quinta-feira, 26 de junho de 2014

ANTIQÚES








                    
                                                                   Antiqúes








   Adélia trabalhava em uma loja de antiguidades no Rio de Janeiro, em um casarão antigo, escondido em uma rua do Baixo Leblon, que havia sido recém inaugurada. Era uma experiência nova... Seus donos foram donos do mesmo tipo de negocio quando moravam nos Estados Unidos e a grande maioria das roupas expostas vinham de la’.
   Mas “Que Barato!” Nome do estabelecimento, não vendia apenas roupas... Ali tinha de tudo. Adelmis Jão, dono da loja, pregava a teoria de que “o lixo de um e’ o tesouro do outro”... Não queria nem saber, via o que para muitos seria considerado uma porcaria na rua, pega e botava pra vender. `As vezes saía de carro, andando pelas ruas da cidade “catando lixo”. Um dia, dirigindo por uma viela da Lapa, viu uma casa antiga sendo demolida... Prato feito! pegou tudo, que sua mente de comerciante achava poder ser vendido, e botou no carro.
   Ao chegar a loja deu uma limpadinha de leve, não podia estar muito limpo, para manter a qualificação de “antiqúes”. O cara de pau chegou ao cumulo de colocar `a venda um tijolo, quebrado nas pontas, por $ 1.500,00. E bem verdade que em um dos lados do tijolo estava escrito 1911 mas, mil e quinhentos?...
   A loja era interessante, principalmente para quem não tem nada que fazer e esta’ cansado de jogar cartas nas mesinhas das praças do bairro...
   Logo `a entrada estava um balcão onde trabalhavas as funcionas Adélia e sua amiga, Adelina.
   Ao lado direito do balcão, um corredor com cabines em ambos os lados, todas cheias de tralha ou, “antiqúes”, como preferiam dizer as vendedoras. Este corredor seguia ate’ o fim da loja, onde desembocava em um outo corredor e mais outro... Goste ou não, era interessante ver como era possível ter tanta porcaria em um so’ lugar...
   Mas Adelmis Jão achava que seu negocio daria certo, era so’ uma questão de tempo para que os clientes se acostumassem `a ideia de serem explorados.
   No dia anterior `a inauguração da loja, Adélia e Adelina passaram a noite toda fazendo sacanagem na cozinha da loja... Era um tal de me da aqui, espreme mais, enfia no buraquinho, deixa que eu seguro... Quem ouvisse a conversa das duas jamais iria imaginar que estavam preparando espetinho para a festa do dia seguinte.
   Pela manhã, chega o dono da loja com cafe', suco, pão de queijo, bolo, biscoitinhos... `As dez horas as portas se abriram e... Ninguém do lado de fora. Fizeram aquilo tudo para nada. E olha que tinha um monte de faixas nos postes, em algumas ate’  se lia: "GRAND OPENING”.
   Mas Adelmis não era de se desanimar facilmente... Contactou uma amigo que tinha uma gráfica e mandou imprimir cartazes com dizeres variados para serem postados pelas ruas perto da loja... Pensou ate’ em anunciar nos ônibus que trafegavam nas imediações da loja.
   Em poucos dias, cartazes dizendo: “Você pensa que e’ velho? No “Que barato” você vai ver o que e’ velho.”  ou “Que barato! A loja de velho...” ou  “Que barato e’ a única loja onde nada e’ velho, so’ "antiqúes”. Coisas assim...
   Mas, apesar da fortuna que ate’ agora havia gasto, nada... Ninguém mais queria coisa velha. Quer dizer, “antiqúes”.
   As vendedoras estavam desesperadas, não tinham o que fazer... A opção era ficar em pe’ o dia inteiro e, em poucos meses se candidatarem `a varizes ou, ficarem  sentadas o dia inteiro e criar calos na bunda.
   Demorou algumas semanas para o primeiro cliente aparecer, assim mesmo, deu uma voltinha, olhou para aquele monte de inutilidades e foi embora dizendo para uma das vendedoras:
-  Amanhã vou trazer um monte de tijolo que tenho em casa e vou te vender por dois merréis cada.
   Mas as vendedoras eram educadas e, jamais pensariam responder: “Enfia teu tijolo no ...”
   No segundo mês, aos poucos, uns gatos pingados começaram a aparecer... Um dia, chega um homem que ficou rondando a loja por mais de uma hora. Aquilo não era comum. Ao reparar que o homem não saia nem dizia nada, so’ rondava os corredores com os bracos cruzados atrás das costas, Adelina foi a seu encontro e delicadamente perguntou:
-  O Senhor precisa de ajuda?
-  Não! Estou bem, Obrigado! Respondeu o homem.
   O cara ja’ havia passado pela recepção umas cinco vezes quando Adélia, a outra vendedora, resolveu entrar em acao...
-  O Senhor quer ajuda? Perguntou.
-  Não me chame de Senhor, sou bem mais novo das tralhas que vocês tem aqui. Nem pense também
   que sou um “antiqúes”... Respondeu o homem.
   Muito interessante a coleção desta loja. Um dos item que me chamou atenção foi um tijolo de
   1911, muito raro... Também gostei daquela Vitrola com móvel para discos e tudo. Também achei
   interessante a a quantidade dos discos de 78 RPM e ate’ alguns Long Playings que possuí no
   passado. Foi muito bom saber que esta loja existe e que guarda tantos itens valiosos para a
   preservação de nossa cultura. Hoje em dia todos so’ querem saber de “novelties”, esquecendo a
   historia das coisas que os conduziram ate’ hoje...
   Adélia ate’ abriu um sorriso em resposta ao elogio...
   O tal senhor cruzou as mãos atrás das costas novamente e, olhando de um lado para o outro saiu sem dizer mais nada. A vendedora olhou para um lado, depois para o outro e, intrigada, voltou ao balcão da entrada, so’ pra criar mais algumas varizes...
   O dia terminou como havia começado... Ninguém na loja, nada pra fazer, a não ser tirara a poeira das antiguidades.
   Aparentemente, nem cartazes, propaganda em ônibus, folhetos nos postes, nada dava certo.
   Ninguém no Leblon se interessava por tijolos antigos vendidos a preço de prataria nova.
   No dia seguinte, assim que a loja abriu, volta aquele mesmo senhor... O mesmo ritual. Mãos atrás das costas olhando para os lados...
-  O senhor precisa de ajuda? Indagou Adélia, mais uma vez...
   Como não tinha nada o que fazer, ela acompanhava o homem, conversando, trocando ideia a respeito dos “antiques”, tecendo comentários que ambos compartilhavam, enfim, descobrindo que, pelo menos, havia encontrado alguem para preencher algumas horas de seu dia vazio.
   Adelmis, duas ou três vezes por semana, passava pela loja, conversava com as vendedoras e dali saia satisfeito da vida, como se estivesse vendendo horrores...
   As funcionarias não entendiam nada... O cara estava com uma despesa do cacete, perdendo um caminhão de dinheiro mas, não estava nem ai.
   Kleine Aber Löst, nome daquele senhor, visitante assíduo era, na opinião de Adélia, o único alivio para seus dias maçantes. Ele passou a visitar a loja todos os dias e, conversa vai, conversa vem, confissões daqui, revelações dali, come um pão de queijo! Aceita um cafe’? Os dois começaram um namoro. Agora, Kleine vinha todos os dias `as oito da noite, hora em que a loja fechava, acompanhar sua namorada ate’ em casa.
   Depois de algumas semanas de convivência, ele resolveu levar ate’ ao Que Barato alguns amigos da Alemanha que vieram visita-lo.
   As vendedoras mal puderam acreditar no que venderam aquele dia. Os caras compraram um monte de “antiqúes”...
   Ao saber do ocorrido Adelmis Jão, dono do estabelecimento, resolveu investir em propaganda nos países da Europa. Com o tempo, ate’ conseguiu que empresas de turismo resolvessem incluir nos roteiros vendidos, meio dia de visita `a loja, cheia de “lembrancas do Brasil”. De repente, o negocio deslanchou. A medida que moradores e transeuntes viam a loja repleta de estrangeiros, resolveram dar uma espiada, so’ por via das duvidas, alguns ate’ gostaram e, começara a frequentar regularmente e, e’ claro, no meio daquele monte de porcaria, que dizer “antiques”, sempre achavam algo que os fizessem lembrar de algo importante em seu passado.
   Adélia, esperta pra cacete, convenceu o dono da loja que, não so’ precisavam de ajuda, como também, era de opinião, que precisavam de um homem. Isso iria dar a elas uma impressão maior de segurança. Adivinha que foi o escolhido? Exato!
   Quando Kleine recebeu o convite de sua namorada, aceitou imediatamente, dizendo que gostava de coisas antigas... Adélia, feliz como uma colegial apaixonada respondeu:
-  Que legal! Se você gosta de coisas antigas vai ser bom porque vai gostar de ter uma 
   namorada idosa e não vai ficar correndo atrás das mocinhas.
   Finalmente, gracas `a persistência de Adelmis Jao, seu negocio deslanchou. Adélia e Kleine decidiram morar juntos e, estavam felizes para sempre.
 
   Ah! O tijolo de 1911 foi finalmente vendido para um turista Austríaco por $ 1450 reais. Resolveram dar um desconto, so’ porque o cara era muito simpático e comprou mais um monte de trala velha. Que dizer, “antiqúes”.






Copyright 6/2014 Eugenio Colin

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