quarta-feira, 30 de abril de 2014

AYRTON SENNA DO BRASIL








                                                     Ayrton Senna do Brasil








   No dia de hoje, primeiro de maio, em 1994, ha’ exatamente vinte anos atrás, o mundo perdia um dos maiores pilotos do automobilismo de todas as épocas, e o Brasil chorava em harmonia.
   Nunca mais as manhas de Domingo seriam as mesmas...
   O Brasil ja’ havia conquistado campeonatos de automobilismo antes mas nunca, ninguém, levantou tao alto e com tanto orgulho a bandeira de seu pais.
   Ayrton Senna começou a correr de Kart ainda jovem. Não conseguia pilotar na chuva. Todas as vezes que disputava uma corrida em pista molhada, derrapava, pedia o controle do carro e a corrida. Por isso mesmo, começou a treinar apenas na chuva e São Paulo, sua cidade natal, era o local propicio para isto. Aprendeu todas as nuances de como controlar derrapagens, tirando vantagem delas, usava a aquaplanarem para impulsionar seu carro...
   Em 1981 foi Campeão de Formula 3. Em 1984 fez sua primeira corrida de Formula 1 no Grande Premio do Brasil, quatro dias apos ter completado 24 anos. Ainda na temporada de 1984, correndo por uma equipe de parcos recursos, o mundo conheceria nosso campeão definitivamente... Em uma corrida disputada sob chuva torrencial em Monte Carlo, apos ter se classificado em decimo terceiro lugar no grid e, enquanto a muitos dos pilotos desistiam, Ayrton Senna passava um por um ate’ que na trigésima volta, Jacky Ickx, ex-piloto Belga, diretor daquela prova, amigo do piloto que liderava a corrida, deu a mesma por encerrada, no exato momento em que este era ultrapassado por Senna, consequentemente dando a vitoria a seu “amigo”, que colecionou apenas a metade dos pontos devido `a corrida não ter sido completada em sua totalidade de voltas. Ironicamente, isto fez com que o “amigo” perdesse o campeonato por apenas meio ponto. Outro show de pilotagem foi dado por Senna no grande premio de Portugal em 1985. Claro! Sob chuva. Em 1993 os organizadores estavam preocupados por ter decidido levar o Grande Premio da Europa para Donington Park onde diziam ser praticamente impossível uma ultrapassarem. Ayrton Senna ultrapassou quatro pilotos antes do final da primeira volta. Esta corrida e’ ate’ hoje conhecida no mundo do automobilismo como  “A corrida da volta perfeita”. Alguns pilotos precisaram de sete pit stops para trocar os pneus de chuva/lisos, dependendo das mudanças climáticas ao longo da corrida, enquanto Senna corria com a maior naturalidade, ignorando obstáculos que frustravam os outros pilotos. Ao final da prova um repórter conversando com um engenheiro de equipe falou: “definitivamente, desse planeta ele não é”. E o engenheiro respondeu: “disso eu nunca tive dúvida!”
   Assim era Senna... Parecia que ela fazia suas próprias regras... Frases que falou, tais como: “Segundo e’ o primeiro dos perdedores”, “Meu limite e’ um pouco alem do dos demais”, “Se você tem Deus a teu lado, tudo se torna claro”, “Dinheiro e’ um negocio engraçado: quem não tem o persegue. Quem tem, esta’ cheio de problemas.”, “Nao nasci para ser segundo.”, ficaram famosas através dos anos a ate’ hoje são lembradas.
   Muito alem de sua carreira maravilhosa e incomparável, Ayrton Senna era um herói nacional. Ele tinha o poder de parar uma nação , reunir milhões de pessoas e,  em frente a um televisor e fazerem todos sentir orgulho de serem Brasileiros.
   Não so’ no Brasil, ele era idolatrado. Perguntem a um menino Japonês quem e’ Ayrton Senna e você vai ficar surpreso com a resposta... Faca a mesma pergunta a um menino Italiano ou, quando estiver em qualquer outro pais da Europa, pergunte a qualquer pessoa quem foi o maior piloto que já correu em Formula 1... A resposta vai ser sempre a mesma.
   O Pais estava apenas “acordando” de uma revolução e Ayrton Senna deu sua contribuição inestimável ao retorno da normalidade. Ayrton era o Brasil que dava certo. O Brasil que ganhava, o Brasil que era respeitado, o Brasil que o mundo começava a ver com outros olhos.
   Em 2009 a revista Auto Esporte consultou 217 pilotos que passaram pela Formula 1 e Ayrton Senna foi nomeado por eles como o maior piloto de todos os tempos. A BBC também o elegeu como o mesmo título quando declarou em um edital: “Provavelmente nenhum piloto da Fórmula 1 tenha se dedicado mais ao esporte e dado mais de si mesmo em sua rígida busca pelo sucesso. Ele era uma força da natureza, uma combinação incrível de muito talento e, em alguns casos, uma determinação
espantosa.”
   Um dono de uma equipe famosa, declarou uma vez que; “Senna era, fora das pistas um homem muito maior do que dentro delas...”
   No dia primeiro de maio de 1994, quando liderava o Grande Premio de San Marino, a barra de direção se quebrou fazendo com que ele perdesse o controle de seu seu carro batendo violentamente na proteção da curva Tamburello... O resto, todos nos sabemos... O que muitos não sabem e' que atrás da curva existe uma estatua de bronze onde os Italianos freqüentemente visitam e prestam sua homenagem a quem, como nos, também consideram, o maior piloto automobilístico de todos os tempos. Também, vale lembrar que a ultima escuderia pela qual correu, exibia ate' a data de vinte anos de sua morte, o duplo S que ele tornou famoso, no bico de seus carros. No dia primeiro de maio, em sua homenagem foi afixado no mesmo local um stecker onde se lê: "Ayrton Senna sempre."
   Durante toda sua carreira, Ayrton Senna doou milhões de dólares para ajudar `a crianças necessitadas. Pouco antes de sua morte ele criou a estrutura de uma instituição dedicada `as crianças pobres Brasileiras, tornando-se mais tarde o Instituto Ayrton Senna, ate’ hoje, cada vez mais envolvido na educação de carentes.
   Todos os que tiveram a oportunidade de ver Senna em acao sabem da alegria de ouvir um tema musical criado especialmente para tirar suas vitorias de um contexto casual e dar `a elas a importância que mereciam.
   Quem ainda não teve a sorte de ver uma corrida de Formula1 com Ayrton Senna em um Cockpit deve procurar rever, em um dos muitos arquivos digitais disponíveis... O que eram as manhas de domingos no meio dos anos oitenta e inicio dos noventa, quando o Brasil era, quase que semanalmente, colocado em um dos pódios mais altos onde jamais esteve.
   Aquele menino, uma vez franzino, que nos encantava tanto, tinha o poder de acordar uma nação para com ele comemorar vitorias inesquecíveis.
   Quando chegou ao Brasil pela ultima vez, nosso herói foi recebido com honras de chefe de estado. Em sua homenagem, foi decretado luto oficial por três dias e, estima-se que mais de um milhão e maio de pessoas ocupavam as ruas de São Paulo, por onde seu cotejo passava, para poder agradecer, pela ultima vez, tantas alegrias, tantas vitorias, tanto patriotismo.
   Em 2014 foi tema do enredo de uma escola de samba do Rio de Janeiro e, como não podia deixar de ser, ganhou novamente.
   E’ possível que seus records sejam eventualmente superados mas ninguém, nunca, conseguira superar seu carisma, sua idolatria, seu charme e nunca mais ninguém tera’, de maneira tao definitiva, incorporado ao seu, o nome do pais onde nasceu.
   Ayrton Senna foi o maior e mais completo embaixador que seu pais ja’ teve... Ele sempre teve orgulho em dizer que era Ayrton Senna do Brasil...






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sábado, 26 de abril de 2014

MOTOCICLETA









                                                           Motocicleta







   Rolando Caio da Rocha, mais conhecido por seus amigos como “Machucado”, não se sabe porque, se sentia o jovem mais feliz do mundo naqueles dias. Havia realizado o grande sonho de sua vida desde que “aposentou” sua Gulivette, companheira fiel que o levara varias vezes, quando ainda era quase um menino, `as praias da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. E’ bem verdade que na subida tinha que pedalar pra cacete mas, ele não ligava. O importante e’ que conseguia ir `a praia, se divertir com seus colegas e ficar bronzeado para tentar impressionar, e muitas vezes conseguindo, as meninas com as quais iria dançar nos bailes de Sábado `a noite, no clube social que frequentava semanalmente.
   Machucado havia conseguido, depois de muita economia, comprar sua Yamaha Dragstar 1100. A moto era uma jóia, para quem gosta... Embora fabricada cinco anos atrás estava novinha, com pintura original, sem um arranhão. Brilhava mais do que os dentes do “Boca de Ouro”... O sonho de consumo de Machucado e de muitos de seus amigos. Tinha ate’ aqueles fiapinhos de couro nas manoplas, característicos das motos americanas pristinamente equipadas.
   O para brisa era de acrílico translúcido, faróis de milha, mata-cachorro e tudo mais que uma moto de categoria internacional tinha direito.
   Ja’ por algum tempo nosso amigo sonhava com os passeios que seriam possíveis com sua nova moto, as cidades vizinhas da sua, no Sul de Minas Gerais, estado que resolveu tomar emprestado como seu, para fugir `a violência das megalópoles onde viveu grande parte de sua vida.
   E’ claro que a infância livre, feliz e despreocupada de seus dias de menino no Rio de Janeiro havia ficado para trás há muito tempo. assim sendo, otimista como era, ao invés de sentar em casa em frente `a televisão, abrir a caixa de sapatos cheia de fotos do passado e se lamentar por uma realidade fora do alcance de seu controle, resolveu procurar outra cidade para viver, com mais liberdade, maior segurança, menos problemas.
   Não teria mais a Barra da Tijuca, nem os bailes de sábado `a noite...
   Em compensação, as estradas sinuosas e cheias de curvas sombreadas por arvores, cujas folhagens, embaladas bela brisa fresca e suave, que fazem parte da região, exalavam um perfume magnifico jamais sentido em suas milhares de viagens de adolescente em seu rumo `a praia.
   Quanto a Sábado `a noite, O máximo que poderia conseguir em uma cidade do interior era um forro’ na praça principal da cidade, animado por musicas sertanejas. Mas, ate’ isso ja’ estava fazendo parte de sua nova realidade e, depois de alguns meses vivendo na local que escolhera, ja’ estava se acostumando aos seus novos sons.
   Os anos haviam, inexoravelmente, substituído Tom Jobim por Michel Telo’, Toquinho e Vinícius de Morais por Fernando e Sorocaba, Ivan Lins por Luan Santana, Gál Costa por Paula Fernandes, Emílio Santiago por Guilherme e Santiago, e assim por diante... Talvez fosse melhor para Machucado esquecer suas preferências musicais  e se concentrar mais em sua nova moto.
   Porem, apesar de todo o excitamento e sensação de sonho realizado, havia uma coisa que o incomodava muito mas, com a qual teria que conviver, pelo menos por algum tempo, devido `a sua total incapacidade financeira em resolver o problema. A moto estava com o escapamento totalmente aberto, consequentemente muito barulhenta, fato que o entristecia profusamente mas que teria de ser compensado em sua mente pela alegria que em geral o dominava.
   Seu primeiro desejo, naquela manha de Sábado, era o de levar Aurélia Pulquéria, sua namorada, para uma volta pelas estradas bucólicas da região.
   Ao chegar `a casa da namorada, assim que ela o viu usando um casaco de couro, segurando um capacete que ostentava a mesma cor da moto, começou a pular de alegria... Sabe la’ o que e’ isso! Namorar um jovem da cidade grande, bonito pra caralho e ainda mais dono de moto... Isso era o sonho de adolescente de qualquer menina daquelas bandas... A garota pulava mais do que carro em estrada de chão esburacada do interior. Os gritos eram tantos que sua sua mãe chegou `a porta para se certificar que sua filha estava bem... A coroa ate’ deu uma olhadinha na linda moto... Provavelmente  havia pensado: “Se um garoto bonito como esse me poe numa garupa de moto, vou dar tanto pra ele que ele não vai conseguir nem fazer xixi no minimo por duas semanas.”
   A sorte do Machucado e’ que ninguém consegue ler pensamentos... Assim sendo, pegou sua querida Pulquéria pela mão que, diga-se de passagem, era bonita pra cacete e tinha um par de coxas de fazer muita popozuda morrer de inveja, alem dos peitos que mal cabiam dentro do sutiã... O cara tava com sorte. Tinha a moto de seus sonhos e uma lindas namorada pra andar com ele.
   Saíram felizes pelas ruas da cidade ate’ alcançarem a estrada que os levaria `a cidade vizinha.
   A paisagem era maravilhosa, o sol sombreando a estrada com reflexos de folhas, cerejeiras, hortênsias, acácias caídas no chão ainda emprestavam seu perfume aos que suas lindas flores caídas feriam...
   Aurélia esmagava seus peitos contra as costas de seu namorado ao mesmo tempo em que ele passava a mão na coxa da garota que ja’ estava ate’ babando, no local adequado, e’ claro!
   Em dado momento, em meio aquele momento magico, Aurélia diz para o seu namorado:
-  Essa tua motocicleta faz um barulho filho da puta.
-  O que? Perguntou Machucado.
-  Essa tua motocicleta faz um barulho filho da puta. Repetiu ela.
 - O que? Disse novamente o rapaz.
-  Essa tua motocicleta faz um barulho filho da puta. Falou ela, mais alto desta vez.
-  Como e’ que e’? Respondeu ele, quase gritando.
-  Essa tua motocicleta faz um barulho filho da puta. Disse Aurélia novamente, desta 
   vez gritando `a todos pulmões.
   A esta altura, tentando entender o que sua namorada queria dizer virou a cabeça para trás e disse, gritando:
-  Porra! Fala mais alto que essa minha motocicleta faz um barulho filho da puta..






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segunda-feira, 21 de abril de 2014

HOMEM DE PAU PEQUENO







          
                                                  Homem de Pau Pequeno









   Magda Magdalena Morgado estava muito feliz. Resolvera aproveitar seu mês de ferias para visitar Pau Grande, RJ, sua cidade natal. Tinha certeza que, desta vez encontraria o que sempre buscou em sua vida, para sua felicidade, um homem de Pau Grande.
   Havia saído da cidade muito nova e a primeira impressão que teve, ao chegar, e’ que tudo era tão pequeno...
   As ruas estavam estreitas, as casas coladas umas nas outras... Ate’ a pracinha da cidade parecia ter encolhido em sua percepção de mulher que deixou a cidade quando menina e voltava agora depois de viver tanto tempo em uma cidade muito maior e mais agitada.
   Percebeu também que a cidade estava mal cuidada, abandonada, suja.
   Sua ideia, em principio, quando deixou o Rio de Janeiro, era de encontrar o amor de sua vida, casar, e aqui ficar mas, agora, depois de algumas horas, ja’ não tinha tanta certeza de que queria voltar a viver em Pau Grande definitivamente.
   A casa onde nasceu e foi criada ainda estava la’, no mesmo lugar, intacta, a não ser pela inexorável ação nos anos...
   Resolveu ficar no pequeno hotel local, pelo menos por alguns dias, ate’ que pudesse providenciar a limpeza de sua propriedade.
   No dia seguinte, bem cedo, depois de contratar a limpeza, saiu em busca de velhas amigas.
   A primeira que encontrou foi Ava Gina, agora casada com duas filhinhas; a maior se chamava Ava de cinco anos e a menor Gina, com apenas dois aninhos... Foi uma festa! As duas pularam e se abraçaram que nem duas galinhas no terreiro...
   Ali mesmo soube das grandes novidades e fofocas da cidade.
   Tonico, um menino ate’ jeitoso que tinha mania de beijar todas as maninas da cidade havia se casado com Marcelo, filho da Puglia, uma senhora Italiana que morava ao lado do Educandário.
   Jairo, faxineiro da lanchonete, agora era o Prefeito da cidade.
   Adelicia do Pinto Velho havia se casado com o filho da Alice Barbuda, quem era 30 anos mais novo do que ela e, o pior, quer dizer, o melhor e’ que os dois viviam demonstrando seu amor em todos os bancos e arvores da cidade. Ja’ haviam sido presos mais de cinco vezes por atentado ao pudor...
   Numa dessas vezes, por falta de vaga, colocaram os dois em uma mesma cela. Menos de meia hora depois, quando o delegado flagrou os dois trepando no chão da cela, chamou um guarda municipal e ordenou que levassem os dois ate’ em casa, so’ para ter certeza que não atentariam ao pudor mais uma vez, pelo menos no mesmo dia. Havia porem uma razão para isso... Adelicia era gostosa pra cacete e tinha uma bunda de dar inveja a qualquer mulher. Agora! Adivinha qual era a tara do marido? Pois e'!...
   Depois de colocarem as fofocas em dia resolveram visitar Gravitolina Lino, outra amiga de infância... Perderam o dia e a noite toda em reminiscências agradáveis e engraçadas.
   No dia seguinte, tratou de supervisionar a limpeza de sua antiga moradia que, para sua surpresa, estava melhor do que esperava, mesmo depois de tantos anos de negligência.
   Em menos de uma semana ja’ estava hospedada em sua própria casa.
   Havia organizado um encontro onde pretendia rever todos que com ela cresceram naqueles dias distantes...
   Ouvira dizer, por uma das convidadas que era a primeira reunião daquele tipo que acontecia na cidade ha’ anos... Comida e bebida `a vontade, encontros agradáveis, recordações saudosas marcavam aquela reunião.
   No meio da noite, quando Magda saia do banheiro da sala, ainda ajeitando as calcinhas por cima da saia, deu de cara com um homem lindo. O mais lindo que jamais havia visto. Alto, forte, olhos azuis, cabelos negros... Um Pão!
   Ao encarar o cara ate’ engasgou com um pauzinho de sacanagem que ainda trazia `a boca. O homem, verdadeiro cavalheiro, se desculpou imediatamente e abriu um enorme sorriso para a anfitriã.
-  Meu nome e’ Carlos. Falou.
-  Tudo bem Carlos? Eu sou Magda, dona da casa...
-  Que bom te conhecer Magda... Mas você mora aqui? Sempre passava pela rua e via
    a casa fechada.
-  A verdade e’ que moro no Rio. Vim aqui para limpar a casa e faze-la minha casa para
   finais de semana. E você? Mora aqui?
-  Mudei para ca’ com meus pais ha’ três anos para acompanha-los. Um dia estava na praça
   reclamando que a cidade era suja, um homem que se apresentou como o prefeito, quando soube que
   eu era urbanista, me contratou e aqui estou...
 -  E você gosta daqui?
 -  Gosto! A cidade e’ calma... Esta’ meia abandonada mas e’ para resolver isso que
    estou aqui.
    Magda estava perplexa. O homem era justamente o que sempre havia sonhado e jamais esperava encontrar naquela cidade. E, aparentemente, Carlos também havia simpatizado com ela, ja’ que não “desgrudaram” a noite inteira.
    O dia estava amanhecendo quando Carlos se despediu de sua anfitriã, não antes de marcar um próximo encontro...
   Em uma semana o novo conhecido ja’ frequentava a casa de Magda. Alem de tudo, o homem cozinhava como ninguém e, melhor ainda, fazia questão de lavar os pratos e arrumar a cozinha antes de se dirigirem a sala para tirar sarro ate’ o fim da madrugada.
   Apesar das caricias eróticas que trocavam, Carlos era um cristão fervoroso e acreditava que sexo, so’ depois de casados.
   Se fosse por Magda, ela tinha dado no primeiro dia mas, aquela altura dos acontecimentos ja’ estava ate’ pensando em casamento. Por mais que procurasse, não via nada de errado em seu novo conhecido.
   O mês de ferias foi muito melhor do que poderia esperar e, como tudo que e’ bom, passou rapidinho.
    Foi com lagrima nos olhos que comunicou a seu amigo que deixaria a cidade em apenas dois dias. Este, por sua vez, havia acabado de descobrir quer sua vida não seria a mesma sem a companhia de Magda. A noite foi triste, contrastando com tantas outras, vividas em um ambiente de  descontração e alegria.
   Ao se despedirem `aquela noite, Magda ainda pensou: “Nao e’ tao longe do Rio. Posso vir aqui sempre...”
   No dia seguinte, sete horas da noite, como havia acontecido quase todos os dias daquelas ferias, la’ estava Carlos, com um buquê de flores, `a porta da casa de Magda que o recebeu com carinho, pulando em seu pescoço, o cobrindo de beijos enquanto agradecida, colocava as flores no sofa’, notando porem que ele estava com um semblante solene e introspectivo.
-  Tudo bem? Indagou ela.
   Ao invés de responder, Carlos ajoelhou no chão e disse:
-  Magda! Não tenho como deixar você ir embora e arriscar perde-la para outro.
   Embora te conheça a menos de um mês, tenho certeza que você e’ a mulher da
   minha vida. Não sei como viver sem você. Por isso, queria a honra de te-la como
   minha esposa. Se aceitar, prometo que farei de você a mulher mais feliz do
   mundo, e isso seria minha maior felicidade. Poder viver para te fazer feliz.
-  Aiiiiiiiiiiiiiiii ! Foi a única coisa que Magda conseguiu dizer ao cair sentada justamente
   sobre os espinhos das rosas que Carlos lhe havia presenteado...
   O cara olhou para ela sem saber o que fazer quando ouviu:
-  Ta’ doendo muito! Acho que entrou espinho na minha bunda...
   Infelizmente, desta vez não havia o que fazer... Embora contrariado, Carlos teve que tirar a calcinha de sua amada e com uma pinça que resgatara do armarinho do banheiro, começar a extrair os "intrusos" cravados `as nádegas de sua amada. Depois de uma inspeção cuidadosa e verificar que nada mais estava enfiado na bunda da namorada, colocou, com todo respeito, compressas de arnica com sal para aliviar a dor de sua amada.
   Sentindo-se melhor, ainda deitada na cama, com o cu pra cima, Magda disse que ficaria muito feliz em casar com ele.
   Em menos de um mês tudo estava preparado. A festa foi o maior acontecimento da cidade desde que Garrincha se sagrou campeão pelo Botafogo em 1967.
   Finalmente, o grande dia chegara. Magda estava doida para dar para um homem de Pau Grande.
Depois da festa que durou quase ate' o sol nascer, ainda deixando tudo do mesmo jeito que os convidados haviam largado, garrafas vazias, pratos com restos de salgadinhos e cheios de resquícios de sacanagem, guadanapos pelo chão, uma verdadeira zona, nervosamente, se preparava para dormir, quer dizer, trepar, colocando um lindo Baby Doll que não escondia absolutamente nada.
   Com o coração quase saindo pela boca se deitava ao lado de seu, agora esposo, o qual a esperava ansiosamente.
   Começou a acariciar aquele corpo sensual de atleta, deslizando sua mão delicadamente por seu pectus, abdome, ate’ chegar ao seu pênis...
   Então, não pode se conter quando viu, para sua surpresa um pinto que com benevolência não passava de cinco centímetros. "Mas os homens daqui deveriam fazer jus ao nome da cidade... Xi! Mas ele não nasceu aqui... E agora?" Pensava em silencio...
   Esperava, pelo menos, que aqueles cinco centímetros resolvessem seu problema. E’ claro que amava seu marido e nada a impediria de ser feliz. Nem o fato de ter se casado com um homem de pau pequeno.






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segunda-feira, 14 de abril de 2014

JILO'







 
                                                                    Jilo’







   Padre Jose’ Maria Guardanapo acabar de assumir a posição de pároco de Jijoca de Jericoacoara, pequena cidade do norte do Ceara’ com apenas 17 mil habitantes.
   Era um grande desafio para qualquer um que se candidatasse ou fosse obrigado a assumir tamanha responsabilidade... Todos diziam que a cidade era a campeã do pecado do estado. Era um tal de homem com homem, mulher com mulher que dava ate’ medo.
   Parecia que todo homem era bicha e toda mulher, sapatão.
   Mas, Padre Guardanapo não via nada de anormal, pelo menos `a primeira vista. Apenas mais uma tarefa igual a muitas outras que teria de cumprir em sua longa vida de missionário dedicado ao trabalho pastoral.
   Assim que assumiu suas novas funções, tratou de organizar a igreja e comprar dois confessionários, ja’ que ali não existia nenhum e, eles seriam imprescindíveis para a concretização da nova campanha que estava começando a planejar mentalmente.
   A época não era das melhores para iniciar uma tarefa de redenção daquela cidade endiabrada. Estavam a apenas uma semana do carnaval...
   O pároco não queria nem pensar no que iria acontecer na cidade naqueles dias pecaminosos e permissivos.
   Mas, pensando melhor, talvez essa fosse uma ótima oportunidade para catapultar costumes cristãos.
   Em sua mente prolifera ja’ ate’ imaginava slogans para a campanha a que se proporia. Frases como; “O Inferno e’ quente pra caralho, o Céu tem ar condicionado”, “Ande nas nuvens! Literalmente!”, “Troque seus muitos pecados por poucas oracoes”, “Fale comigo! Te dou uma carona para a vida eterna”, “Quanto maior o prazer da carne, maior o fogo no rabo...”, já passeavam em seus pensamentos...
   Foi muito difícil para um homem beato como Guardanapo, conseguir ver tanta mulher pelada nos desfiles das escolas de samba. Mas, com fe’, conseguiu superar a tentação.
   Aquela Quarta-feira de cinzas, tao ansiosamente aguardada chegou e, com ela, o inicio de seu plano para a evangelização daquelas almas perdidas.
   Apesar de todo dia usando os alto falantes da Igreja `a todo volume, apenas algumas pessoas compareceram para a cerimonia das cinzas.
   Como um verdadeiro otimista que era, ele pensava, talvez num processo de ocultar de si mesmo sua enorme frustração: “Melhor cinco do que nada”.
   Aos poucos, com muito trabalho, muita conversa, muita promessa que nem ele mesmo sabia se poderia ser cumprida, alguns gato-pingados começaram a aparecer para se confessar... Um dia, um dos jovens que captou sua atenção por ser muito forte e bonito apareceu para se confessar. O Padre entrou no confessionário, ainda cheirando a novo e falou:
-  Qual o seu pecado meu filho?
-  Padre, eu comi Jilo’... Disse o rapaz.
-  Filho! Comer Jilo’ não e’ pecado... Acho que nem e’ gula... Se ajoelha ao altar, reze
   uma Ave Maria e pode ir em paz... Disse Guardanapo.
   No dia seguinte, uma linda Jovem, morena olhos verdes, um par de coxas pra ninguém botar defeito, que poderiam ser admirados mesmo por trás das arestas de um confessionario pediu para se confessar.
   La’ foi Padre Guardanapo novamente para seu confessionario ainda cheirando a novo e falou:
-  Qual o seu pecado minha filha?
-  O Agenor Padre... Disse a moça.
-  Que tem o Agenor filha?
-  Ele ta’ doido pra me comer e o pior e’ que eu também to doida pra dar...
-  Minha filha! Sexo so’ deve ser administrado depois do matrimonio...
-  Seu Padre, O que e’ administrado?
-  Quero dizer que so’ os casados podem manter relações sexuais livremente...
 - E’ fácil pro senhor que e’ padre e não gosta de pinto... Todas minhas amigas ja’
   deram pra ele e dizem que ele tem um cacete enorme. Eu ja’ não aguento mais. To
   subindo pelas paredes meus dedos já estão ate’ com calo de tanto... O senhor sabe...
-  Eu entendo minha filha! Você que dizer que sua vagina ja’ esta toda ferida pelas
   masturbações frequentes que você administra em si própria...
 - Bem! Eu ia dizer que minha boceta ta’ toda assada e eu to com os dedos inchados
   de tanto coçar a farfonha mas, tudo bem...
-  Minha filha, tente resistir `as tentações... Reze dez Ave Marias, dez Padre Nosso, dez
   atos de contrição, va’ em paz e não peque mais...
 - Aí Padre! Vamos fazer um acordo... Eu rezo três Ave Marias, três Padres Nosso e fica
   por ai. Nem sei o que e’ acontrição...
  
   A cada dia, pouco a pouco, um a um, mais fieis se apresentavam `a igreja, para se confessar e assistir `a missas, principalmente jovens, o que agradava Padre Jose’, revelando que seu trabalho começava a surtir efeito.
   No dia seguinte, aquele jovem bonito novamente chegou `a igreja para se confessar...
   A mesma confissão: “Padre! Comi Jilo’”. Mais uma vez o Padre esclareceu que comer jilo’ não era pecado. A mesma penitencia e o jovem foi embora...
   A campanha evangelizadora estava surtindo efeito. Semana apos semana, mais pessoas compareciam `as missas.
   Aquele jovem bonito porem ja’ estava dando nos nervos do Padre. Dia sim dia não vinha ele dizendo que comeu jilo’. Pe. Envelope ja’ estava cansado de dizer que comer jilo’ não era pecado. Quando `aquela morena, pensava ele, ou ja’ deu pro tal do Agnaldo ou ja’ morreu infecção xerecal... Nunca mais a havia visto.
   Para comemorar seus seis meses na paroquia, lançou uma campanha regional. Todo aquele que se confessasse naquela semana ganharia uma rifa para uma moto Biz, novinha.
   Foi um tal de fiel pra todo lado... A fila dobrava o quarteirão mas, Padre Envelope estava feliz. Estava com a bunda inchada de ficar o dia inteiro sentado ouvindo pecados, alguns dos quais, extremamente cabeludos mas, tudo bem. Tudo em prol de uma vida melhor para seu rebanho...
   No intuito de tentar conhecer melhor aos que vinham se confessar e, também para dar um toque mais pessoal e intimo `as confissões, o Padre começou a perguntar os nomes dos fieis...
   Todos ajoelhavam, diziam seus nomes e a confissão prosseguia. A dado momento, não pode deixar de reparar um jovem muito estranho, unhas pintadas, peruca roxa, brincos nas duas orelhas, lábios discretamente pintados... Um horror!
   Mas Padre Envelope não podia, nem era de seu habito, descriminar a ninguém...
   Assim sendo, assim  que o jovem se ajoelhou no confessionário, ainda cheirando a novo, Padre Jose’ perguntou:
-  Meu filho, qual e’ seu nome?
   O rapaz, tirando os cabelos da testa, desmunhecando mais do que o Agnaldo Timóteo em seus áureos tempos antes de cantar Mãezinha Querida, respondeu:
-  Meu nome e’ Jilo’...






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segunda-feira, 7 de abril de 2014

BUNDA DE FORA








                                                          Bunda de Fora





 -  Olha aqui sua piranha, a próxima vez que chegares aqui a esta hora, vais voltar para casa de uma
    vez por todas. Deu pra entender?
    Marinete apenas abaixou a cabeça... Não queria abusar da sorte. Embora não fosse o sonho profissional de sua infância, também não podia reclamar. O ambiente era hostil e extremamente competitivo mas, o concreto e’ que conseguia fazer muito mais do que precisava para se manter com dignidade...
   Sem pensar muito no acontecido, tratou de se despir a começar a trabalhar...  O “After Hours”, nome daquele “estabelecimento”, em pouco tempo ficou famoso por toda cidade... Estava localizado em um dos pontos mais tradicionais da Lapa, no Rio de Janeiro . O problema e’ que ninguém conseguia pronunciar aquele nome corretamente... “Aftosa”, “A Furiosa”, “Afterous” eram alguns dos atendados em acertar aquele nome esquisito. Mas, quase na calcada, havia um minusculo bar onde os que não tinham dinheiro para entrar ficavam sentado em mochos vendo as mulheres peladas em uma televisão grande. O espaço era tao minusculo que os assentos tinham que ser removidos das hastes que os sustentavam para que, no final da noite, as portas pudessem ser fechadas. Alem do mais, quem ali sentasse estava mais pra fora do que pra dentro. Por isso mesmo, aquela “casa de espetaculos”, com o tempo, ficou conhecido em todo bairro como “Bunda de Fora” o que, diga-se de passagem, e’ bem mais fácil de se pronunciar do que “Aforous”.
   Também combinava muito mais com as cenas mais comuns em seu interior. As “meninas”, tanto as dançarinas como as garçonetes, se vestiam apenas com um pequeno avental, frente única, com um bolso, amarrado na cintura. Se não fosse pelo avental e o sapato de salto alto, poderíamos dizer que estavam como haviam nascido, so’ que bem mais crescidinhas, e interessantes, e’ claro!
   Marinete era a mais bonita entre todas as dançarinas... Era loira, olhos verdes, corpo perfeito e, uma bunda capaz de amortecer uma queda de um prédio de cinco andares.
   As garçonetes usavam o bolso do avental pata guardar o caderninho de anotar pedidos... Ate’ telefones, `as vezes ali entravam... As dançarinas guardavam as gorjetas.
   Cada uma das dançarinas tinha seu fã clube particular, menos Marinete, embora fosse ela quem conseguia maiores gorjetas. Também, pudera! Pelo tamanho daqueles atributos... Todas as dançarinas espalhavam pelos clientes que ela era besta, metida a cheirosa. Mesmo sem nunca ter sido cheirada por ninguém... Pelo menos em publico. Diziam ate’ que ela so’ tomava banho uma vez por semana... Assim sendo, com o tempo tentavam não aplaudi-la ou lhe dar altas gorjetas...
   Mesmo assim, Marinete não se importava. So’ queria trabalhar e prover seu próprio sustento.
   Com o tempo, passou a prestar mais atenção em um senhor que ja’ havia visto na plateia algumas vezes.
   Depois daquele dia começou a reparar que ele ali comparecia quase todos os dias. Estava sempre com um cálice de vinho tinto meio cheio. Quando uma das garçonetes via que estava quase acabando, ia ate’ ele e completava o cálice.
   Alguns dias depois, Marinete se aventurou...
-  Posso sentar? Disse ela...
   Imediatamente o senhor levantou, puxou a cadeira para ela e, so’ depois de se cerificar que sua companheira estava confortavelmente acomodada, voltou a seu lugar.
   Marinete pode perceber que se tratava de um homem fino, educado, parecia ter muito dinheiro também, quando reparou que estava bebendo um vinho Francês que devia ser caro pra cacete...
   Depois que aquele cliente recusou uma dança particular em um dos quartinhos no fundo do estabelecimento, mantido para esta finalidade, começou a pensar se queria tirar dinheiro do coroa...
   Soube, pela sua “conversa investigativa” que era dono de uma industria mecânica de manutenção de aviões executivos particulares. Soube também que havia sido casado apenas uma vez e que era viúvo por quase vinte anos.
   Parecia ser muito esperto, ja’ que so’ falava sobre o que achava relevante ser informado `a sua “nova amiga”.
-  O senhor vem aqui sempre? Indagou ela.
-  Me chamando de senhor você mesmo esta’ podando a tua chance de me dar uma cantada e tomar o pouco que tenho... Respondeu o “senhor”.
   E’! Aquele ia ser difícil de levar no bico... Concluiu Marinete.
   Teria que mudar de tática... Ainda pensava na melhor maneira de agir quando viu seu nome sendo chamado ao palco para a próxima apresentação...
   Ao findar seu numero, depois de alguns minutos, se contorcendo como uma cobra num pau duro e comprido, se jogando ao chão como se estivesse morrendo de dores, voltando `a mesa de seu novo “amigo”, pode perceber que ela ja’ havia ido embora... Marinete se surpreendeu com a decepção sentida ao olhar para a mesa vazia que exibia o cálice ainda guardando um minimo de vinho sobre algumas notas deixadas como gorjeta.
   Sentou-se `a mesma cadeira onde alguns minutos atrás estava e tentava analisar seus sentimentos... “Porque estou triste? E’ so’ um cliente em potencial...”
   A noite terminava para Marinete como muitas outras... Sentada em seu camarim, contava seu dinheiro, se vestia e voltava para sua casa vazia de companhia e recordações significativas...
   Ela estava em um ponto em sua vida quando realmente não sabia o significado de tudo aquilo. As gorjetas diminuíam na mesma proporção em que e inveja das colegas de trabalho aumentava. “Nao e’ minha culpa se tenho boa aparência.” Justificava a si mesma, ao olhar-se em frente ao espelho e constatar que, apesar de sues quarenta e cinco anos, ainda era “muito gostosa”, como ouvira varias vezes em seu trabalho por  bocas alcoolizadas de alguns dos frequentadores que a patronizavam.
   Mas, de valia aquilo tudo? Era linda, jovial, uma ótima pessoa, tinha uma situação econômica relativamente tranquila e, apesar de tudo, sempre sozinha, nem se lembrava mais de quando teve o ultimo namorado. A única recordação que trazia daquele relacionamento
   Ela porem, estava resignada... Se era essa a vida que teria de viver, tentaria faze-lo da melhor maneira possível.
   A rotina se repetia mais uma vez; ligava a televisão, tomava um banho, esquentava algo leve para comer e quando o sono chegava ia com ele para cama...

   Embora sempre tivesse sido seu melhor dia para o que fazia, Marinete não sentia a minima vontade de trabalhar naquele Sábado. Estava mentalmente cansada, desiludida, decepcionada consigo mesma... Por vezes ate’ lembrava das palavras de sua mãe: “minha filha, sem instrução, a solução e’ usar seu bundão...” Palavras sabias que, especialmente nos últimos dias, a atormentavam enfaticamente.
   Pensando bem, concluíra Marinete, e’ melhor eu ir trabalhar do que perder este emprego...
   Nove horas da noite, e ela ja’ estava la’...
   A noite decorria como qualquer outra. A mesma rotina, as mesmas piadas, as mesmas cantadas... Dia apos dia, nada mudava...Tudo igual!
   “Aquele coroa não veio hoje...” pensava enquanto dançava, segurando no pau e olhando para a plateia, ofuscada pelos refletores que a iluminavam...
   Dançou uma vez, depois do descanso mais outra, e mais outra... Ate’ que os últimos “clientes” embriagados e “duros” deixassem a casa de espetáculos...
   Marinete, se arrumou, despediu de uns poucos que ainda não a odiavam e saiu...
   Alguns passos mais tarde, ja’ preparada para chamar um taxi, viu um carro preto, muito bonito, muito novo, estacionar bem `a sua frente. Não deu muita atenção...
   Esticava o braco tentando chamar um taxi quando ouviu:
-  Posso te levar?
   Era aquele cliente que sempre estava sozinho, com o qual ela falou apenas uma vez. Meia desconfiada, olhou para ele novamente... E’ claro que deveria aceitar a oferta... Ja’ havia ate’ sentido sua ausência...
   Saindo do carro, dando a volta e abrindo a porta para ela, num gesto cavalheiresco com o qual pouco estava acostumada, falou:
-  Onde posso te levar?
-  Podemos conversar um pouco e depois eu fico aqui mesmo... Respondeu ela.
-  Como você preferir...
   Sentado novamente no carro, o desconhecido se apresentou como Augusto Agostinho Agado... Ela não riu! Mas teve que dar uma segurada boa...
   Iniciaram uma conversa descontraída quando puderam entender um pouco sobre o outro, os planos futuros, suas realidades presentes...Trocaram confidências a respeito de um passado sofrido que pareciam compartilhar... Abriram o coração como se dependessem um do outro para suprir a solidão que os acompanhava.
   De repente, depois de alguns momentos de silencio e reflexão, Guto, como o “senhor” era conhecido pelos íntimos soltou a bomba...
-  Gostaria de passar a noite com você. Se você quiser...
-  Tudo bem! Respondeu Marinete, sem mesmo pensar... Atitude que surpreendeu a ela mesma.
   Dali saíram em direção `a casa de Guto.
   Atravessaram quase a metade da cidade em direção ao Alto da Boa Vista. Em la’ chegando, ao ver uma casa rustica, muito confortável, incrustada entre a pedra e a floresta, contrastando com as outras da rua, de um estilo completamente diverso, Marinete começou a pensar se havia tomado a decisão certa. Ao sair do carro e dos jardins da casa poder avistar milhares de luzes da cidade que clareavam outras historias, algumas possivelmente iguais `a que estava protagonizando, de repente se sentiu vulnerável. Guto porem, percebendo seu desconforto, tentando faze-la se sentir `a vontade comentou:
-  Veja! Se, a qualquer momento você quiser ir embora, e’ so’ me dizer. Te levo de volta.
   Aquelas palavras a acalmaram momentaneamente. Passearam um pouco pelos jardins da casa, ao entrarem, ainda conversaram um pouco na sala de visitas, ao som de musica suave, regada a champanhe importada.
   Começaram a trocar caricias singelas que se tornaram mais intensas em alguns minutos. Dai os beijos se tornaram  mais ardentes, as caricias mais intimas ate’ que Marinete, a esta altura completamente entregue e dominada sentia seu sexo sendo beijado com volúpia, o que a fez, literalmente, enlouquecer... A esta’ altura ja’ era “escrava” daquele “senhor”...
   Passaram a noite inteira se amando ardentemente ate’ quase quando os primeiros raios de sol anunciaria o dia seguinte.
   Eram mais de dez horas da manha quando Marinete acordou e não viu seu companheiro a seu lado. Por um instante ficou preocupada, sem saber o que fazer... “Devo ir embora?” Pensou...
   Ainda procurava por algo para cobrir seu corpo quando viu Guto chegar com uma enorme bandeja de prata com um cafe’ da manha completo. Frutas, cafe’ torradas, geleia, queijo, presunto, manteiga. Tudo o que tinha direito.
-  Não sabia o que você gosta, trouxe tudo o que encontrei... Disse Guto.
   Marinete olhava para aquele homem intrigada... Estava nervosa, sem jeito. Situação um pouco infamiliar para ela, sempre safa, pronta para uma reação.
   Reunindo coragem falou:
-  Posso te fazer uma pergunta?
-  Claro! qualquer coisa.
-  Quantos anos você tem?
-  Setenta e dois! Muito velho para você?
-  Você tomou alguma coisa ontem?
-  Tomei  champanhe com você. Não uso nenhuma droga recreacional, se e’ o que você quer saber...
-  Como e’ possível? Você manteve ereção a noite inteira. Estou morta de cansaço e você inteirão...
   Como pode?
-  Se eu disser algo você não vai rir de mim?
-  Claro que não! O que?
-  Você acredita em amor `a primeira vista?
-  Não sei!
-  Pois e’! desde a primeira noite que vi você dançando, não consegui te tirar da minha cabeça.
   Queria tanto falar com você...
-  Mas quando eu fui conversar você nem me deu bola, depois sumiu! Ficou tantos dias
   sem aparecer...
-  Não queria te usar ou te “comprar”... Sumi porque estava fazendo um teste para ver
    se te esquecia...
-  Você nem me conhece...
-  Vamos ver! Você e’ solitária, muito sofrida, odeia o que faz mas, assim mesmo da’
    tudo de si. Não aceita convite de clientes para se prostituir, e’ descrente de homens,     
    amor, família, embora seja o que mais queira ter, ja’ passou por situações muito
    difíceis, quase perdeu a vida, não se acha digna de se relacionar com mulheres, se
    julga inferior devido `a profissão, ha’ algum tempo parou de procurar por amor, acha
    que não e’ para você... Continuo?
 -  Não precisa! Você me conhece...
 -  Você acha que eu sou maluco?
 -  Não sei! Um pouco! Respondeu Marinete, com um sorriso encantador...
 -  Mas você me surpreendeu com toda essa virilidade...
 -  Estava querendo fazer amor com você desde que a vi dançar pela primeira vez mas,
    não queria pagar... So’ se você quisesse também...
-   Puxa vida! Sabe que também fiquei triste nos dias em que você não apareceu?
    Pensei que nunca mais ia te ver...
 -  Que bom! Então você gosta um pouquinho de mim...
    Marinete olhou bem para ele. Pausou, pensou um pouco e respondeu:
-   Muito! Não sei porque mas, gosto muito de você...
-   Que horas são? Perguntou ela, assustada...
-   Porque?
-   Tenho que ir pra casa, descansar um pouco, recuperar forcas pra trabalhar `a noite.
-  E se você não trabalhar hoje?
-  Se faltar, perco o emprego...
-  E se você se casar comigo? E trabalhar so’ se quiser, onde quiser? Podemos ir `a
   Europa em nossa lua de mel...
   Marinete olhou para ele muito seria, esboçou um sorriso ao mesmo tempo em que lagrimas rolavam de seus olhos.
-  Você e’ maluco! Isso tudo e’ muito doido!
   Guto apenas recolheu as lagrimas com seus polegares ao mesmo tempo em que segurava o rosto de Marinete carinhosamente.
   Ela o olhou mais uma vez e o abracou em resposta...
-  E se você não gostar de mim? Disse ela.
-  Eu ja’ gosto de você... Sabe o que deveria fazer? Sumir daquele lugar... Pensa
   que não notei? Todos esperam por você dançar... Ficam calados, enebriados pelo teu
   corpo, tua beleza, teus sorrisos que devem te machucar tanto... Você e’ explorada.
   Sei que você ganha boas gorjetas mas são muito menos do que você merece.
-  Isso mesmo! Tudo bem... Não trabalho mais. Nem vou la’ dar satisfação...
-  Então, hoje vou preparar os documentos de união estável, amanha documentamos tudo e
   vamos a teu apartamento buscar tuas coisas.
-  Não precisa de documento!
-  Precisa sim! Primeiro assinamos e depois você organiza nosso casamento na igreja.
-  Você e’ solteira, não e’?
-  Sou!
-  Você não acha que eu sou muito velho? Vão me chamar de teu pai!
-  Você se importa?
-  Claro que não! quero mais e’ que morram de inveja cada vez que nos verem juntos.
   Depois que almoçaram Guto levou sua “noiva” em casa, voltando para preparar o lugar que a receberia como dona.

   Meses depois, ocasionalmente passaram, agora como marido e mulher, pelo mesmo local onde Marinete trabalhava. Agora, vendo aquilo tudo sob novas perspetivas apenas sorriu, ao lembrar daquelas noites que via passar com Bunda de Fora...





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