quinta-feira, 31 de julho de 2014

DAGMAR








                                                                   Dagmar








   A moça estava desolada. Havia acabado de ver sair correndo de suas vistas o homem mais lindo que jamais havia encontrado. Mas, Dagmar não era mulher de se deixar abalar por algum pequeno desapontamento.
   Jogou fora o resto de cachorro quente que ainda estava comendo e saiu correndo atrás daquele que bem poderia ser o homem de sua vida.
   O esfoço, por sair apressada por entre todos os torcedores que lotavam o Maracanã, com aquelas calças apertadas que vestia, foi tão grande que ela não conseguiu segurar um peido que, por coincidência ou azar, escapou bem em frente ao rosto de uma mulher toda emperequetada, com chapéu e tudo que, ao sentir o cheiro, não pode deixar de manifestar seu protesto, dizendo:
-  Porra! Não da’ pra peidar na cara de outra pessoa?
   Ao que Dagmar apenas respondeu, quase que instintivamente:
-  Desculpe! Não deu! Acho que foi aquela salsicha...
   E’ claro que Dagmar não estava nem ai para os sentimentos, ou mesmo, olfato, da mulher. O queria mesmo era correr atrás daquele gringo lindo.
   Ainda pulando sobre pernas esticadas e peidando, eventualmente, conseguiu, finalmente deixar as arquibancadas e subir as escadas correndo, tentando resgatar aquele que poderia ser o amor de sua vida ou, pelo menos, a trepada daquela semana.
   Ao chegar ao anel exterior que dava para `as entradas de acesso ao local onde estava, parou por um instante, olhando de um lado para o outro, procurando por seu interesse amoroso.
   Não viu ninguém que pudesse lembrar aquele rosto maravilhoso.
-  Puta merda! Estou sem sorte! Exclamou, quase gritando.
   Estava completamente empanzinada por aquele cachorro-quente que comeu quase todo, sem beber nada que pudesse ajudar. Ainda procurando por aquele gringo que a encantou tanto, olhando pro lado, viu um bar onde decidiu comprar um refrigerante.
-  Me da’ alguma coisa gelada pra beber. Disse ela encostando-se ao balcão.
   Enquanto esperava, olhando para o lado, pode reconhecer, no loiro que bebia uma cerveja, aquele homem lindo para quem sorriu, enquanto ainda assitia ao jogo que ainda rolava no gramado do estádio.
   Sorrindo novamente para ele, falou:
-  Tudo bem bonitão?
-  Mi desculpo maix se iou queresse veir boca feio e mau cuidada ainda extava oliando para as
   mulieres de mieo pais. Respondeu John Banks, o loiro que, quando assistindo ao jogo da  
   Inglaterra,  não tirava os olhos da bunda de Dagmar, enquanto ela gritava, xingava, pulava e
   balançava todos aqueles “atributos” incomparáveis, bem `a sua frente.
   Ao ouvir isto, a moça lembrou que não havia retirado de sua boca a dentadura falsa, que para mais nada mais servia do que esconder o sorriso impecável que, na realidade possuía e, assim, projetando uma imagem horripilante e grotesca a quem quer que a visse sorrindo, talvez tentar que homens gulosos entendessem que ela não era apenas um pedaço de carne.
   Imediatamente, passou a mão na boca e retirou o disfarce que ainda a protegia, pelo menos ate’ agora... Olhou novamente para o homem que ainda a encarava e disse:
-  E agora?
   John, olhando para a Dagmar, literalmente segurou o queixo, so' por via das duvidas,  e resgata-lo, se por acaso caísse.
-  Poxo! Voxe e’ lindo... Não conseguiu deixar de dizer John, com seu Português quebrado.
-  E’ ne’, seu gringo... Agora sou linda? Respondeu ela.
   Não resistindo `aquela cena, mesmo arriscando levar um tapa na cara, uma refrigerantada, ou algo parecido, ele acariciou o rosto da Dagmar, antes de lhe dar um beijo carinhoso, talvez tentando se desculpar por sua atitude anterior, talvez apostando no futuro, pelo menos enquanto estivesse no Brasil.
   Que surpresa!
   Ao invés de reclamar, empurrar ou recriminar o gringo, Dagmar avançou no pescoço do cara, meteu os dedos entre aqueles cabelos longos e loiros e tascou-lhe um beijo com tanta volúpia que, se o cara usasse dentadura a teria perdido, ou deixado cair no chão.
   Agora Banks tava lascado... Esperou tanto por este momento que, justamente quando ele havia chegado, não sabia o que fazer... Nem precisou! Dagmar olhou bem para ele e perguntou:
-  Quer acabar de ver o jogo?
-  Nao prexiza! Si voxe nao importas quero ficar au tio lada. Respondeu John.
   Dagmar não perdeu tempo, pegou o homem pela mão dizendo:
-  Vamos embora! Me leva pro Motel!
   Agora Banks estava mais lascado... So’ em pensar no que poderia acontecer, começou a suar. Não conseguia se concentrar... Meteu a mão no bolso, tirou um lenço e começou a enxugar o rosto.
-  Como e’ teu nome, loiro lindo?
   Agora Banks estava muito mais lascado... O diabo da mulata estava tão segura e determinada que o "argumento" do gringo estava murchando ou invés de crescendo...
   Ja’ do lado de fora do Maracanã, ela fez um sinal para um taxi, que por sorte sua era conduzido por um árabe, que aparentemente, não dava a minima importância para copa do mundo, futebol ou similares.
   Não demorou para que chegassem ao destino. Um Motel que mais parecia um castelo, no coração de Vila Isabel, bairro boêmio e tradicional da zona norte do Rio de Janeiro.
   Sem mesmo pestanejar, informou `a atendente, quando indagada se queria comprar quatro horas...
-  Me da’ doze horas! Quatro não da’ nem pra começar...
   Agora Banks estava muito mais do que lascado... Neste momento, ele estava ate' em duvidas se realmente deveria ter vindo ao Brasil. Não estava certo de que tinha capacidade para encarar uma mulherona daquelas.
   Ao entraram `a pé, depois de pegar a chave do apartamento, Dagmar segurou a mão de seu... Namorado? E, enquanto apoiando em seu braço, dando um beijinho naquele pescoço coberto de suor que escorria por dentro da camisa de seda que vestia, e falou:
-  Ta’ nervoso, meu amor?
   E’ claro que o cara nem respondeu. Apenas engoliu em seco e, continuou andando, suando, como se estivesse andando em direção ao seu algoz... Abriram a porta do apartamento e, assim que entraram, Dagmar nem esperou. Soltou a mão de seu companheiro, se jogou na cama, levantando-se imediatamente e, como se num impulso, começou a se despir. Calmamente, como uma profissional, performando um “strip tease”, andava de um lado para o outro do local, desfazendo-se de suas roupas com sensualidade, ate’ que, finalmente, estava como havia nascido... Completamente pelada!
   Agora Banks estava definitiva e irremediavelmente lascado...
   Sentou na cama, olhou para aquilo tudo e se lembrou de um ditado muito comum em seu país, que havia ouvido varias vezes; “cuidado com o que você deseja, pode acontecer”.
   Dagmar se aproximou, levantou pelas mãos o gringo que suava mais ainda, abriu suas calcas, meteu a mão la’ dentro e, após procurar, por alguns segundos o que tentava encontrar, sem o sucesso esperado, falou:
-  O que aconteceu?
-  Eu exta’ miuta nervosa... Respondeu Banks.
-  Não tem nada! Tira a roupa e mostra teu documento. Ordenou Dagmar.
   Sem muita convicção, John se despiu, exibindo um corpo musculoso e escultural.
   Ao ver aquilo tudo, Dagmar, aproximando-se de seu companheiro perguntou:
-  John, não me leve a mal mas, esse pingolin não sobe?
-  Infelixmeinte a naturezo nau foi generozo com eu... Eleo so’ fica assim!
-  Meu amor!!! Olha bem pra mim!!! Com um "caboose" deste tamanho, este negócio que você tem
   pendurado não da’ nem pra fazer nem cosquinha. Realmente decepcionada, exclamou Dagmar.






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quarta-feira, 23 de julho de 2014

JOHN BANKS








                                                                    John Banks








   John Banks acabara de desembarcar no Rio de Janeiro.
   O Inglês nascido e criado em Londres tinha duas paixões... Futebol e Mulatas!
   Para comemorar seu aniversário de dezoito anos, seus pais lhe deram um presente que mudaria a vida do filho completamente: uma viagem ao Rio de Janeiro no Carnaval. Acostumado a uma cultura mais fria e menos liberal, o cara ficou maluco quando assistindo a um desfile de Escolas de Samba. Nunca havia visto tanta mulher "au naturel". A partir daquele dia jurou para si mesmo que so' aceitaria em sua vida mulheres morenas e, digamos, bem dotadas! Depois daquelas ferias, de volta a seu país natal, procurou, procurou, procurou e, adivinha! Não achou nenhuma morena para namorar. Resultado! Abstinência total.
   O cara era teimoso ou, digamos, determinado. Preferia ficar so' do que com aquelas Inglesas “sem graca” e brancas pra cacete...
   Agora sim! Estava no caminho certo. Sua ideia era tentar matar dois coelhos com uma única porrada, quer dizer, uma paulada so'.
   A Copa do Mundo estava prestes a começar e, e' claro não poderia deixar de acompanhar a seleção de seu país e, quem sabe, talvez ate' arrumar uma namorada. O cara estava realmente precisado...
   A seleção Inglesa não poderia ter encontrado local melhor para se concentrar. No Rio tinha mulata pra cacete... O cara se sentia melhor do que pinto no lixo. Andando pelas ruas da cidade era muito difícil olhar para frente. A toda hora “uma delas” atraia sua atenção total...
   Banks estava tão desorientado que um dia, passando por uma loja do centro da cidade, comprou uma peruca, so' para poder andar de Metrô no carro das mulheres sem ser notado. Passou mais de três horas viajando de Botafogo ate' a Praça Saens Peña... “What a feast!” Pensara varias vezes naquelas viagens.
   Enquanto via o seu time passar para a segunda fase da Copa do Mundo, continuava no Rio de Janeiro. E’ bem verdade que ja' havia perdido o primeiro jogo da Inglaterra, em compensação, ja' havia “namorado” mais de seis mulatas.
   Seu pensamento era que os jogos poderiam ser assistidos pela televisão em seu quarto de hotel, acompanhado por uma das “selecionadas”.
   Finalmente, o que estava esperando... Um jogo da Inglaterra no Maracanã. Para John era difícil acreditar que o grande dia havia chegado. Naquela manhã que havia acordado cedo, depois de seu cafe’ matinal ainda teve tempo de dar uma passeada pela orla marítima. A ideia era de poder ver mais um monte de mulher para compensar a quantidade do homem que iria ver durante o jogo.
   O estádio estava quase lotado. Gente para todo o lado. Mr. Banks havia escolhido seu assento cuidadosamente. Por coincidência divina providencial, `a sua frente estava sentada uma mulata aparentemente muito bonita. Ainda não havia visto seu rosto mas teve a oportunidade de perceber que se tratava de uma mulher passional pela maneira que fraseava sua emoção:
  “ Acaba com a porra do gringo!”  “Mete porrada!”  “Passa a mão na bunda do loiro!” “Segura o filho da puta, não deixa ele chutar, seu babaca!”... Foram algumas das frases que John ouvia mas, não entendia quase nada. O que certamente havia percebido e' que a “moça” tinha um corpo escultural e uma bunda capaz de amortecer qualquer queda de um terceiro andar.
   Por mais que tentasse, John não conseguia prestar atenção ao jogo... Pelo menos enquanto aquela mulher estivesse pulando, gesticulando, gritando e, encantando o felizardo.
   Banks so' conseguiu saber que o primeiro tempo do jogo havia terminado empatado quando, sem querer, deixou seu olhar escapar em direção ao placar... A partida estava 0 x 0 mas, aquela mulata estava vencendo, todas as outras, por 100 x 0.
   De repente, a mulher da' uma levantadinha da cadeira para esticar as pernas. Assim que se levantou, foi alvo de um pão, daqueles de cachorro-quente, que literalmente se abrigou entre seus lindos cabelos longos e cacheados. Calmamente, sem nem virar para trás, pegou o “projetil” com uma das mãos e o embrulhou em um guardanapo que, providencialmente, trazia no bolso.
   Mal terminara de guardar o pão e, uma salsicha acertou sua orelha, escorregou pelo pescoço e se abrigou entre seus seios... Agora, alguém havia se excedido, e muito!
   A esta altura o Inglês estava estático. Não sabia o que fazer. E’ claro que, dentre aquela multidão seria impossível reconhecer o perpetrador daquele ato injurioso. Banks estava ate' curioso em ver qual seria a reação daquela mulher que, agora se virava para trás, tentando, quem sabe, identificar o desrespeitador...
   Calmamente, a mulata tirou a salsicha dos peitos, colocou dentro do pão que havia guardado, embrulhou o cachorro-quente improvisado e, ainda de costas para o gramado, encarando o resto da arquibancada, deu uma mordida e gritou, a todos pulmões:
-  Olha so'! O filho da puta que me acertou com o cachorro-quente vê se me manda um guarana pra ajudar a descer melhor... Seu babaca!
   Banks não tirava os olhos da mulher, corajosa e destemida. Estava ate' um pouco intimidado por aquela reação inesperada. Mesmo sem dominar perfeitamente o idioma local, conseguiu entender e, consequentemente ponderar, embora para si mesmo, que se o cara jogasse la' de cima uma lata de refrigerante, certamente iria, desta vez, fazer um estrago considerável naquele rosto tão lindo.
   Pela primeira vez, desde que sentara, havia visto o rosto da mulata... Lindo! Muito Linda! pensava com seus botões...
   Assim que a mulher encarou Mr. Banks, que não tirava o olho dela nem para piscar, se encantou com o gringo. Ele era alto, loiro, olhos azuis, braços musculosos, plexo bem definido... Um verdadeiro galã de cinema.
   Com uma atitude espontânea, incontrolável, aquela bela mulata moveu sua linda mão em direção ao queixo de seu admirador, apertando-o com suavidade e abriu o maior sorriso de admiração.
   Então, o negocio pegou! John levou o maior susto de sua vida quando percebeu que aquela linda mulata tinha apenas dois dentes. Um na arcada superior e outro na inferior. Uma coisa horrível!
   Instintivamente, em uma reação praticamente involuntária, se levantou, apavorado e saiu correndo, subindo os degraus da arquibancada de dois em dois e falando, em voz alta:
-  To witnessed such terrible smile I didn’t need to travel that far... We have plenty of women with bad
   teeth in London.

  



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quarta-feira, 16 de julho de 2014

ED LINCOLN








                                                           Ed Lincoln

                                          Maio 31, 1932 - Julho 16, 2012






   Ha’ dois anos, neste dia, o maior organista de todos os tempos nos deixou...
   Aos que não conhecem, ou não se lembram, Ed Lincoln era líder de um grupo musical que ostentava seu nome e, através dos anos ficou conhecido como "O Rei dos Bailes". Ele veio do estado do Ceara', onde nascera, para o Rio de Janeiro ainda muito jovem tocando contra-baixo, embora ja' fosse pianista...
    Lincoln começou a tocar para dançar na boite Drink, no Conjunto “Djalma Ferreira e seus Milionários do Ritmo”, outro grande musico da época que fez muito sucesso. Porem, se ouvirmos suas gravações, o que da’ o verdadeiro toque de qualidade e requinte `a elas e’ o som que Ed Lincoln tirava do piano que, tocava.
   Todos os que tiveram a sorte comparecer a bailes de clubes e formaturas nos anos sessenta e inicio dos setenta, puderam ouvir o melhor da musica brasileira e internacional...
   Ed Lincoln tocava de uma maneira muito simples mas com uma sofisticação incompreensível. Seu conjunto era elementar, apenas dois instrumentos de solo, orgão e pistom. Os outros, guitarra, contra-baixo e bateria faziam ritmo juntamente com quatro cantores que “engrossavam” a "cozinha"; como era chamado, naqueles dias, a sessão rítmica de um conjunto ou orquestra. Mas o som que aquele grupo de excelentes músicos fazia soar era mais completo e sofisticado do que o de uma orquestra.
   Anos depois formou seu próprio conjunto e começou a animar bailes...
   Um dos momentos mais emocionantes que vivi aconteceu no “Baile das Bolas” em Janeiro de 1963 na Associação Atlética Tijuca, um pequeno clube social no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro.
   Estava chegando ao baile que iniciaria `as 11 da noite. Assim que entrei no clube, ainda prestando atenção `as meninas, que “desfilavam” seus vestidos “polka dots”, foi quando ouvi o conjunto do Ed Lincoln ensaiando “Garota de Ipanema”, recém composta meses atrás e que so’ seria revelada ao mundo muitos dias mais tarde.
   Nunca havia visto uma harmonia tão bem elaborada por nenhum musico.
   Naquele baile, a musica foi executada varias vezes, muitas delas aplaudidas pelos que ali estavam.
   Ainda era quase um menino aos meus quase vinte anos de idade, mas o que `aquele dia presenciei foi algo inesquecível que sempre fez parte de minha vida.
      Em 1963, Ed Lincoln sofreu um grave acidente de carro, e ficou afastado de suas atividades artísticas, porém , tendo Eumir Deodato, ao piano, seu conjunto cumpriu fielmente todos os bailes contratados. Fui o único período em que seu conjunto não contou com um Orgão Hammond como instrumento de destaque.
   Outro momento que jamais esqueci foi “O baile da Volta” quando ele retornava aos palcos apos o acidente que quase tomou sua vida e o manteve por mais de seis meses internado em um hospital.
   Naquele dia, no Clube Monte Líbano, no Rio de Janeiro, uma multidão de quatro mil pessoas aplaudiam com fervor quando ele, ainda fragilizado, em passos curtos, tomava o palco, sentava ao orgão e cantava, pela primeira vez em sua vida “Voltei”, cancão composta por ele e Sílvio Cezar, para marcar indelevelmente outros tantos anos nos quais ainda teríamos sua presença, protoganizando, sem duvida alguma, a cena principal de todos que, como eu, tiveram o prazer de dançar ao som daqueles acordes magistrais que jamais serão ouvidos novamente...


   Muitos anos mais tarde, ja’ nos Estados Unidos, conheci outro grande organista, Jackie Davis. Um dia, em uma visita `a sua casa em Jacksonville, FL mostrei um video que exibia o grupo do Lincoln animando um baile de formatura.
   Jackie estava em silencio enquanto assistia `a gravação , o que durou por quase uma hora. Ao final, quando perguntei o que achava, colocou as mãos juntas, olhou para elas por alguns segundos, e respondeu: “- Queria poder tocar como ele...”
   Em retrospectiva, quando trago a minha mente alguns dos momentos mais felizes que vivi, em muitos deles estão a figura de Ed Lincoln, sentado ao orgão, sorrindo feliz e deixando a magia de sua musica alcançar um patamar inigualável.
   A ultima vez que me encontrei com Ed Lincoln foi em 2009, em uma das minhas visitas ao Brasil. Assim que me viu, ele lembrou daquele menino que o aguardava na porta dos clubes para, junto com os músicos do conjunto, poder entrar, ja' que não tinha convite para a festa ou não era sócio do clube onde se apresentaria `aquele dia e, muitas vezes sentava a seu lado, no banco do orgão, talvez tentando entender como acontecia a magia da criação. Foi um encontro emocionante que nunca vou esquecer.

   Muito obrigado, meu amigo... Sei que você esta’ no céu, ocupando um lugar de destaque, juntamente com tantos outros músicos, talvez igualmente inesquecíveis, alegrando os dias dos menos afortunados que não tem o mesmo dom de musicalizar e produzir trilhas sonoras para suas vidas...
    Você, meu amigo, compôs, enquanto conosco estavas, os melhores acordes que ate’ hoje enchem de alegria `as memórias de todos que tiveram a sorte de dançar ou ouvir tuas composições ou as de tantos outros que você, com tua arte, engrandecia...
   Se houvesse um consolo para essa perda irreparável seria a frase que Oscar Peterson, outro mago do piano, costumava dizer... “Old musicians never die, they just decompose...”








    Copyright 7/2014 Eugenio Colin.


quarta-feira, 9 de julho de 2014

LÁGRIMAS DO CÉU








                                                       Lágrimas do Céu





 
   Acordei esta manhã com o barulho da chuva conduzida pelo vento forte conta a janela do meu quarto.
  Acabado de acordar, ainda sonolento, pensei nas muitas vezes em que ouvi dizer como e’ bom ficar deitado na cama, em dia chuvoso, colocando em dia todos os pensamentos que trazemos guardado dentro de n
ós por tanto tempo e que finalmente, depois de tantos anos, decepções e sofrimentos, poderemos presentear a alguém em momentos felizes, eternos, inesquecíveis.
  Olhando para a chuva distraidamente, pensei: realmente, a única coisa que falta aqui, agora, neste momento e’ uma companheira que, com sua magnitude, faria deste dia chuvoso um dos melhores de minha vida...
  A chuva não parava de cair, insistente, persistente, como se tentasse me dizer algo notável. Olhei novamente para a janela e não dei muita importância a este acontecimento corriqueiro que já presenciei inúmeras vezes.
  Alguns minutos após acordado, ainda na cama, como se estivesse esperando a volta dessa companheira imaginaria, pensava: ela foi s
ó ate’ a cozinha pegar um pouco de cafe' ou um suco... “Ouvindo” uma voz melodiosa, me oferecendo algo, sorri, ao constatar, como se estivesse
voltando do sonho, que sonhava acordado, ainda sentindo o prazer de mais uma noite, como tantas outras em que tenho esta imagem junto a mim, fazendo com que todas a horas do dia sejam especiais só por saber que "daqui há pouco" estarei te vendo, na felicidade maior que pode haver quando, em um acontecimento raro e inusitado, duas almas gemêas se encontram, dando sentido a sonhos quase arquivados em suas memórias; acontecimentos quase esquecidos em corações ocasionais... Me levantei e fui `a cozinha preparar o cafe'...
  Enquanto andava, percorrendo o corredor curto e solitário que separa o quarto da cozinha, olhava para fora e, por uma fração de segundo, pensei que a chuva estava me seguindo pelo lado de fora... Os mesmos pingos que momentos atrás bateram em minha janela, tentando "falar" comigo...
  Com passos curtos e ainda sonolentos, não dei importância `a minha imaginação e andava, ainda pensando em "minha companheira”...
  Fui ao armário, coloquei o pó de cafe' no coador, 
 água na cafeteira e assim que a liguei comecei a ver seu som da percolando o pó, transformado em cafe', acontecimento que bem poderia ser considerado
magia, se não tivéssemos plena consciência do que estava acontecendo `aquele momento.
  Ainda distraído, ouvi a chuva, novamente, insistentemente batendo, agora na janela da cozinha. Parecia que ate' o vento que a trazia produzia sons, definidos e indecifr
áveis como um idioma que não entendemos.
  Não consegui evitar o movimento espontâneo de meu corpo, virando-se, automaticamente, em direção a janela, como que atendendo `aquele chamado insistente.
  Apenas chuva! Pensei, agora atraído pelo pensamento que, negando um fato incoerente já estava dando a atenção a tantos minutos solicitada por aquela chuva constante, triste, persistente.
  Balancei a cabeça, como se estivesse auto reprovando meus pensamentos absurdos...
  O cafe' estava pronto. Coloquei um pouco em uma xícara e me dirigi `a mesa. A mesma `a qual me sento tantas vezes para alimentar o corpo, so' para fazer companhia `a mente que se alimenta dos mesmos pensamentos que compartilho soliloquemente... A mesma `a qual quando sentado vejo, pela janela a seu lado, uma arvore, que também se alimenta do mesmo pó de cafe' que ontem me saciou e que hoje se tornou seu nutriente diário...
  Pensando nisso, tentando olhar para a 
árvore não pude deixar de notar pingos de chuva, tristemente escorrendo em minha janela, com lágrimas do céu...
  Não e' possível! Pensei, ainda olhando para a chuva...
  Quanto mais olhava mais sentia que este era um acontecimento que merecia minha atenção. Nunca havia notado nada semelhante, insistente, incoerente.
  Ainda tentado me certificar ou, talvez justificar minha decisão olhei mais uma vez para fora, como se estivesse convidando esta chuva triste ao um encontro na varanda, no mesmo banco onde,
dias atrás fumei um cigarro, cumprindo a tradição do primeiro neto.
  Ao abrir a porta, com cuidado para evitar que a chuva entrasse dentro de casa, notei que tinha diminuído. Estava mais calma, aliviada por receber a atenção que pedia há tanto tempo, temerosa de ser
negligênciada, passar desapercebida, continuar lacrimejando.
  Sentei calmamente do lado de fora e uma chuva suave, acompanhada de uma brisa leve e quase agradável, "conversava" comigo... Ponderava sobre sua tristeza, invejava as chuvas de outras cidades, locais talvez distantes, de onde ouviu sobre uma mulheres maravilhosas, lindas, importantes, companheiras, dedicadas ... Mulheres que enfeitam  cidades, que trazem felicidade só por estar presente, que alegram corações, que fazem sonhar...
  Me contou como gostaria de poder cair sobre esta mulher e, ao invés de humidec
ê-la, atuar como um manto protetor, impedindo assim que tristezas e dissabores a perturbassem...
  Expliquei que não seria possível encontra-la ser embelezada por sua presença, já que ela esta' muito distante, que e’ apenas um sonho, uma figuração imaginaria,longe de seu alcance...
  Me perguntou se teria a chance de vê-la, toca-la com seus pingos sorrir ao presenciar seu sorriso...
  O vento, "cantando" suavemente parecia um guardião da chuva, um protetor coerente, talvez seu amante em horas tranquilas nas nuvens onde residem...
  Ao ver aquelas "lagrimas", embora mais calmas, ainda "preocupadas", expliquei que, no momento, não era possível a introduzir a esta mulher já que eu mesmo ainda não a conhecia e, assim sendo não caberia a ela enfeitar uma cidade, acalmar chuvas, ventos, dar sentido a vidas e elementos do universo...
  Prometi por
ém, `a chuva e ao vento, como prometi a Deus e mim mesmo que farei tudo ao meu alcance para que esta mulher seja colocada, finalmente, no lugar onde sempre mereceu estar, ser tratada como a rainha que e', soberana do coração em que, ainda desconhecida mesmo assim habita.
  Disse `a chuva e ao vento que um dia, talvez muito breve, nos encontraremos novamente, desta vez, de mãos dadas, corações alegres e que, nesse dia sentaremos juntos, no mesmo banco, e esperaremos pela chuva e o vento, para compartilhar com eles a alegria que e’ poder ter esta mulher maravilhosa ao meu lado.
  Absorto em meus pensamentos vi as "lagrimas" secando pouco a pouco, o vento "sorrindo" calmamente ao se afastar e, juntamente com as nuvens, voltarem para a imensidão, satisfeitos com a esperança e a certeza de que não serão furtados do prazer de conhecer uma mulher invejável, que sera' o centro da vida de todos que a rodearem.
  Ainda sentado pude ver os primeiros raios de sol chegando, aquecendo a manh
ã até então triste e "chorosa".  Fiquei feliz ao ver um sorriso nas nuvens e o vento "abraçando" a chuva, satisfeitos por terem um ao outro, felizes, assim como eu, por saberem que a possibilidade e' real, não apenas fruto da imaginação de um sonhador inveterado...

  Hoje de manh
ã as "lagrimas do céu" secaram felizes após ouvirem sobre “você” da mesma maneira que meu coração começou a sorrir desde que, agora remido, se permite apostar novamente.








Copyright 7/2014 Eugenio Colin

  

quarta-feira, 2 de julho de 2014

A CABEÇA DO PINTO




            


                                                     A Cabeça do Pinto








   Nas diversas etapas de seu desenvolvimento, o organismo humano e’ o resultado de diferentes interações entre a sua genética, o ambiente em que vive, social, cultural e educativo e ainda seu ambiente familiar. Assim, uma determinada pessoa pode apresentar diversas características peculiares que a distinguem, especialmente no que diz respeito `a saúde e nutrição.
   A obesidade e’ o resultado de diversas dessas interações. Por isso, filhos com ambos os pais obesos apresentam alto risco de obesidade, bem como determinadas mudanças sociais estimulam o aumento do peso em todo um grupo de pessoas.
   Recentemente, vem se acrescentado uma serie de conhecimentos científicos referentes aos diversos mecanismos pelos quais se ganha peso, demonstrando cada vez mais que essa situação se associa, na maioria das vezes com diversos fatores.
   Independentemente da importância dessas causas, o ganho de peso esta’ na grande maioria dos casos, associado a um aumento da ingestão de alimentos e uma redução do esforco físico.
   Resultados de estudo, recentemente publicado no Jornal da Associação Americana de Medicina, demonstraram que em homens obesos que apresentavam disfunção erétil, a redução do peso e a mudança do estilo de vida, melhoraram a função sexual.
   Existe uma associação entre obesidade e função sexual em homens, que e’ independente das doenças relacionadas `a obesidade. Ou seja, a obesidade em si, pode interferir sobre o desempenho sexual. Pensa bem! Você encontra por acidente ou persistência, com a mulher dos seus sonhos. Por acaso, serendipidade ou sem-vergonhice, ela também esta’ afim de dar uma trepadinha. Vão para um Motel. Chegando la’, beija daqui, amassa dali, sarra dacola’, pronto! Tudo em cima... Você se aproxima, mas ai’ acontece o que so’ você não sabia... Mesmo que ela chegue muito perto, a barriga impede que sua meta seja atingida... Que situação! Pode ate’ ser que você seja cara de pau e tenha criatividade e apele para praticas secundarias e paralelas que deveriam ser um complemento e não a principalidade daquele rendezvous. Depois de desapontar suas parceiras tantas vezes, se ainda não estiver, com certeza vai brochar, pelo menos enquanto lembrar desse desempenho vergonhoso.
   Não tem jeito! A única solução e’ a redução  do peso. Para testar se a redução  de peso e a mudança de estilo de vida poderiam promover algum beneficio sobre a função sexual, previamente comprometida, pesquisadores da Universidade de Nápoles, na Itália, acompanharam, durante três anos, homens obesos com disfunção erétil de varias origens, sem diabetes, hipertensão ou hiperlipidemia, e com índice de massa corporal elevado. Ao final desses estudos, concluíram que o grupo que, gradualmente diminuiu a ingestão de alimentos e aumentou a atividade física, conseguiu melhorar não so’ sua aparência mas também, sua função sexual.
   O resultado deste estudo deveria servir de incentivo para aquele cara que pegou a menina dos sonhos e pagou o maior vexame.

   Carlão havia acabado de ler este artigo, em uma daquelas revistas de consultório medico que a gente so’ lê porque ela esta’ dando sopa e nos estamos com o saco cheio de esperar.
   Ao ser chamado e entrar na sala de atendimento, não pode deixar de reparar nos atributos físicos da doutora. A tal da medica era prato pra cem talheres. Tinha um par de coxas que faria qualquer popozuda morrer de inveja... A mulher era tao gostosa que o paciente ficou ate’ envergonhado pelo tamanho de sua barriga. Como se, por acaso, estivesse pensando em se atrever a tentar um pensamento pecaminoso, ja’ que não pode deixar de notar que a doutora era casada e consequentemente, invejar o felizardo que a satisfaria assim que tivesse chance.
-  O que o trouxe aqui, Sr. ... Carlão ? Perguntou a medica, apos consultar a ficha e se 
   certificar do nome do paciente.
-  O seguinte doutora... Estou me sentindo alambazado, quase não consigo andar.
   Ontem `a noite, após o jantar, nem consegui comer minhas duas barras de chocolate,
   como de habito. Disse o paciente.
-  Seu Carlão ! Ca’ entre nós! Não vou nem lhe examinar. O senhor precisa perder peso.  
   Imediatamente!
-  E’! Eu achava que a senhora ia me dizer isso mesmo... Disse o paciente, de certa
   maneira envergonhado.
-  Vou traçar aqui uma lista de alimentos saudáveis que o senhor pode usar e, o resto e’
   com o senhor... Disse a doutora, exibindo um sorriso encantador.
   No lado da lista dos proibidos, alguns “amigos”, tal como cerveja, batata-frita, pão, macarrão, ocupavam lugar de destaque.
   “Porra!” Pensou Carlão ao deixar o consultório. “So’ tem coisa ruim! Eu nem sei o que e’ Romanesco! Que diabos e’ Oca? Salicórnia, Nopal? Agora veja bem se eu algum dia vou comer Nopal... Eu sou e’ muito macho e, se algum dia for comer isso, vai ser Nopal que eu mesmo faço... Veja bem se eu vou sequer tocar Nopal de um cozinheiro desconhecido... O que aconteceu com abobora, batata, couve, pepino, cebola, tomate? Hoje em dia ninguém fala mais deles...
   Mas o cara estava decidido. Tinha que perder peso... Jamais queria passar pelo que aquele cara da reportagem, da revista lida na sala de espera do consultório, havia passado. Talvez e, em sua mente apenas um talvez, mesmo que tivesse que se sentar `a mesa conformadamente, segurar nopal, e leva-lo `a boca... Aquele pensamento dava ate’ calafrios...
   Foram algumas semanas de sacrifício e indignação mas, aos muito pucos, os resultados começavam a aparecer: as calcas não entravam mais na bunda, fazendo com que Cralão , constantemente, fosse obrigado a corrigir o problema, preferencialmente, sem ser notado. Os peitos não balançavam tanto, especialmente quando corria. Ate’ o dedo mindinho ja’ estava fino o suficiente para... digamos, fazer uma faxina no nariz...
   Não podia ver uma balança de farmácia que nela trepava, so’ para satisfazer seu ego e ver que todo aquele sacrifício estava dando resultado.
   Havia trocado a cerveja por suco de laranja, pizza por pão sírio, batata frita por pepino cru, cortado em tiras e’ claro, talvez para poder enganar seus dedos, ja’ que era difícil enganar o paladar. E, o melhor e’ que conseguiu elaborar sua dieta de uma maneira que não foi necessário, nem por uma vez, botar Nopal em sua boca.
   O homem estava feliz!
   Chegava mesmo, vez por outra a arriscar um olhar, cheio de desejos, para algumas mocas que por seu caminho cruzavam em uma daquelas corridas matinais que agora praticava... Algumas ate’ retribuíram com aquele olhar lascivo, na maioria das vezes usado apenas para provocar.
   Mas, Carlão não queria saber de nada. Nada de romance, ou sarro, ou qualquer outro similar ate’ que estivesse totalmente pronto. Sem barriga e, de preferência, começando a desenvolver um “tanquinho” para que as meninas pudessem praticar o esfrega-esfrega característico...
   E’ bem verdade que esta segunda parte seria um sonho um pouco mais difícil de realizar devido `a enorme concentração de banha que ja’ ha’ algum tempo levava para passear mas, de qualquer maneira, sonhar não atrapalha.
   Três meses depois, conforme combinado, voltava ao consultório para um acompanhamento. Desta vez, procurou ler apenas revistas de carro... Havia ate’ pensado em dar uma folheada em alguma revista de mulher pelada mas, achou que ainda não estava pronto. Alem do mais, temia que a doutora pudesse notar sua reação concomitante.
-  Seu Carlao, vamos entrar... Chamou a doutora.
-  Seu Carlao! Que diferença... Meus parabéns! Sobe aqui na balança... Olha so’! O
   senhor perdeu 10 quilos em apenas três meses... Como esta’ se sentindo?
-  Bem melhor, doutora... Mas agora, subindo nesta balança me lembrei... Estava
   pensando em uma maneira de acompanhar meu progresso sem ter que trepar em
   tudo que e’ balança de farmácia que encontro `a minha frente... Ja’ esta’ virando um vicio!
-  Muito fácil, seu Cralão ... O primeiro passo sera’ o senhor poder ver a ponta de seu sapato, ou
   tênis, quando estiver andando, depois, num segundo estágio,  quando estiver de pe’ parado,
   esperando por um ônibus ou o Metro... Mas, o resultado final, o que vai lhe dizer que
   o senhor realmente atingiu sua meta, e esta’ com peso normal para seu corpo, vai ser quando,
   ao tomar banho, inclinando a cabeça para baixo, sem se curvar, conseguir ver a cabeça do pinto...









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