quinta-feira, 9 de abril de 2020

MOTOCICLETA







                                                       Motocicleta









   Rolando Caio da Rocha, mais conhecido por seus amigos como “Machucado”, não se sabe porque, se sentia o jovem mais feliz do mundo naqueles dias. Havia realizado o grande sonho de sua vida desde que “aposentou” sua Gulivette, companheira fiel que o levara varias vezes, quando ainda era quase um menino, `as praias da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. E’ bem verdade que na subida tinha que pedalar pra cacete mas, ele não ligava. O importante e’ que conseguia ir `a praia, se divertir com seus colegas e ficar bronzeado para tentar impressionar, e muitas vezes conseguindo, as meninas com as quais iria dançar nos bailes de Sábado `a noite, no clube social que frequentava semanalmente.
   Machucado havia conseguido, depois de muita economia, comprar sua Yamaha Dragstar 1100. A moto era uma jóia, para quem gosta... Embora fabricada cinco anos atrás estava novinha, com pintura original, sem um arranhão. Brilhava mais do que os dentes do “Boca de Ouro”... O sonho de consumo de Machucado e de muitos de seus amigos. Tinha ate’ aqueles fiapinhos de couro nas manoplas, característicos das motos americanas pristinamente equipadas.
   O para brisa era de acrílico translúcido, faróis de milha, mata-cachorro e tudo mais que uma moto de categoria internacional tinha direito.
   Ja’ por algum tempo nosso amigo sonhava com os passeios que seriam possíveis com sua nova moto, as cidades vizinhas da sua, no Sul de Minas Gerais, estado que resolveu tomar emprestado como seu, para fugir `a violência das megalópoles onde viveu grande parte de sua vida.
   E’ claro que a infância livre, feliz e despreocupada de seus dias de menino no Rio de Janeiro havia ficado para trás há muito tempo. assim sendo, otimista como era, ao invés de sentar em casa em frente `a televisão, abrir a caixa de sapatos cheia de fotos do passado e se lamentar por uma realidade fora do alcance de seu controle, resolveu procurar outra cidade para viver, com mais liberdade, maior segurança, menos problemas.
   Não teria mais a Barra da Tijuca, nem os bailes de sábado `a noite...
   Em compensação, as estradas sinuosas e cheias de curvas sombreadas por arvores, cujas folhagens, embaladas bela brisa fresca e suave, que fazem parte da região, exalavam um perfume magnifico jamais sentido em suas milhares de viagens de adolescente em seu rumo `a praia.
   Quanto a Sábado `a noite, O máximo que poderia conseguir em uma cidade do interior era um forro’ na praça principal da cidade, animado por musicas sertanejas. Mas, ate’ isso ja’ estava fazendo parte de sua nova realidade e, depois de alguns meses vivendo na local que escolhera, ja’ estava se acostumando aos seus novos sons.
   Os anos haviam, inexoravelmente, substituído Tom Jobim por Michel Telo’, Toquinho e Vinícius de Morais por Fernando e Sorocaba, Ivan Lins por Luan Santana, Gál Costa por Paula Fernandes, Emílio Santiago por Guilherme e Santiago, e assim por diante... Talvez fosse melhor para Machucado esquecer suas preferências musicais  e se concentrar mais em sua nova moto.
   Porem, apesar de todo o excitamento e sensação de sonho realizado, havia uma coisa que o incomodava muito mas, com a qual teria que conviver, pelo menos por algum tempo, devido `a sua total incapacidade financeira em resolver o problema. A moto estava com o escapamento totalmente aberto, consequentemente muito barulhenta, fato que o entristecia profusamente mas que teria de ser compensado em sua mente pela alegria que em geral o dominava.
   Seu primeiro desejo, naquela manha de Sábado, era o de levar Aurélia Pulquéria, suanamorada, para uma volta pelas estradas bucólicas da região.
   Ao chegar `a casa da namorada, assim que ela o viu usando um casaco de couro, segurando um capacete que ostentava a mesma cor da moto, começou a pular de alegria... Sabe la’ o que e’ isso! Namorar um jovem da cidade grande, bonito pra caralho e ainda mais dono de moto... Isso era o sonho de adolescente de qualquer menina daquelas bandas... A garota pulava mais do que carro em estrada de chão esburacada do interior. Os gritos eram tantos que sua sua mãe chegou `a porta para se certificar que sua filha estava bem... A coroa ate’ deu uma olhadinha na linda moto... Provavelmente  havia pensado: “Se um garoto bonito como esse me poe numa garupa de moto, vou dar tanto pra ele que ele não vai conseguir nem fazer xixi no minimo por duas semanas.”
   A sorte do Machucado e’ que ninguém consegue ler pensamentos... Assim sendo, pegou sua querida Pulquéria pela mão que, diga-se de passagem, era bonita pra cacete e tinha um par de coxas de fazer muita popozuda morrer de inveja, alem dos peitos que mal cabiam dentro do sutiã... O cara tava com sorte. Tinha a moto de seus sonhos e uma lindas namorada pra andar com ele.
   Saíram felizes pelas ruas da cidade ate’ alcançarem a estrada que os levaria `a cidade vizinha.
   A paisagem era maravilhosa, o sol sombreando a estrada com reflexos de folhas, cerejeiras, hortênsias, acácias caídas no chão ainda emprestavam seu perfume aos que suas lindas flores caídas feriam...
   Aurélia esmagava seus peitos contra as costas de seu namorado ao mesmo tempo em que ele passava a mão na coxa da garota que ja’ estava ate’ babando, no local adequado, e’ claro!
   Em dado momento, em meio aquele momento magico, Aurélia diz para o seu namorado:
-  Essa tua motocicleta faz um barulho filho da puta.
-  O que? Perguntou Machucado.
-  Essa tua motocicleta faz um barulho filho da puta. Repetiu ela.
 - O que? Disse novamente o rapaz.
-  Essa tua motocicleta faz um barulho filho da puta. Falou ela, mais alto desta vez.
-  Como e’ que e’? Respondeu ele, quase gritando.
-  Essa tua motocicleta faz um barulho filho da puta. Disse Aurélia novamente, desta  
   vez gritando `a todos pulmões.
   A esta altura, tentando entender o que sua namorada queria dizer virou a cabeça para trás e disse, gritando:
-  Porra! Fala mais alto que essa minha motocicleta faz um barulho filho da puta..



Copyright 4/2020 Eugenio Colin

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