quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

CHAPEUZINHO VERMELHO










                                            Chapeuzinho Vermelho











   Aos 37 anos de idade, Charles Wolf finalmente sentiu a necessidade de buscar sua educação universitária. Era quase um gênio em computação  mas, aparentemente, pelo menos para ele, achava que era hora de levar `a serio o que começou de brincadeira quando, ainda era uma criança que acabara a andar ha’ poucos anos, desmontou e montou novamente o celular de sua mãe. E’ bem verdade que conseguiu transformar um telefone em dois e que ambos não funcionavam mas, por outro lado, não podemos ser tao exigentes com uma criança que havia completado sua primeira conquista tecnológica.
   Charles, ainda um freshman na Universidade de Miami, adorava seus poucos amigos brasileiros que la estudavam. Por eles era conhecido por “Lobinho”, palavra estranha que mal conseguia pronunciar, mas fez com que se interessasse em conhecer aquele idioma para ele engraçado e difícil mas que o som o agradava.
   Quando aprendeu a pronunciar e entender o significado de “abundancia” começou a falar frases como “sei que o amor em tu abunda” ou “eu comi ja'” quando rejeitava um lanche que lhe era oferecido.
   Um dia, no refeitório, sentado `a uma mesa com mais de quinze colegas, a maioria brasileiros e ate’ alguns portugueses, provou o cha' que sua amiga Linda Bella (uma brasileira de ancestragem italiana) tomava, muitos exclamaram: 
-  Grose!
   Lobinho nem pensou. Imediatamente respondeu:-
-  Linda e’ meu amiga! Ela sempre deixa eu tomar cha’ no sua xereca...
   Todos riram. Mesmo os que não entenderam que xereca e xícara não são a mesma coisa.
   Mas, o importante e’ que Lobinho estava estudando e se divertindo no processo.
   No dia 31 de outubro, foi convidado por Linda para a acompanhar a uma festa de Halloween (Dia das Bruxas para ela). Como ela seria “Chapeuzinho Vemelho” pediu para seu amigo se caracterizar de Lobo Mau. 
   E’ claro que nem passava pela cabeça de Lobinho tentar comer a Chapeuzinho, ja’ que ela mal havia completado dezessete anos.
   Ao encontrar com ela em sua casa, foi indagado se se importaria dar uma parada no apartamento da avo’ para entregar algumas frutas que sua mãe havia comprado mas esquecera de levar.
   Lobinho, educado como era, obviamente concordou e la’ se foram os dois em seu Mustang conversível `a casa da avozinha.
   Assim que tocaram a campainha da casa, Linda, quer dizer, a Chapeuzinho Vermelho  foi logo pulando no pescoço da avo’ e, a cobrindo de beijos, entregou a cesta de frutas.
-  Pensei que as frutas eram para sua avo’. Ponderou Lobinho, falando baixo ao pe’ do ouvido de sua amiga, que respondeu:
-  Essa e’ minha avo’!
   O queixo do Lobinho so’ não caiu porque, ao contrario do que dizem, e’ impossível acontecer.
   A tal da vozinha era morena, alta, cabelos negros, olhos verdes, um corpo escultural, mãos delicadas e impecavelmente manicuradas, mulher que poderia fazer morrer de inveja qualquer atriz de novela pornográfica, violenta e repleta de incompetência da globo.
-  Vocês querem beber alguma coisa, antes de ir? Disse Mônica, a avo’ da neta.
   Quando ouviu aquela voz rouca e grave, nosso amigo, literalmente babou na fantasia. Estava na presença da mulher mais bonita que seus olhos jamais enxergaram. Ficou tao nervoso que deixou cair de sua mão, chaves do carro, de casa, sua carteira e ate’ um lenço que ele nem sabia como veio para ali.
   Os três conversaram por alguns minutos, nos quais Mônica não tirava os olhos do amigo de sua neta, achando que ele aparentava ser bem mais velho do que a menina. Quando sua amiga o convidou para ir, ele, mais apressadamente colocou em seu bolso os mesmos objetos que havia deixado cair e, menos apressadamente, havia colocado `a mesa de centro, bem a sua frente. Despediram da “avozinha” e se foram.
   Ja’ no carro, ao lado de Chapeuzinho, dirigindo em direção  `a festa, “inocentemente” perguntou:
-  Quantos anos tem sua avo'?
-  Cinquenta e cinco! Nova ne'? E’ uma historia triste que qualquer dia te conto. Disse sua
   companheira, risonha e feliz.
   A festa foi divertida. Para Chapeuzinho! Lobinho estava pensativo e boqueabundembasbacado, sem conseguir tirar a imagem da avozinha de sua mente.
   Por volta das nove da noite, Chapeuzinho perguntou `a Lobinho se poderiam ir embora. Disse que estava cansada, com o chapéu apertando sua cabeça e as calcas entrando e machucando sua xícara, quer dizer, xereca.
   Lobinho a deixou em casa, se despediu, e foi embora. 
   Ao chegar, agora `a sua casa, procurou pelas chaves da porta mas, não encontrou. Não estavam em algum de seus bolsos ou no carro.
-  So' pode estar na casa da avozinha. Pensou...
   Entrou novamente no carro e, chegando ao destino, muito sem  graça tocou a campainha.
   Para sua surpresa, viu a “senhora” abrir a porta balançando as chaves de Lobinho em sua mão, dizendo:
-  Você esqueceu mesmo, ou fez de proposito so' para voltar aqui?
   Ele ainda tremia de nervoso, sem saber direito o que fazer quando a “velhinha” o puxou pelo braço e tascou-lhe um beijo na boca.
   Mesmo nervoso, vencendo suas idiossincrasias, empurrou a nova conhecida no sofa' com um carinho quase violento e a comeu ali mesmo.
   O som da campainha da casa acordou aos novos amantes que ainda dormiam no mesmo local onde horas atrás haviam se amado com audácia.
   Era John Hunter (João Caçador), um antigo pretendente que cortejava Mônica, sem nenhuma reciprocidade.
   Experiente que era, a “senhora” despachou o “caçador” imediatamente, sem deixa-lo perceber que tinha companhia e muito menos saber que havia sido “devorada” na noite anterior, evitando assim que seu “protetor-pretendente”, talvez num ato de ciúme, tentasse meter uma faca na barriga do Lobinho, mesmo vendo que a avo' estava viva, feliz e realizada, bem `a frente de seus olhos.
   `As nove horas da noite ainda estavam conversando... A ele contou que aos 14 anos de idade, em uma cidade do interior, onde morava, havia sido violentada por um estranho e que, quando todos, inclusive alguns parentes, a aconselharam a abortar a criança, ela trocou as bonecas com as quais ainda brincava por um emprego para poder criar sua única filha. Com o auxilio dos pais que cuidavam da mãe de Chapeuzinho enquanto ela estudava direito, pode se formar e dar `a filha e aos pais o conforto no qual não lhe foi possível crescer. “Nunca me casei. Demorou muitos anos para que pudesse confiar novamente em desconhecidos, principalmente homens.” Falou... Confessou que quando viu Lobinho pela primeira vez, ao lado de sua neta, a principio se sentiu um pouco triste, depois percebeu que ele e sua neta eram apenas amigos, o que a deixou mais esperançosa de que aquele amor enfatuativo `a primeira vista pudesse, talvez um dia, ser reciprocado... Mônica, ao saber da idade de seu amante, concluiu que ele estava muito mais para ela do que para sua neta.
   Estava claro que Lobinho não tinha preconceitos e, por suas palavras e atitudes da noite anterior estava disposto a tentar dar `a vovo' o amor que ela nunca havia encontrado. 
   Foi com surpresa que, alguns dias após Halloween, ao se encontrarem no refeitório da faculdade, ouviu de Linda, a tal Chapeuzinho Vermelho:
-  O que esta’ acontecendo? Minha avo' anda me evitando e você foge de mim mais do  que lagarticha
   da boda de gato... 
   Meio sem graça cocando a cabeça, tentando esconder um sorriso maroto que seu rosto incontrolavelmente estampava, sem saber o que responder, olhando para sua amiga com aquele olhar de cachorro triste quando sabe que fez merda, a viu pular ao seu pescoço, da mesma maneira que havia feito com sua avo‘ dias antes, dizendo:
-  Ah! Ja' entendi... Ta' sem graça porque comeu minha vo', ne'? 
   A vida e' engraçada! Aquele caçador enche a vovo' de presentes por mais de três anos; e' perfume
   francês, vinho italiano, relógio suçco, chocolate alemão. Ate' um Rolls Royce ele trouxe para ela
   em uma viagem que fez `a Inglaterra. E' bem verdade que era um relógio de mesa de péssimo gosto
   imitando o carro mas, ela aceitou sorrindo e enfiou em algum lugar bem escondido, ao invés de
   jogar fora. Um dia chega você e da' `a ela uma linguiça usada e torta, ela aceita, e ainda fica toda
   feliz... Eu  não vou pedir para ele tirar ela de você mas, por favor, faca minha avo' feliz. Ela
   merece...
   Vovô!!!!!
   Com um sorriso nos lábios e semblante aliviado, Lobinho respondeu:
-  Eu prometo, Chapeuzinho Vermelho.
      




Copyright 11/2018 Eugene Colin

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