sexta-feira, 23 de maio de 2014

APRENDIZADO







                                                          Aprendizado








   Candinho era o sujeito mais querido da cidade... Tudo bem que estamos falando de uma cidade pequena mas, mesmo assim, ser o mais querido entre quinze mil habitantes não e’ tarefas das mais fáceis...
   O cara, porem, não tinha sorte. Ele costumava dizer sobre si mesmo que, se não fosse pela falta de sorte, não teria sorte alguma. Mas, era obstinado, persistente, não desistia fácil e achava que decepções fazem parte do dia a dia que vivemos.
   Nem se lembrava mais da ultima namorada que teve. Não porque não gostasse de mulher ou não se interessasse por elas mas, sempre, algo dava errado e a menina se mandava, algumas ate’ com raiva dele.
   Uma vez namorou a Clarisse, menina nova, recém chegada `a cidade, oriunda de São Paulo. A garota era uma espoleta. Gostava de trepar o dia inteiro, se pudesse. Logo no primeiro encontro com Candinho, encontro que ela mesma provocou, agarrou o cara e levou para sua casa em um final de semana, quando seus pais estavam viajando e ela estava sozinha.
  Mal abriu a porta, ja’ no interior da casa, começou a agarrar o “convidado”, beija-lo com volúpia, rasgar sua roupa ao mesmo tempo que se dirigia em direção `a seu quarto. Não havia acendido as luzes para evitar que os vizinhos saberem que ela estava em casa acompanhada, e dias depois não a delatarem para sua mãe, senhora super protetora do interior Paulista que, nem de leve suspeitava que sua filha dava pra todo mundo.
   Assim que chegaram perto da cama, Clarisse, ja’ pelada, se atirou de costas dizendo:
 Vem! Anda logo! Não aguento mais...
   Candinho, ainda com as calcas arreadas em suas pernas, parcialmente impedindo seus movimentos, sem saber por onde andava, com pressa de atender `as necessidades primatas de sua companheira bateu com violência sua virilha em um móvel, oculto em seu caminho pela total ausência de minima claridade, que nunca deveria estar naquele lugar e, não aguentando a tremenda dor, colocou as duas mãos  no local da pancada e começou a gritar de dor.
   Clarisse, desapontada, sentou-se `a cama, olhou para ele, mesmo no escuro, e falou:
 Possa! Eu ainda nem comecei e você ja’ gozou? So’ por me ver pelada? Que especie 
   de homem e’ esse?
   Depois desse dia a menina começou a espalhar pela cidade que Candinho não aguentava mulher. Gozava so’ em vê-las sem roupa. Ele não ligou mas, aquele episodio atrapalhou a vida “amorosa” de nosso amigo por algum tempo.
   Havia porem uma coisa que Candinho odiava... Pássaros!
   O cara odiava toda e qualquer especie de pássaro...
   Quem sabe, devido ao fato de, na sua infância, ter sido obrigado a tratar, diariamente de vinte cinco pássaros que seu pai possuía. Trinta e cinco! Todo o dia! Era mais de duas horas diárias, segundo ele, jogadas forra... Candinho odiava qualquer especie de pássaro!
   Um dia, em seu caminho ao trabalho, notou que D. Berenice, moradora da rua Antônio Carlos Saraiva Dias do Nascimento Paiva Antunes Cabral da Silva Nunes que, embora sendo a menor rua da cidade, era caminho obrigatório, sem alternativa, para quem queria visitar  a Praça da Cachoeira, por sinal, a única por aquelas bandas... A senhora havia comprado um papagaio e, deixava seu poleiro na janela de sua casa, o dia inteiro.
   O diabo do papagaio falava mais do que técnico de futebol `a beira do gramado...
 Bom dia senhor! Dizia o papagaio cada vez que alguem passasse na rua. Ate’ mulher era “senhor” na mente do pássaro.
   Nas primeiras vezes, Candinho apenas ignorou a saudação. Dias depois entretanto, começou a ficar com raiva do papagaio e, por isso, respondia:
 Cala boca, seu filho da puta...
   O papagaio não estava nem ai para a resposta. A ignorava completamente. Talvez não soubesse o que “filho da puta” significasse. O fato e’ que, mesmo depois que noso herói o deixava para traz, o papagaio continuava repetindo: “Bom dia senhor! Bom dia Senhor!
   Com o passar dos dias, a cena se repetia...
 Bom dia senhor!
 Cala boca, filho da puta!
   Foram meses a fio. A cada dia, mais aumentava o ódio de Candinho em relação ao papagaio.
   Com o passar dos meses, o papagaio começou a aprender outras palavras e repeti-las ordinariamente...
   Algum tempo depois, Candinho arrumou outra namorada. Uma que ele respeitava muito, gostava muito, e ate’, algumas vezes, havia pensado em casamento. Purina, era uma moca completamente diferente. Apesar de muito bem dotada, era extremamente pudica, compenetrada, calma e achava que deveria trepar so’ depois que se casasse. Detestava baixaria ou palavrões, desrespeitos com os outros... Candinho não se importava com a diferença radical entre esta e sua ultima namorada. O importante era que achava que estava apaixonado pela Purina e não fazia a menor questão de “comer o bolo antes da festa”.
   Começaram a passear de mãos dadas pela cidade. Era importante que todos soubessem que Candinho gostava da Purina e, eram sérios em referencia`a este relacionamento.
   Estava tao envolvido com Clarisse que nem se dava conta por onde andavam. O importante e’ que sempre estavam de mãos dadas, deixando o mundo saber que tinham um compromisso moral, inabalável, inquebrantável.
   Um dia, sem mesmo saber, passeavam alegremente pela rua da casa onde o papagaio ficava.
   A primeira reação foi de rezar para que o papagaio estivesse com caganeira, dormindo ou, ate’ mesmo, morto. Não queria arriscar que ele proferisse algum palavrão, talvez ate’ um que Clarisse nunca houvesse escutado. Bem possível, neste caso.
   Andavam a passos curtos em direção `a casa do papagaio...
   Agora era iminente. Não havia saída! Agora, o encontro seria fatal...
   Finalmente, apos alguns passos mais, la’ estava o papagaio, em seu poleiro, com um olhar triunfante, como quem sabe que “a guerra esta’ vencida,”
   Andavam vagarosamente em direção `a praça da cidade que se situava a menos de trezentos metros da casa da “maldita ave”.
   Candinho olhou para o papagaio de longe, como se estivesse pedindo  para que os “deuses da baixaria” o protegesse. Pelo menos `a frente da sua namorada.
   Mais alguns passos e Candinho estava a poucos metros do poleiro do papagaio, no alto da janela da casa, onde sempre ficava, andando de um lado para outro, cumprimentando os transeuntes, la’ em baixo. Ainda olhou para ele, pausou e disse:
  Bom dia seu papagaio...
   O papagaio, sem mesmo pensar, olhou de volta, deu aquela andadinha curta que pássaros dão, balançando a cabeça de um lado para o outro e, com a maior simplicidade do mundo respondeu:
-  Aprendeu ne’? Seu filho da puta...






Copyright 5/2014 Eugenio Colin

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