tratava de um cubículo pelo qual, do exterior, suas coxas estariam fora do alcance visual, seu rosto parcamente aparecia e, se cobrisse os peitos, talvez estivesse fora do alvitre de olhos cobiçosos.

   O tempo passava e, aos poucos, ela acreditava que havia feito a escolha certa. Primeiro, todos os homens que ate’ então havia visto na agencia, em sua opinião, eram feios pra cacete. Ate’ hoje, depois de mais de um ano de trabalho, nunca tinha encontrado com Brad Pit, Tom Cruise, qualquer outro ator do cinema Americano ou, pelo menos alguem que pudesse assemelhar-los. Nem um simples “pagodeiro” conhecido havia la’ solicitado por serviços. E’! Teresina era o lugar adequado para ela...
   Sua vida, rotineira e desesperadora para qualquer mulher, era apropriada para ela. Morando perto de trabalho, agora, coisa que nunca havia feito antes, acompanhava a novela das sete, das oito, o jornal depois da novela e o filme depois do jornal. O problema era so’ nos finais de semana. Não tinha novela e os programas exibidos na TV eram de endoidecer qualquer mortal.
   Numa Sexta-feira porem, procurando abrigo, fugindo de um temporal torrencial, coisa rara naquela região do pais, entra na loja um homem, mais molhado do que roupa dentro da maquina de lavar, pedindo licença para ensopar o chão imaculado daquele estabelecimento.
   Tentando evitar que algum cliente de verdade pudesse cair, machucar a bunda ou coisa pior e, em consequência acionar a loja, Brabinha, a gerente da loja, gentilmente pediu a Mujinha que pegasse uma toalha e enxugasse a loja. Mujinha, com cara de poucos amigos, aquiesceu.
   Assim que chegou perto do estranho e olhou para ele, imediatamente sentiu um frio na barriga. Que homem lindo! Pensou... O homem por sua vez, quando deixou escapar uma olhada nos peitos e nas coxas da baiana piauiense, não pose se conter e, com todo seu charme e educação   falou:
-  Pode limpar sem medo, não e’ mijo, so’ agua.
   Mujinha não sabia como resistir a tanta “sutileza”...
-  Como e’ seu nome? Indagou ela.
-  Pode me chamar de Bonitão. Respondeu o homem.
   Não tardou para que Mujinha oferecesse uma outra toalha para que seu interesse se enxugasse.
   Apesar das olhares reprobatórios da gerente, Mujinha nem ligou. Sentou ao lado de Bonitão e continuou a conversa, a esta altura quase apaixonada por aquele homem lindo. Conversa vai, conversa vem, acabou convidando o homem para dormir em sua casa, quando soube que ele não havia reservado hotel e estaria de partida no dia seguinte. Pelo que conversaram, pode saber que Bonitão era de São Paulo mas, atualmente morava com a filha em uma cidade pequena no interior do Brasil. Descobriu também que havia sido casado e pensava que ainda era apaixonado pela ex-esposa. Soube que era vendedor e trabalhava para uma multinacional viajando pelo Brasil vendendo adubo e, como todo bom profissional que se dedica `a sua ocupação  , e pensa em seu trabalho, vivia na merda e, so’ tinha merda na cabeça. Mas isso seria problema para daqui a pouco, agora, seu único pensamento era não deixar escapar de sua vida o homem mais bonito que jamais havia visto.

   Na manha seguinte `a noite que passou com a admiradora, Bonitão estava animado. Telefonou para a filha contando a novidade. A menina recebeu a noticia com ceticismo e reprovação  . Imediatamente começou a se referir `a sua, quem sabe, futura madrasta como “a bruxa”. Bonitão estava entre a cruz e a espada ou, se pudermos adaptar o ditado `a profissão que ele exercia, entre a prisão de ventre e o leite de magnésia. Não queria contrariar a filha, uma menina inconsequente que não queria saber de nada na vida a não ser comer, dormir e gastar o dinheiro de seu pai, razão principal pela qual não queria repartir a "fortuna" que Bonitão fazia com a merda. Mas também queria dar uma chance `a sua felicidade. Alem disso, Mujinha, apesar de sexagenária não era de se jogar fora, pelo contrario, quem os visse juntos diria que Bonitão era, pelo menos, dez anos mais velho do que ela.
   Ele estava decidido! Queria que sua “namorada” visitasse sua cidade, conhecesse sua filha, soubesse onde moravam... Afinal de contas, se combinassem, talvez pudessem viver "felizes para sempre".
   A reação   da filha em relação `a namorada foi de ódio `a primeira vista. Na Sexta-feira em que seu pai pediu para que ela fosse buscar Mujinha na rodoviária da cidade, a menina respondeu; “porque ela não vem voando em sua própria vassoura?”
   E’! Bonitão estava numa situação   difícil... Mas, estava decidido e tentar uma aproximação   entre as duas.
   Domingo, dois dias depois, Mujinha se ofereceu a preparar o almoço.
   A menina estava quase resignada com sua sina, ate’ a hora em que sentou `a mesa e sua futura madrasta se ofereceu a servi-la. Assim que abriu a tijela belíssima colocada ao centro da mesa, enfeitada com castiçais e tudo, falou:
-  Você gosta de panelada?
-  O que e’ panelada? Indagou a menina.
-  Tripa, pata e bucho de boi, bichinha. Respondeu a “madrasta” com seu sotaque
   nordestino.
   A menina, apresentou ânsia de vômitos, levantou da mesa correndo, jogou algumas bugigangas na bolsa e saiu do apartamento `as pressas, jurando a si mesma uma vingança inexorável. Comer tripa tudo bem... Tem gente ate' que gosta mas, ser chamada de bichinha era algo inadmissível em sua cabeça oca de quem não conhece o palavreado do nordeste.
   Enquanto caminhava em direção  `a casa de uma amiga, provavelmente também com a intenção   de filar uma bóia, ja’ que seus planos de almoço se viram frustrados pela “bruxa”... E logo no dia em que estava disposta a dar um credito de confiança `a sabedoria de seu pai que, ate então só havia feito cagada em sua vida...
   Agora era pensar uma maneira de se vingar daquela intrusa em potencial que, ate’ agora, o único erro era de ter se interessado por um idiota que tinha uma filha imatura e inconsequente.
   Andava irritada, `a passos largos, em direção   a casa de sua amiga Celinha, que morava apenas algumas quadras distantes, quando pisou em um pedaço de barbante, daqueles que eram usado para amarar pão embrulhado em padaria... “Eureka!” Pensou... A ideia veio imediatamente... “Diabólica!” Sorriu ao terminar de planejar o plano.
   Ao chegar em casa, tarde da noite, Mujinha e Bonitão ja’ dormiam...
   Foi ao sofa’ da sala, levantou uma das almofadas e colocou uma daquelas bolas de plastico que quando apertadas emitem um som de peido...
   Naquela mesma noite, por baixo da porta do quarto onde os “pombinhos” dormiam, acendeu um daqueles barbantinhos que cheiram como enxofre. Com as “antenas” ligadas ainda pode ouvir Bonitão dizendo:
-  Mujinha! Acorda! Acho que você deveria ir ao banheiro...
-  Que tu ta dizendo bichinho? Respondeu, sonolenta.
-  To dizendo que tu ta’ peidando mais do que uma cabrita com caganeira... Respondeu
   Bonitão.
   Agora sim! Poderia dormir em paz... O inicio da vingança havia sido plantada...

  Na manha seguinte, ao acordar, sua primeira providência foi acender um outro barbantinho e colocar dentro de um vaso vazio, que nunca havia visto uma flor para enfeita-lo.
   Imediatamente, assim que sentiu o cheiro, Bonitão Exclamou:
-  Mujinha! Que esta’ acontecendo? Não da’ pra aguentar!
   A menina, mesmo com a boca cheia de pasta de dente, sorria satisfeita...
-  Bom dia! Disse ela assim que adentrou a sala.
-  Bom Dia minha filha! Respondeu Bonitão...
   Mujinha não falou nada... Sabia que não estava peidando, so’ não sabia o que estava acontecendo... Talvez não tivesse tido infância, talvez nunca houvesse se vingado de namoradas de pai, talvez não fosse tão ma’... O fato e’ que, tinha certeza que não havia peidado nem uma vez, apesar de ter comido o que comeu no dia anterior...
   Assim que saiu da cozinha em direcao `a sala, para ficar bem longe da menina, da qual `aquela altura ja’ desconfiava, sentou-se exatamente em cima da almofada que escondia a bolinha de imitar peido...
   Ao ouviu o som característico, Bonitão falou:
-  Mujinha! O que ha’ com você? Me diz agora que não peidou...
   A menina apenas sorriu, desta vez, propositadamente alto para ser ouvida...
   A cada vez que a "bruxa" se ajeitava no sofa’, um novo peido...
   Desta vez, mesmo tomando cafe’ a menina, sorrateiramente, acendeu outro barbantinho e colocou dentro do mesmo vaso. Agora era som e cheiro, dando uma credibilidade maior ao plano diabólico tao bem executado.
-  Mujinha! Não ta’ dando p’ra te aguentar... Vai ao banheiro e caga logo! Exclamou Bonitão.
   Ao passo em que os dois se desentendiam, a menina sorria de satisfação.
   Finalmente, depois de tantas acusações, a moça acusada, resolveu fazer as malas e voltar para Teresina onde, quem sabe, poderia começar nova procura...
   Bonitão ainda tentou ponderar que talvez uma rolha de Champagne poderia resolver o problema, pelo menos temporariamente, mas Mujinha estava muito injuriada. Sabia que não tinha o habito de peidar e, a esta altura, sabia que a filha do Bonitão não queria ninguem entre eles.

 - Eu ate’ que gostava dela mas ela peida muito minha filha! Não da’ para aguentar... Exclamou
   Bonitão, de certa maneira entristecido, acariciando sua filha que, assim que Mujinha saiu, enquanto
   seu pai corria atrás dela, sem saber o que fazer, tratou de jogar pela janela os barbantinhos e o
   imitador de peido, antes que seu pai descobrisse o que realmente havia acontecido e, como ja’ havia
   feito outras vezes, a cobrisse de porrada.
- Eu ate’ que gostava dela mas ela peida muito, minha filha! Não da’ para aguentar...
  De certa maneira, acho que sempre soube que jamais seriamos Mujinha e Bonitao.







  
   Copyright 2013 Eugene Colin

domingo, 27 de outubro de 2013

PROPAGANDA...








                                                               Propaganda...





   Márcia Melada era professora há mais de 20 anos. Seu currículo era exemplar... Nunca havia faltado um único dia, nunca havia transgredido nenhuma norma da escola, era admirada por professores e alunos...
   O ano letivo estava apenas se iniciando e Professora Márcia, pela primeira vez pegava uma turma de décima serie... Meninas e meninos eram adolescentes, na puberdade, gostavam de namorar, trocavam bilhetinhos durante as aulas, mas nada que sua experiência e praticidade não conseguissem controlar.
   Havia porem um aluno que se destacava do grupo por estar sempre quieto, compenetrado, cabisbaixo... Um dia, ao final de uma aula a professora o chamou e pediu que ficasse mais um pouco.
   Depois que todos deixaram a sala ela perguntou seu nome. Antônio Dotado, respondeu o rapaz...
   Indagou se algo o aborrecia ou se estava enfrentando algum problema. Ele disse que não... Era assim mesmo, tímido, introspectivo...
   Depois daquele encontro, Antônio passou a fixar seus olhares nos dotes físicos da professora, que ate então haviam lhes passado despercebido, principalmente seus enormes seios que quase a impediam de escrever ao quadro-negro.
   Dois meses depois Antônio ja' estava desesperado, não sabia o que fazer para atrair a atenção  da professora. Então, teve uma ideia genial...
   Um dia, ao entrar na sala de aula, Márcia vê, horrorizada, a inscrição  no quadro negro: "Antônio tem Pau Grande!" Com ponto de exclamação  e tudo, talvez para enfatizar o fato.
   Imediatamente ela apaga a inscrição. e, sem nenhum comentário da inicio `a sua aula.
   No dia seguinte, ao entrar na sala, a mesma coisa, agora com letras maiores: "Antônio tem Pau Grande!" Pela segunda vez ela apaga os dizeres, sem fazer nenhum comentário.
   Por uma semana, a historia se repete...
   Agora, sem saber o que fazer e tentando matar três coelhos com uma só cajadada, professora Melada decide colocar `a prova a veracidade da inscricao...
   Quando a campainha toca, no final da aula, Márcia pede a Antônio que fique na sala...
   Tranca a porta, pega o rapaz pelo braço e o leva para um canto que não poderia ser visto pela janelinha da porta da sala. Ali eta tira a roupa, pede que ele faca o mesmo e, violenta o aluno.
   Agora, pensava ela enquanto se aproveitava do apetite voraz daquele quase menino, se livraria dos dizeres, ja' estava pondo `a prova a veracidade da mensagem e, talvez conseguisse manter sua calcinha um pouco menos molhada.
   Duas horas depois, ambos deixaram a sala de aula com a sensação de terem conseguido suas metas...
   No dia seguinte, ao entrar na sala, ela lê no quadro: " A Propaganda e' a alma do negocio!"








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terça-feira, 22 de outubro de 2013

INTROSPECÇÃO MATINAL






                                                         Introspecção Matinal








   Hoje pela manha, apos o desjejum, ainda sentado `a cafeteria do hotel, me chamou a atenção uma linda jovem morena, com longos cabelos avermelhados, olhos verdes, provavelmente aos seus trinta anos de idade, salto alto, pernas cruzadas, muito bem vestida, impecavelmente maquiada para aquela hora da manha, ainda saboreando os últimos goles de seu cappuccino. O dedo minimo da mão direita que segurava a chicara estava arqueado, como “manda” a etiqueta daquelas dondocas sofisticadas que a maioria de nós, pobres mortais, copiamos.
   Sem que percebesse, aquela mulher dominava toda a minha atenção. Observava seus mínimos detalhes e gestos, como se estivesse tentando aprender algo.
   Segundos apos o ultimo gole, pousou a chicara delicadamente, olhou para um lado, limpou o canto da boca com um guardanapo que mantinha no colo, olhou para o outro lado, pousou o guardanapo `a mesa e, delicadamente, introduziu o mesmo dedo que ha’ pouco tempo se mantinha arqueado, dentro do nariz.
   Se minha atenção ja’ era total, agora era imperativa.
   A mulher estava completamente absorta em seu trabalho de limpeza. Mexeu com o dedo de um lado para o outro e, voila’! Uma enorme meleca saiu presa `a seu dedo, com uma parte dentro de sua bem manicurada unha.
   A esta altura, sem perceber que captava minha total atenção, com as costas da unha do mesmo dedo minimo da outra mão, removia a parte da meleca que se escondia sobre a outra unha e, com um movimento automático e magistral, conseguiu transportar toda a “materia” nasal para a ponta do dedo indicador.
   Agora, completamente concentrada, movia o dedo indicador sobre o polegar, em movimentos circulares, sem perder o contato com a matéria desforme que, `a esta altura começava a se esferizar. Mantinha a mão que “trabalhava” em baixo do guardanapo que formava um pequeno arco por sobre a mesa. Vez por outra recuava um pouco a mão para averiguar se seu objetivo estava sendo conseguido. Mais alguns segundos e, expôs a mão que mantinha coberta ao alcance de seus olhos.  
   Certificando-se de que a consistencia estava adequada, levantou a toalha da e colou a meleca na parte inferior da mesa.
    Abriu a bolsa, abriu o batom que agora segurava, retocou os lábios e, levantou-se ao encontro de seu destino.
   Naquele momento pensei; se algum dia voltasse `aquele hotel, `aquele cafe’ e me sentasse a uma mesa e quando, disfarçadamente, ao tentar de me livrar da minha própria meleca, encontrasse outra, no mesmo local, tentando se grudar `a minha, seria isso considerado muita sorte ou, muito azar...
   Aquela cena matinal me fez refletir...
   Talvez outra pessoa que presenciasse aquele fato ficasse totalmente horripilado...  Sera’ que meleca esta’ sempre associada a narizes grandes e feios?
   Porque tanto preconceito? O que aquela mulher havia feito nada mais era do que um ato de higiene nazal. O que seria mais apropriado? Soar o nariz e, com o alarde, despertar a atencao de todos os que ali tomavam sua refeição ou, sorrateiramente, como havia feito, praticar sua higiene de maneira sutil e recatada.
   Todos sabemos que nosso nariz e’ a melhor e mais perfeita “maquina” de produzir meleca... Um nariz afilado, bem maquiado, acostumado aos mais sofisticados perfumes  franceses, como aparentava ser aquele ao qual tao absortamente acabara de observar ou o nariz do torneiro que respira po’ de aço o dia inteiro, todos devem ser limpos de alguma maneira.
   E’ claro que rhinotillexomania não deve ser desculpada, tudo tem o seu limite mas, tirar uma melequinha de vez em quando não mata ninguém. Alem do mais e’ fato comprovado que cada uma entre quatro pessoas admitiram que tiram meleca pelo menos uma vez ao dia.
   Ponderando um pouco mais, a respeito do acontecimento, pude entender que dedo com unha grande e’ bem mais adequado para uma boa limpeza nazal. Um dedo com unha muito curta torna praticamente impossível um bom desempenho. Também, pude lembrar que não e’ adequado enfiar qualquer dedo no nariz. O dedo mais apropriado para uma boa higiene nazal e’ o dedo minimo mas, não importa o dedo usado, se lavarmos bem as mãos apos o inestimável prazer de tirar uma meleca solida e consistente, resolveremos o problema da eventual infecção sem nos privarmos do prazer maior, da conquista de uma boa meleca.
   Agora! Se você achou que deveria ter guardado esta experiência para mim, que isto foi um assunto repugnante e inapropriado, examine a própria consciência, seja honesto e diga para si mesmo se nunca, em sua vida, meteu o dedo no nariz `a procura daquela meleca especial que lhe proporcionaria relaxamento e incomparável satisfação....




Copyright 2013 Eugenio Colin

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

NO MUNDO DA LUA






                       


                                                           NO MUNDO DA LUA











    Agora era oficial, a AEB, Agencia Espacial Brasileira finalmente havia decidido aprovar o projeto de Viagens espaciais tripuladas.
   Apos a saída da NASA, National Aeronautics and Space Administration, desta atividade, criou-se um vácuo no continente por este tipo de exploração. Os Americanos agora dependiam da Rússia para concluir os projetos desta agencia, ainda em andamento. Se tudo acontecesse conforme planejado, quem sabe, no futuro, poderíamos nós dar carona aos Americanos.
   Na tentativa de criar um projeto mais inclusivo e global, a AEB decidira criar uma sub-agencia encarregada por estes novos empreendimentos. As siglas desta nova sub divisão deveriam ser postadas em Inglês, tornando assim a agencia mais competitiva e inclusiva. Com este raciocínio, foi fundada a Brazilian Utmost National Development Administration, carinhosamente apelidada de BUNDA.
   Agora seriam necessários criar uma espaçonave, recrutar e treinar astronautas. O governo Norte Americano imediatamente se manisfestou interessado em colaborar com o projeto. Uma inicial injeção de capital tornaria tudo mais fácil.
   Ficou resolvido pelos administradores da BUNDA que o primeira nave espacial Brasileira teria concepção e projetos nacionais, embora aceitasse ajuda e participações de parceiros em potencial para este projeto arrojado e inovador.
   E’ claro que na atual conjuntura mundial, uma ideia como esta deveria ser primordialmente frugal e reciclável, de certa maneira baseado nas espaçonaves Americanas como a Endeavour, por exemplo...
  
   Apos toda a burocracia inerente a um estudo desta magnitude devidamente finalizada, começaram então as decisões inerentes ao tipo de espaçonave a ser desenhada. Analisando as aeronaves Atlantis, Discovery e Endeavour, nossos técnicos chegaram `a conclusão que, um desenho mais moderno e arrojado facilitariam a construção e desempenho.
    Ficou resolvido que a espaçonave seria individual. Apenas um Astronauta que fosse capaz de executar todas as tarefas da viagem por si so’, embora o espaço interno deveria ser confortável bastante para ate’ três tripulantes. Decidiram também que as asas deveriam ser bem menores do que os das espaconaves pela qual eram inspirados, os propulsores, mais arrendondados e o nariz um pouco menos pontudo e com uma fenda bem no centro com a finalidade de, segundo os técnicos, facilitar a entrada na atmosfera terrestre ao seu retorno.
   Assim que o protótipo foi finalizado, e suas fotos divulgadas, apos uma analise critica e bem humorada, como e’ característica dos Brasileiros, nossa Aeronave foi apelidada de “Pirocao”.
   Estava lançado o programa espacial Brasileiro onde a BUNDA seria responsável pelas atividades do “Pirocao”.
   Agora, os aspirantes a astronautas seriam primeiramente treinados na FAB, onde tomariam conhecimento dos princípios básicos da aviação. Depois, seriam transferidos para uma escola de especialização.
    Se o critério da escolha fosse o nome dos candidatos, Jacinto Dores, Pinto Brochado, Cármem Violada, Tagarela Calado, jamais seriam aceitos.
    Mas, antes de exclui-los seria necessário atrai-los... O diretor do programa pensou em lançar slogans como: “Quer ficar bem longe da tua mulher? Nos te mandamos pro espaco”, “Gosta de velocidade? Que tal pilotar um foguete?”, “Venha passar ferias no espaço sem pagar nada.”, “Odeia todo o mundo? No espaço não mora ninguém!”, “Troque sua moto por um foguete”... Quando sua ideia foi apresentada na próxima reunião, ficou resolvido, por unanimidade, que seria melhor contratar uma companhia especialisada em marketing.
   Nesta mesma reunião foi decidido que os Astronautas seriam autônomos, economizando assim alguns reais que certamente seriam esperdiçados em viagens, hotéis de luxo e outras mordomias so’ para a diretoria daquela agencia. Resolveram também que o quadro de Astronautas seria composto de apenas cinco pessoas, selecionadas dentre os que se apresentassem e, a primeira missão seria uma viagem `a Lua.
   Antes de recrutar os candidatos `a Astronautas era preciso porem criar o centro preparatório. Foi criado então o Brazilian Organization of Charter Aeronautic, BROCHA, como ficou conhecido.
   Agora sim! O cronograma estava estava tomando forma. A BUNDA seria responsável pelao treinamento do BROCHA para entrar no Pirocao.
   Foram mais de onze meses de trabalho árduo, apenas para que tudo começasse a funcionar adequadamente.
   Os candidatos se apresentavam de todas as regiões do pais. Foram mais de mil e quinhentas pessoas interessadas em trabalhar com a BUNDA para ter a chance de entrar no Pirocao.
   Paralelamente, a Aeronave era projetada...
   Depois de algumas das propostas, como a de usar um motor de fusca para economizar dinheiro, por exemplo, terem sido rejeitadas, e de alguns retoques no design, sua produção era iniciada.
   Agora, depois de mais um ano de trabalho árduo, era a hora da diretoria da BUNDA tirar ferias merecidas, tentando esquecer do Pirocao por algum tempo.
   O programa, ate’ o momento, tinha tudo par ser um sucesso. A maior prova disto e’ que, os diretores de um projeto que ate’ agora praticamente não existia, estavam tirando ferias...
   Tudo corria como esperado, sem maiores imprevistos...

   Paralelamente, depois de um ano de estudos por parte dos candidatos que se submeteram a uma seleção acurada, cinco foram selecionados. Eram eles: Herculino Fraco, do Para’, Horácio Hermoso, do Rio Grande do Sul, Dolores Morrendo das Dores, da Bahia, Aeronauta Medroso, de Tocantins e Horinando Tarado, do Sergipe.
   Agora, seriam submetidos aos estudos e treinamentos do BROCHA para estarem aptos a entrar no Pirocao.
   Foi com muito orgulho que os cinco selecionados começariam, finalmente, a fazer parte do seleto clube do BROCHA.
   As primeiras semanas de treinamento cuidaram praticamente de explicações detalhadas sobre o espaço, atmosfera, efeitos da gravidade e tudo mais que fosse importante saber ja’ que, o astronauta teria que fazer tudo por si so’.
   As próximas semanas seriam dedicadas ao esclarecimentos de duvidas que os “alunos” pudessem ter a respeito da missão a que se propunham.
   As perguntas eram as mais variadas...
   Horinando Tarado queria saber...
 - Se não ha’ gravidade, que dizer que quando eu fizer coco as fezes vão ficar flutuando
   destro da espaçonave? Neste caso, na hora em que eu for almoçar, devo ter cuidado
   para não colocar o “alimento de ontem” na boca, certo?
   Ja’ Dolores Morrendo das Dores tinha outra preocupação...
 - Bem! Sendo mulher, tenho que mijar sentada. Neste caso, quer dizer que nada vai
   cair no vaso? Vou ficar toda molhada! E na hora de tomar banho? Vou ter que flutuar
   acima do chuveiro ou vou ter que ficar “voando”, correndo atrás da agua?
   Herculino Fraco porem, achava que seus colegas estavam apenas antecipando problemas. O que ele queria saber e’ como ia acender o fogão para esquentar as refeiçoes. Sem ar não ha’ chamas, certo?
   Horacio Hermoso queria saber como iria falar pela internet com a nova namorada que
finalmente conseguira arrumar, se estavam voando acima dos satélites de
comunicações. A moca era uma “fera” e ja’ tinha dito que se deixasse de falar com
ela por um dia podia arrumar outra.
   Aeronauta Medroso não tinha duvidas ja’ que ate’ aquele momento não havia
entendido porra nenhuma do que tinha sido explicado. Alem disso ja’ estava com um
medo filho da puta de tudo aquilo. So’ havia entrado naquela “fria” porque tinha sido
despejado, estava duro, e pelo menos ate’ então tinha lugar para morar e comida
para comer.
   Herculino Fraco queria saber se dava tempo de ir `a Lua e voltar antes da decisão do Campeonato Brasileiro ja’ que, tinha certeza, seu time do coração, o Tuna-Luzo seria o campeão do Brasil

   Com o tempo, quando se iniciaram os treinos nos simuladores, as duvidas, aos poucos, eram desfeitas e os “astronautas” começavam a se sentir um pouco mais confiantes.
   Todos se aplicavam bastante, com exceção de Aeronauta Medroso que, agora sim, ainda mais, estava com um medo filho da puta de tudo aquilo.
  
   Finalmente havia chegado a hora de selecionar o candidato que passaria a fazer parte do quadro dos grandes Heróis Brasileiros. Este seria, indubitavelmente, um dos maiores acontecimentos da historia do pais e, porque não dizer, da historia da humanidade. Afinal de contas, ate’ então, apenas Estados Unidos e Rússia faziam parte dos países que haviam conseguido botar um homem no espaço.
   No dia em que o “felizardo” seria escolhido, em uma cerimonia na qual os maiores mandatários do pais estariam presentes, Aeronauta Medroso chamou o Coronel Dorildo  Pinto Dodói, diretor da BUNDA e falou bem baixinho ao pe’ de seu ouvido:
-  Doutor! Tô fora... Nestes anos em que aqui estive, juntei um dinheirinho, comprei uma
   casinha e vou me mandar agora mesmo. Este negocio de ir `a Lua não e’ comigo...
   Ja’ tenho dificuldades de viver aqui, como e’ que vou viver na lua?
   Dr. Dodói pediu que ao menos ficasse ate’ o fim da cerimonia para evitar embaraços,
prometendo que ele não seria o escolhido. Aeronauta concordou.
   A cerimonia havia começado quando Horacio Hermoso chamou seu instrutor para um canto e declarou:
-  Infelizmente não vou poder mais participar deste projeto. Minha namorada esta’ doida
   para dormir comigo e disse que se eu não for para casa dela hoje, esta’ tudo
   terminado entre nós . O senhor me desculpe mas não posso perder esta
   oportunidade. A mulata e’ boa, bonita e gostosa... Alem do mais, tenho a impressão
   que este negocio de ir `a lua não e’ muito pra mim. Muito complicado!
   Assim que o prefeito da cidade começou seu discurso, ressaltando a bravura dos
Astronautas, seu senso de patriotismo, sua dedicação ao `aquele projeto, Dolores
das Dores puxou a ponta do paleto’ do uniforme do instrutor, ja’ que ela tinha apenas
um metro e trinta de altura, pedindo para ele se abaixar e falou:
-  Não vou poder ir `a Lua, se escolhida, minha menstruação estava atrasada, comprei
   ontem um teste na farmácia da base e descobri que estou gravida. Desculpe!
   Felizmente, para os coordenadores do projeto que ainda sobraram dois Astronautas e, com cuidado e discrição, ninguém tomaria conhecimento dos problemas pelo qual estavam passando.
   Na hora do sorteio, cheio de pompa e circunstância, Herculino Fraco foi o escolhido.
Mais uma vez, o estado do Para’, estaria em uma posição de destaque. O Estado era o pai do primeiro astronauta Brasileiro. Um dos pucos homens que teriam a chance de pisar em solo lunar. Estava feliz! A Horinando Tarado ficou prometida a próxima viagem.
   O resto da cerimonia transcorreu sem maiores imprevistos. Ninguém, dentre os convidados ou mesmo da imprensa, tomou conhecimento do que havia acontecido.

   Dias depois, finalmente chegava a hora do lançamento. Todos estavam apreensivamente eufóricos. Por incrível que pareca tudo transcorria de acordo com o penejamento, sem nenhum imprevisto...
   Três horas antes do lançamento, uma multidão, alem de dignatários, políticos, imprensa, ja’ estavam presentes.
   Na sala de controle, as ultimas providências e ajustes eram verificados.
   Cel. Pinto Dodói estava muito feliz. Em apenas uma hora seu sonho de muitos anos estaria realizado. Ja’ ate’ pensava nas condecorações que receberia pela ideia de um projeto ambicioso tao bem executado. Seu sorriso ia de lado a lado das bochechas. Quase explodia de tanto orgulho. Ainda estava sonhando com as condecoracoes e, possivelmente ate’ com sua candidatura `a presidência da Republica quando seu celular tocou.
-  Coronel Dodói! Aqui e’ o Herculino Fraco! Coronel, estou no hospital...
-  O que aconteceu? Indagou o Coronel.
-  Ontem fizemos uma festa la’ em casa, uma especie de comemoração e despedida ao 
   mesmo tempo, no caso das coisas não darem certo e, conversa vai, conversa vem,
   sem perceber comi uma travessa de torresmo de porco com cerveja e caipirinha.
   Esta manha acordei com o pe’ do tamanho de uma bola de futebol. E justamente o
   pe’ do acelerador e do freio da aeronave...Fui ao hospital e o medico disse que estou
   com gota. Tô aqui deitado, de perna pra cima tomando soro e sem poder levantar ou
   comer nada por cinco dias.
   Coronel Dodói nem se despediu de seu “heroi”. Saiu correndo atrás do instrutor, desesperado. Faltavam apenas quarenta e cinco minutos para o lançamento.
   Imediatamente, assim que soube das novidades, o instrutor ligou para Horinando Tarado. Ainda bem que temos outro astronauta treinado, pensou...
   Assim que completou a ligação ouviu: "Este numero esta’ temporariamente fora de serviço por falta de pagamento. Por favor, procure a operadora para maiores esclarecimentos".
   Agora o negocio estava complicado... O que fazer? A solução era cancelar a porra toda e tentar outra vez mais tarde. “Atitude derrotista” com a qual Cel. Dodói não concordou, rejeitando-a enfaticamente.
   Numa reunião de emergência, ja’ que faltavam menos de meia hora para o lançamento, apos expor os imprevistos aos integrantes da cúpula da BUNDA, o Coronel  implorava por sugestões...
   Todos calados! Ninguém sabia o que fazer... Parecia que o jeito era chamar a imprensa, inventar um monte de desculpas, um botando a culpa no outro e, esquecer condecoracoes e candidatura `a Presidência da Republica.
   Carlos Castrado, um dos diretores da BUNDA que estava sempre na cozinha fumando e tomando cafe’ levantou a mão medrosamente. Assim que alguns dos participantes olharam em sua direção, ele disfarçou, fingindo estar cocando a cabeça. Atitude própria para a situação.
   Ao ver o desespero do Coronel, levantou a mão novamente...
-  Fala Castrado! Vociferou o Coronel.
-  Bem Coronel... Tem a Maria Pedreira, a moca da cozinha... Ela sempre diz que daria
   tudo para participar deste projeto.
-  A mulher do cafezinho? Indagou Cel Dodói.
-  Ela mesma!
-  Mas que experiência ela tem em empreendimentos espaciais? Perguntou Dodói.
-  Ue’! Ela vende buscape’ na feira livre de Domingo. Respondeu Castrado.
   A vinte minutos do lançamento ninguém pode ser muito exigente, pensava o Coronel, a esta altura irremediavelmente desesperado.
-  Vai la’! Chama a Maria Peideira! Instruiu o Coronel.
-  Dona Peideira! Disse Coronel Dodói assim que a cozinheira sorridente adentrou a
   sala de reuniões.
-  Meu nome e’ Pedreira, Coronel. Corrigiu a nova quase futura astronauta.
-  A senhora estaria disposta a ir `a Lua?
-  Claro! Todas minhas amigas sempre dizem que eu vivo no “mundo da lua”... Nunca
   fui la’ mas pelo menos estou acostumada a ouvir a ideia.
-  A senhora ja‘ pilotou alguma coisa? Carro? Moto? Indagou o instrutor dos
    Astronautas. 
-   Eu propriamente não! Mas meu primo foi motorista de Lotacão no Rio de Janeiro...
    Ah! Meu irmão também fazia corrida de caminhões em São Paulo... Bom! Eu vendo
    buscape’ na feira, se e’ que isto ajuda.Informou Maria.
    Olharam uns para os outros, depois todos viraram as cabeças em direcao ao Coronel, a espera de uma decisão.
    O Coronel olhou para o relógio. Dez minutos para o lançamento...
 -  O que vocês acham? Perguntou Cel. Dodói.
   Um silencio tumular invadiu a sala. Ninguém ousava dizer nada. Ninguém estava disposto a segurar aquele “rabo de foguete”, literalmente.
-  Castrado, vai la,’ avisa a imprensa que tivemos um imprevisto técnico e que o
   lançamento sera’ retardado em uma hora. Decidiu Cel. Dodói.
-  Dona Maria, vai na cozinha, tira o avental, depois acompanha o Instrutor ate’ a sala
   dos Astronautas, veste o uniforme e siga as instruções que ele lhe fornecer. Disse o
   Coronel.
   Em menos de dez minutos aparecia Maria Pedreira toda orgulhosa, vestindo um uniforme de Astronauta, segurando o capacete com uma das mãos, acenando para o publico com a outra mão. Da mesma maneira que uma vez havia visto na foto de um “colega” Americano.
   O instrutor ainda a acompanhou ate’ o interior da aeronave onde ministrou um curso completo de astronauta em dez minutos...
   Para sua surpresa, pelo menos aparantemente, Maria tinha cara de quem assimilara em dez minutos muito mais do que todos aqueles Astronautas, que ganharam um monte de dinheiro, durante o tempo de treinamento.

   Começava a contagem regressiva...
   Pelos alto falantes espalhados pela área publica do complexo do BROCHA podia se ouvir:
 "Atenção para a contagem regressiva. Dez, nove, oito, sete, seis, cinco, quatro, três,
   dois... Ignição iniciada".
 "Lançamento em três, dois, um segundo"...
   Foi poeira, barulho, fogo do rabo do foguete, talvez ate’ parecido com os buscapes que Maria vendia. Aplausos e ovações também podiam ser ouvidas... Uma Festa Nacional...

   Coronel Pinto Dodói estava realmente apreensivo. Tudo agora estava nas mãos de Maria Pedreira. Sua carreira, seu destino, suas aspirações politicas...
 Eu juro que se essa mulher não fizer cagada vai ser candidata a Vice-Presidente na minha chapa.
 "Vote Pinto/Peideira, os amigos da BUNDA"... Que pena! O nome dela e’
   Pedreira... Pensava o Coronel enquanto, com lagrima nos olhos assitia `a realização
   efetiva de seu projeto..




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