sábado, 25 de junho de 2016

RAPUNZUDA










                                                               Rapunzuda











   Rapunzuda, apelido de Rapunzel, por motivos óbvios, uma mulata muito bonita que teve seu nome inspirado na heroína da conhecida historia infantil, favorita de sua mãe, finalmente, após tanto sofrimento, conseguia arrumar um emprego de doméstica na casa de uma madame ma' pra cacete... Uma boa “filha da puta” como Rapunzuda pensava a respeito da patroa.
   A mulher não valia nada mas pagava em dia e isso e' o que importava. No inicio Rapunzuda chegou cheia de marra, dizendo que queria, carteira assinada, décimo terceiro, férias, o escambal; ao que a patroa respondeu:
-  Te pago salário mínimo, não assino porra nenhuma, não tem férias nem decimo terceiro... Se você
   trabalha doze meses, porque vou te pagar um mês a mais? Se não quiser, pode se mandar agora
   mesmo. Depois desse tal PEC das domésticas ninguém mais ta' empregando. Se você não quiser 
   trabalhar aqui, tem quem queira. Não sou sócia do governo e não estou aqui para pagar pelo roubo
   de políticos safados e cara de pau.
   Quando ouviu aquilo tudo, ficou chateada mas, tava dura, não tinha um puto de um tostão e, pensando bem ate' que a patroa não estava muito errada. Ela também jamais concordaria em sustentar político vagabundo... Resolveu então aceitar o emprego...
   Agora, trabalhando, pelo menos podia pagar o aluguel do barraco minúsculo onde morava. Apesar de toda dificuldade, estava pelo menos satisfeita... Porem, do parco salário que recebia, não sobrava nada... Nunca mais pode ir ao salão para fazer as unhas ou cabelos. Os cabelos ja' estavam tão longos que levava mais de meia hora tomando banho so' pra poder lavar toda aquela juba.
   Rapunzuda tinha mania de cantar...  Ja' saia do barraco cantando e continuava assim pela rua ate' a casa onde trabalhava, poucos blocos de onde morava. Gostava de imitar a Elza Soares... “Se acaso você chegasse no meu chateau e encontrasse aquela mulher que você deixou...” Alias, reparando bem, ela era ate' um pouco parecida com a cantora... Olhos amendoados, neste caso, de nascença, não por plástica; cabelos crespos e longos, aquela mesma voz rouca, meia gordinha, peituda e com bunda grande. Era ate' bonitinha...
   Príncipe, apelido do açougueiro do bairro, por onde Rapunzuda passava todos os dias, a caminho do emprego, ja' estava começando a ficar apaixonado pela cachopa. Quando ouvia a voz da moça, largava qualquer coisa que estivesse fazendo, so' para poder dar uma olhadinha em seu interesse amoroso.
   Um dia largou o facão, com o qual cortava os restos mortais de uma galinha, com tanta pressa que o cabo bateu na mesa de corte e a ponta voltou em sua direção, desta vez quase cortando o pinto, fato que, se tivesse sido consumado, acabaria de vez com qualquer chance de tentar conquistar Rapunzuda. Duvido que uma mulher daquela se interessaria por um despintado... O pior e' que naquele dia, so' teve chance de ver sua “amada” pelas costas, o que aliás, não era nada mal. O rebolado da mulata era algo, no mínimo, interessante de ser apreciado. Seu andar mais parecia uma bolsa de supermercado repleta de compras em movimento, tendo por cima dois mugangos, que ela, diligentemente equilibrava, para que não caíssem e, ao se espatifarem ao chão, destruídos em mil pedaços, acabassem com o sonho erótico daqueles que, vendo aquilo tudo, sonhavam em come-los.
   No trabalho, tentava ignorar os mal tratos da “madame” que entre outros vícios, tinha a mania de chama-la puxando pelos cabelos que, diga-se de passagem, agora, depois de quase um ano de trabalho, estavam quase chegando na cintura. Mildred, sua patroa, começava a reclamar que os cabelos da serviçal estavam muito grandes e anti higiênicos e pediu que ela os cortasse. 
   Rapunzuda porém, ja' havia se acostumado com os cabelos longos e ate' começava a gostar deles, principalmente depois que descobriu que uma das taras do Príncipe, o açougueiro, que ela ja' havia notado, mas dava uma de gostosa, esperando que ele tomasse a iniciativa, eram aqueles cabelos cacheados e longos.
   Em uma manha de Segunda-feira, ao passar pela “Picanha do Príncipe” nome do estabelecimento de seu admirador principal, notou que o açougue estava fechado. “Talvez ele esteja atrasado hoje” pensou ela...
   No dia seguinte contudo, e no outro, e pela semana inteira, a “Picanha do Príncipe” ficou sem funcionar o que, mesmo sem serem casados, ou namorados, preocupava `a Rapunzuda.
   Naquele final de semana, dando uma de detetive, pergunta daqui, informa dali, acabou descobrindo onde o Príncipe morava. 
   Mesmo sem saber se deveria, acabou batendo `a porta da casa do homem, que veio atende-la fazendo um barulho filho da puta, derrubando tudo que estava `a sua frente, no caminho entre a cama onde estava deitado e a porta da casa.
   Ao abrir a dita, ainda de olhos fechados, apalpando as paredes tentando “enxergar” onde estava, perguntou:
-  Quem e'?
-  Sou Rapunzuda! Não nos conhecemos pessoalmente mas, costumo passar pelo açougue todos dia e,
   esta semana...
-  Claro! Reconheço tua voz, pelas canções que ouço todos os dias quando você passa. Por favor, 
   entra!
-  O que houve com você? Esta’ doente? Precisa de ajuda? Perguntou Rapunzuda.
-  Fiquei cego! Disse Príncipe.
-  Cego? Como? O que aconteceu?
-  Não sei! Desde o ultimo Domingo não consigo abrir os olhos...
-  O que houve? Indagou ela, curiosa.
-  Não sei! Domingo passado fui dormir chorando depois de ver um filme que me emocionou muito e,    depois disso, nunca mais consegui abrir os olhos...
   Rapunzuda, dando uma de doutor olhou pro cara, passou a mão nos olhos do "amigo" e ordenou:
-  Vem comigo, vamos lavar este rosto.
   Amparando Príncipe pela mão, o levou ao banheiro, passou a mão no sabão, lavou os olhos do "paciente", e disse:
-  Pronto! Abre os olhos!
   Príncipe, obedecendo, abriu os olhos e exclamou:
-  Milagre! Voltei a enxergar.
-  E'! Na próxima vez, lave o rosto pela manhã, depois de chorar a noite inteira, para se livrar desse
   monte de remela grudenta que cobre teus olhos e te deixa "cego"... Disse ela, achando que seu novo
   amigo era meio "desligado".
   Embora houvesse descoberto que o tal do Príncipe era burro, Rapunzuda estava feliz, pelo menos se sentiu útil e importante, completamente oposto, `a maneira pela qual se sentia em seu emprego.
   Nas semanas subsequentes, ela e seu príncipe ate' trocaram algumas palavras. Gostava dos elogios que ouvia diariamente `as canções que cantava enquanto caminhava.
   Em uma manha de terça-feira, Mildred, a patroa filha da puta, a estava esperando com uma tesoura escondida atrás das costas. Assim que Rapunzuda foi `a cozinha e começou a lavar pratos, a patroa, sorrateiramente, meteu um monte te tesouradas nos lindos cabelos cacheados da empregada que, puta da vida, se demitiu imediatamente, jurando levar a patroa `a justiça, não so' pela agressão cabeluda, como também pelo descumprimento da PEC das Domésticas, mesmo sabendo que isso jamais seria resolvido antes dos próximos dez anos... Justiça brasileira!
   No dia seguinte, ao passar triste e sem rumo pela frente da “Picanha do Príncipe”, cantando: “meu mundo caiu, e me fez ficar assim... Aquela piranha conseguiu, e agora diz que tem pena de mim...” chamou a atenção de seu “amigo” que, imediatamente indagou o motivo de tanta tristeza...
   Ainda debruçada no balcão, depois de contar o acontecido, ela ouviu:
-  Vem trabalhar comigo. Você fica no caixa. Assim eu não tenho mais que cortar carne com mão 
   suja de dinheiro... Quanto aos cabelos, não fica triste... Eles crescem novamente. Além do mais,
   você não precisa de cabelos longos para ser a mulher mais linda que eu ja' vi...
   Pronto! Agora o cara derreteu a mulata...
   Ali, naquele local de trabalho, se concretizava uma amizade, destinada a se transformar em um romance que traria paz, amor, e felicidade eterna para o Príncipe e sua Rapunzuda..
  
   
   
   

   
Copyright 9/2015 Eugene Colin.

   

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